quinta-feira, 13 de junho de 2024

Como o PCC criou rede própria de hotéis em São Paulo mudando a Cracolândia de endereço, FSP

 As investigações da Operação Downtown mostraram que o Primeiro Comando da Capital (PCC) construiu sua rede de hotéis e hospedarias no centro da cidade como uma reação às operações que buscavam desmantelar o fluxo de usuários que por meia de uma década se concentrou entre a Alameda Dino Bueno e o Largo Coração de Jesus, na Luz. A infraestrutura, que começou a ser adquirida em 2022, permitiu ao grupo criminoso o poder de transferir a Cracolândia para qualquer área do centro que fosse de sua escolha sem prejudicar a logística do tráfico.

Operação mira rede de 78 hotéis e hospedarias do PCC no centro de São Paulo e cumpre 124 mandados de buscas; na foto movimentação de policiais no Condomínio Ed. Miri, na  praça Júlio Prestes
Operação mira rede de 78 hotéis e hospedarias do PCC no centro de São Paulo e cumpre 124 mandados de buscas; na foto movimentação de policiais no Condomínio Ed. Miri, na praça Júlio Prestes Foto: Werther Santana/Estadão

PUBLICIDADE

“Essa é uma investigação bastante complexa, que durou um ano”, afirmou ao Estadão o delegado-geral Artur Dian. Quatro departamentos da Polícia Civil foram mobilizados para auxiliar o Denarc nas buscas, que visam a obtenção de provas contra a organização criminosa. Os 124 locais escolhidos para as buscas estão em nomes de acusados de participar da facção ou de serem laranjas usados pelo PCC. Entre eles existem 78 hotéis e hospedarias, 26 das quais são clandestinas e tiveram a interdição decretada pela Justiça.

De acordo com o delegado Fernando José Santiago, da 4ª Delegacia Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc), responsável pelas investigações, a política da Prefeitura de fechamento das antigas hospedarias com construção de barreira de tijolos na fachada para vedar a entrada no prédio, iniciada no segundo semestre de 2021, foi o gatilho que determinou a migração do fluxo no ano seguinte.

Ao acompanhar o deslocamento do fluxo de usuários pela região do centro histórico de São Paulo, os policiais conseguiram demonstrar o controle exercido pelo crime organizado nessa ação. Os policiais do Denarc vasculharam as operações de compra e venda de imóveis na região para determinar quem estava adquirindo os hotéis, muitos deles por preços abaixo do valor venal dos imóveis – neste caso, a ação da facção teria levado à desvalorização dos prédios.

Policiais vigiaram a Rua dos protestantes durante as investigações e os hotéis suspeitos de serem usados pela facção
Policiais vigiaram a Rua dos protestantes durante as investigações e os hotéis suspeitos de serem usados pela facção Foto: Reprodução / Estadão

Os investigadores descobriram ainda que cada uma das mudanças do fluxo de usuários pelo centro da cidade ocorrida em 2022 foi precedida pela compra de imóveis para dar suporte logístico ao novo lugar da Cracolândia. É que as hospedarias e hotéis seriam usados para a guarda e depósito de drogas e armas, servindo ainda de esconderijo para criminosos do grupo. Foi investigando esse movimento que a polícia chegou a um dos principais alvos da operação de hoje: os estabelecimentos controlados por Marcelo Carames, de 45 anos, apontado como o gerente do tráfico de drogas do PCC na região.

Ele teria idealizado o esquema por trás da migração da Cracolândia. Ele era dono de hospedarias na Alameda Dino Bueno e no Largo Coração de Jesus, que foram emparedadas em 21 de outubro de 2021. O fluxo se concentrara ali durante uma década. O comerciante adquiriu, em dezembro daquele ano, duas novas hospedarias na Avenida Duque de Caxias, próximo da Praça Princesa Isabel, para onde o fluxo seria transportado pelo PCC no dia 19 de março de 2022.

imagem newsletter
NEWSLETTER
Política
As principais notícias e colunas sobre o cenário político nacional, de segunda a sexta.
Ao se cadastrar nas newsletters, você concorda com os Termos de Uso e Política de Privacidade.

