Com população em declínio e trabalhadores escassos, país adotou robôs, mas fazê-los trabalhar de acordo com padrões humanos é um desafio
Motoko Rich, The New York Times
17 de janeiro de 2020 | 06h00
ASAHIKAWA, JAPÃO - Remover os pequenos brotos encontrados nas batatas é um trabalho monótono e repetitivo - aparentemente perfeito para um robô. Mas não é tão simples assim. Quando uma usina de processamento de alimentos de Hokkaido, ilha mais ao norte do Japão, tentou usar o protótipo de um robô para removê-los, a máquina mostrou não estar à altura de tal tarefa.
Seus sensores deixavam escapar alguns brotos sem serem detectados. Se um humano pode girar a batata em todas as direções, o robô só conseguia fazer isso em um eixo, deixando intactas muitas das imperfeições que deveria extrair, tóxicas para os humanos. Outras batatas já perfeitas foram esculpidas sem necessidade.
“Essencialmente, o robô não conseguiu realizar o trabalho de um humano", disse Akihito Shibayama, administrador do Grupo Yamazaki, que opera a usina em Asahikawa, onde 30 trabalhadores processam cerca de 15 toneladas de batatas por dia. O Japão é a terceira maior economia do mundo e espera que a automação possa resolver seus problemas de declínio populacional e escassez de mão de obra iminente. Isso se reflete em um projeto do governo enfatizado pelo primeiro-ministro Shinzo Abe.
Mas algumas tarefas são difíceis demais para serem delegadas a uma máquina. Os robôs conseguem “realizar tarefas simples, mas não tarefas que exigem juízo ou a capacidade de avaliar uma mudança na situação", disse Toshiya Okuma, das Indústrias Pesadas Kawasaki, uma das principais desenvolvedoras japonesas de robôs.
O Japão foi um dos primeiros países a adotarem robôs, instalando-os em linhas de montagem de carros nos anos 1970. Alguns dos produtos e personagens japoneses mais conhecidos e amados são robôs. O gato-robô azul é o astro de quadrinhos e de um dos programas de TV mais longevos do país.
Ainda assim, robôs capazes de realizar tarefas mais sofisticadas custam muito mais que a mão de obra humana. Assim, na usina de Asahikawa, onde cerca de 60% do trabalho é automatizado, muitas tarefas ainda exigem o toque humano. São trabalhadores humanos que descascam as abóboras porque um pouco da casca torna o caldo mais saboroso. Um robô não sabe avaliar quanto da casca deve manter.
Outras tentativas de usar robôs encontraram seus obstáculos, seja em programas com drones de entrega ou robôs que confortam os moradores de asilos. Um hotel com funcionários exclusivamente androides acabou demitindo alguns robôs depois que os clientes se queixaram de uma piora no atendimento. Durante uma avaliação com ônibus autônomos em Oita, um deles saiu da pista, e as autoridades perceberam que os veículos não estavam preparados para lidar com situações como engarrafamentos ou carros que furam o sinal vermelho.
Diferentemente do Ocidente, onde os trabalhadores frequentemente enxergam a automação como ameaça existencial, os robôs são vistos no Japão geralmente como uma força aliada. O número de nascimentos no Japão é o mais baixo desde 1874. Indústrias como atendimento individualizado de saúde, construção civil e agricultura já estão sofrendo com a falta de mão de obra. Em Hokkaido, onde há 1,2 vaga de emprego por habitante em idade útil, testes recentes com caminhões autônomos não foram vistos como forma de se livrar da mão de obra humana.
Embora o parlamento tenha aprovado em 2018 uma proposta de lei para conceder vistos de trabalho a estrangeiros para aliviar a falta de mão de obra, o governo enfatizou os robôs como salvadores mais prováveis. “Acho que o processo de integração de imigrantes ao Japão não é coisa de menos de 20 ou 30 anos, e mais provavelmente 40 ou 50 anos", disse Noritsugu Uemura, da Mitsubishi Electric. “Não podemos esperar tanto.”
Robôs ajudaram os laticínios Kalm, da região de Sapporo, capital de Hokkaido, a reduzir sua força de trabalho de 15 para 5 funcionários. Oito robôs ordenham mais de 400 vacas três vezes ao dia. Portões automatizados encaminham o gado para cabines onde robôs afixam o maquinário de ordenha. “O melhor que podemos fazer é tirar os humanos do processo", disse Jin Kawaguchiya, diretor executivo da Kalm. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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