segunda-feira, 17 de junho de 2024
sexta-feira, 14 de junho de 2024
Hélio Schwartsman - O que querem os cristãos?, FSP
O sistema político brasileiro estimula parlamentares a posarem para suas bases eleitorais sem se preocupar com a viabilidade ou as consequências das medidas que propõem. Apresentar um projeto de lei contra o aborto é garantia de aplauso no culto de domingo, mas será que nossos valorosos legisladores não deveriam examinar os resultados potenciais de suas ideias?
Qualquer um, cristão ou não cristão, é livre para ver o aborto como uma grave violação moral. Não pretendo demover ninguém dessa posição. Mas será que o remédio para esse dilema é, como determina a atual legislação, colocar na cadeia as mulheres que tentam interromper suas gravidezes? Estamos falando de dezenas ou centenas de milhares de candidatas a presidiárias por ano, muitas das quais com filhos que precisariam ser encaminhados para abrigos enquanto elas cumprem pena. Fazer isso tornaria o país melhor?
E, se a lei em vigor já é ruim, a proposta de equiparar a pena para o aborto tardio (mais de 22 semanas de gestação) à do homicídio, inclusive em caso de estupro, situação em que a interrupção da gestação é hoje autorizada, a piora substancialmente. A alteração criaria aberrações jurídicas. A mais óbvia é que a vítima de estupro estaria sujeita a passar mais tempo na cadeia do que quem a estuprou.
O "lado bom" é que, como a maior parte das vítimas de estupro que só descobrem a gravidez tardiamente são menores, o período máximo de punição a que essas meninas ficariam sujeitas, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, é de três anos. Isso se forem maiores de 12 anos. Se menores, sairiam livres, mas suas mães e os médicos poderiam ser encarcerados. É isso mesmo que os cristãos querem?
Se existe um Deus onipotente, onisciente e que odeia o aborto, ele certamente não precisa da ajuda dos homens para punir quem viola suas regras —o que dispensaria os parlamentares cristãos de legislar sobre a matéria.
Câmara de Sorocaba tira do ar redes, TV e rádio antes da eleição, e vereadores reagem, FSP
A Câmara Municipal de Sorocaba (SP) suspendeu em 1º de junho todas as transmissões da TV Legislativa e da Rádio Câmara, além das redes sociais da Casa, até o fim das eleições de 2024.
A medida foi publicada no site da Câmara. Segundo o comunicado, a suspensão visa "não afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nas eleições", em respeito à lei e "demais normas eleitorais".
Além da Lei das Eleições (9.504/1997), a Câmara cita dispositivos da Constituição e da Resolução 23.610/2019, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Procurada pela Folha, a secretaria de Comunicação da Câmara disse que a medida "está em conformidade com a legislação vigente, foi respeitada em períodos eleitorais anteriores e é determinada pela Mesa Diretora do Legislativo".
A reportagem perguntou à Casa quais são os artigos que embasam o ato. Não houve resposta até a publicação deste texto.
De acordo com o artigo 73 da Lei das Eleições, nos três meses que antecedem o pleito é vedado aos órgãos públicos realizar publicidade institucional dos seus atos, programas, obras, serviços e campanhas.
A proibição passará a valer neste ano em 6 de julho. Com a decisão, o Legislativo sorocabano tira do ar seus canais de transmissão 35 dias antes desse prazo. Em 2022, a Câmara de Sorocaba também suspendeu suas comunicações mais próxima do pleito, em 7 de julho.
A decisão deste ano foi questionada pelos vereadores. Iara Bernardi (PT) pediu para que a Mesa Diretora reveja o ato. Ela e outros nove parlamentares assinaram requerimento.
"Sem TV e redes sociais, o engajamento da população, que já não é muito grande, fica ainda mais enfraquecido", disse Bernardi à Folha. "Se um pré-candidato infringir a lei eleitoral, que responda por isso. Mas tirar do ar uma TV que presta serviços públicos é desproporcional."
Especialistas em direito eleitoral divergem da Câmara sobre o prazo e a necessidade da suspensão. "A medida adotada por Sorocaba não encontra respaldo na legislação", diz o advogado Kaleo Dornaika.
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Embora os órgãos públicos estejam proibidos de fazer publicidade institucional a partir de 6 de julho, "não quer dizer que todos os canais devam ser suspensos", afirma Izabelle Paes Omena de Oliveira Lima, sócia do escritório Callado, Petrin, Paes & Cezar Advogados.
"Permanece o dever de dar transparência aos atos oficiais", diz a especialista. "Em relação às transmissões da TV Câmara, não existe uma determinação legal para que sejam suspensas."
O artigo 36-A e seu inciso 4º da Lei das Eleições determinam que "a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos" não configura propaganda eleitoral antecipada, "desde que não se faça pedido de voto", menção à pretensa candidatura ou exaltação de qualidades pessoais de pré-candidatos. As sessões podem "ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet".
Na mesma lei, o artigo 45 veda emissoras de rádio e TV de transmitirem "programa apresentado ou comentado por pré-candidato" a partir de 30 de junho. A proibição busca mitigar os efeitos de uma concorrência desleal que eles teriam em relação aos demais, afirma Dornaika.
Tal exemplo se aplicaria a José Luiz Datena (PSDB-SP), apresentador do "Brasil Urgente", da Band, caso oficialize sua pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo.
"Seria o caso de programas de TV cuja audiência cativa poderia ser direcionada precocemente ao voto, desequilibrando o pleito. Em nada se relaciona com a transmissão das sessões parlamentares", diz o advogado.
Segundo Lima, a respeito de publicações em sites oficiais, é importante que os órgãos públicos adequem os conteúdos, visando não infringir o artigo 73 da norma eleitoral. A punição, na maioria das vezes, é uma multa. "Em situações extremas, onde se comprove excesso na publicidade institucional, pode gerar a cassação do mandato do candidato beneficiado."