Segundo a investigação, Carames comprou ainda uma nova hospedaria, a Pensão Paraíso, na esquina entre as ruas dos Gusmões e do Triunfo, a uma quadra da Rua das Protestantes, em 3 de junho de 2022. No dia 29 daquele mês, o fluxo se mudou para ali, estabilizando-se nessa área até hoje. Em 20 de março de 2023, o acusado comprou o Hotel Tupy, na Rua dos Gusmões.

PUBLICIDADE

Marcelo Carames é apontado como o gerente da rede mantida pelo PCC no centro da cidade
Marcelo Carames é apontado como o gerente da rede mantida pelo PCC no centro da cidade Foto: Reprodução / Estadão

“Carames por duas vezes se antecipou dias antes à migração dos dependentes químicos, estabelecendo hospedarias nos exatos locais para onde o ‘fluxo’ iria se fixar dias depois, o que deixa claro o envolvimento dele com a migração dos usuários de drogas no centro histórico”, afirmou o delegado Santiago. O Estadão não conseguiu localizar a defesa de Carames e dos hotéis investigados pelo Denarc.

Datena se lança a prefeito de São Paulo e aprofunda incertezas do PSDB, FSP

 Joelmir Tavares

SÃO PAULO

Conhecido pelo histórico de desistências na política, o apresentador José Luiz Datena foi lançado pré-candidato a prefeito de São Paulo pelo PSDB nesta quinta-feira (13) sob ceticismo do próprio partido, o 11º ao qual se filiou, e o risco de aprofundar divisões numa legenda fragilizada em várias frentes.

"Desta vez, vou até o fim", prometeu ele, que já desistiu de concorrer na última hora em quatro eleições.

José Luiz Datena durante lançamento de sua pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo pelo PSDB
José Luiz Datena durante lançamento de sua pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo pelo PSDB - Zanone Fraissat/Folhapress

O lançamento, realizado em um hotel na região central da capital, reuniu figuras do tucanato que resistiram aos abalos na sigla nos últimos anos. O jornalista entrou no partido em abril, inicialmente para ser vice de Tabata Amaral (PSB). Antes, em um intervalo de menos de um ano, passou por PDT e PSB.

Datena fez um discurso em que se disse agora mais consciente de sua responsabilidade do que das vezes anteriores em que flertou com uma candidatura, pregou o "expurgo de bandidos misturados com a administração" e disse que fará campanha sem colete à prova de bala, mas "com peito aberto".

Ele fez críticas indiretas a Ricardo Nunes (MDB), citando problemas da cidade e o que chamou de infiltração do crime organizado, especificamente o PCC, na administração. "Se me deixarem de cadeira de rodas, eu ganho a campanha", afirmou, insinuando contrariedade da facção com sua candidatura.

PUBLICIDADE

As falas no evento definiram o lançamento da pré-candidatura como um marco do que seria o renascimento do PSDB, avesso à polarização e disposto a recuperar seu protagonismo na cidade e no país. Dirigentes rebateram afirmações como a de que Datena chega "para o funeral" da legenda.

O jornalista, que apresenta o programa "Brasil Urgente", da Band, reiterou ao público e aos dirigentes que desta vez não desistirá de se candidatar, mas a incerteza sobre a decisão do jornalista é admitida nos bastidores do PSDB, que avalia internamente cenários sem o pré-candidato.

LEIA TAMBÉM

Jornalista é lançado pré-candidato em São Paulo pelo PSDB

Além da aliança com Tabata, defendido por uma ala, a opção é embarcar na campanha à reeleição de Nunes, caminho que também está longe de ser unanimidade entre as diferentes correntes que ocupam as direções municipal e nacional.

A equação envolve ainda o Cidadania, partido que compõe uma federação com o PSDB e precisa estar alinhado a qualquer um dos movimentos.

Se fosse seguida a lógica de 2020, o PSDB apoiaria Nunes, já que ele era o vice na chapa de Bruno Covas. Com a morte do tucano, em 2020, o emedebista assumiu a cadeira. Ele usa como estratégia o discurso de que sua gestão é de continuidade da administração Covas, mas sofreu rejeição de parte dos antigos correligionários, sobretudo por sua aproximação com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Datena apareceu com 8% de intenção de voto na pesquisa mais recente do Datafolha, divulgada em 29 de maio, atrás de Guilherme Boulos (PSOL), que marcou 24%, e Nunes, com 23%. O apresentador ficou empatado com Tabata, também preferida por 8% do eleitorado, e Pablo Marçal (PRTB), com 7%.

O ato de lançamento da pré-candidatura reuniu o presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, o municipal, José Aníbal, e outros tucanos como o deputado federal Aécio Neves (MG), o prefeito de Santo André, Paulo Serra, e o ex-vereador da capital Mario Covas Neto, o Zuzinha.

Aécio foi um dos mais entusiasmados na mesa, referindo-se a Datena como alguém que "fará a população de São Paulo voltar a acreditar em um projeto político" e defendendo que a candidatura própria do PSDB na cidade terá peso para influenciar os rumos do partido nacionalmente e nos próximos anos.

"São Paulo não é Las Vegas, onde o que acontece lá fica por lá. O que acontece em São Paulo tem importância para o Brasil inteiro", disse o ex-presidenciável, que em diferentes momentos lamentou não ter chegado ao Planalto nas eleições de 2014 e manifestou discordâncias com Lula e Bolsonaro.

A sigla não tem mais vereadores na capital, desde que os oito representantes na Câmara se desfiliaram para engrossar a campanha de Nunes. Os pré-candidatos da sigla a vereadores foram apresentados no evento, que reuniu dezenas de militantes. Parte dos filiados, contudo, já está apoiando Nunes.

Para ser oficializado como candidato, Datena precisa ter o nome homologado em convenção. Os partidos têm que fazer a reunião entre 20 de julho e 5 de agosto e registrar as candidaturas até 15 de agosto.

No caso do apresentador, porém, também precisa ser obedecida a regra de se afastar do programa que apresenta ao vivo de segunda-feira a sábado. A lei estabelece que pré-candidatos à frente de programas de TV ou rádio não podem continuar na função a partir de 30 de junho, um domingo.

Datena e Aécio Neves em lançamento de pré-candidatura em SP
Datena e Aécio Neves em lançamento de pré-candidatura em SP - Zanone Fraissat/Folhapress

Em outras vezes em que ensaiou migrar para a política, Datena enterrou a chance de candidatura ao entrar no ar depois do prazo permitido. Há dois anos, quando estava cotado para concorrer como senador pelo PSC, ele apareceu normalmente na TV e avisou no próprio programa os motivos da desistência.

Há dois meses, acompanhado de Tabata durante sua filiação ao PSDB, o jornalista disse que "o futuro a Deus pertence". Na época, as falas indicavam que o caminho era sua indicação pelo partido para vice na chapa da deputada federal. "A minha vontade é estar do lado da Tabata", afirmou ele.

A decisão de lançá-lo pré-candidato surgiu a partir de sua entrada no PSDB, com a avaliação da cúpula de que a popularidade de Datena seria útil na busca de reposicionamento do partido, hoje esfacelado na cidade onde nasceu. Pesquisas de opinião mostrando viabilidade de seu nome reforçaram o cálculo.

No ato desta quinta, o apresentador elogiou Tabata, dizendo que continua respeitando a deputada e a vê como nome promissor da política brasileira, mas falou que "as circunstâncias mudaram" desde a manobra em que ela viabilizou sua filiação ao PSDB para ser seu vice.