sexta-feira, 7 de junho de 2024

Baixaria na sessão do caso Janones simboliza atual nível da Câmara, FSP

 

BRASÍLIA

O palco não poderia ser o mais adequado, o Conselho de Ética, órgão conhecido por colocar panos quentes nas mais variadas faltas de decoro de parlamentares. O que se viu na sessão desta quarta-feira (5) representa um microcosmo do atual nível da política na Câmara dos Deputados como um todo.

O relato frio é o de que André Janones (Avante-MG), político que liderou parte da campanha digital de Lula (PT) em 2022, escapou de processo por suposta "rachadinha" após o também lulista Guilherme Boulos (PSOL-SP) sugerir o arquivamento do caso, o que acabou ocorrendo por 12 votos a 5.

As cerca de duas horas e meia de sessão, porém, apresentaram muito mais do que isso: gritos, xingamentos, ameaças, intimidações físicas e até deputado se vangloriando por matar gente deram a tônica de baderna, que não se resumiu apenas à quase troca de socos e pontapés dentro da sessão, mas a uma perseguição pelos corredores da Câmara.

Os deputados Cabo Gilberto (PL-PB) e Guilherme Boulos (PSOL-SP) discutem duante sessão do Conselho de Ética da Câmara que arquivou processo sobre suspeita de "rachadinha" contra André Janones (Avante-MG)
Os deputados Cabo Gilberto (PL-PB) e Guilherme Boulos (PSOL-SP) discutem duante sessão do Conselho de Ética da Câmara que arquivou processo sobre suspeita de "rachadinha" contra André Janones (Avante-MG) - Lula Marques - 5.jun.24/Agência Brasil

Fora o ringue ao vivo, outros dos males atuais da política também se fizeram presentes: debates rasos, pouquíssima familiaridade com regras ou com o que está sendo discutido, corporativismo, acordos intramuros, hipocrisia e performances pensadas e executadas para lacração em redes sociais.

A história dessa sessão do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados no dia 5 de junho de 2024 começa algumas semanas antes.

Pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, Boulos apresentou um curtíssimo parecer pelo arquivamento do caso sustentando que a suspeita de "rachadinha" se refere a fato anterior ao mandato de Janones, logo, não haveria por que falar em quebra do decoro parlamentar se Janones nem parlamentar era.

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Ocorre que o áudio em que o congressista pede a devolução dos salários de assessores e a própria investigação do caso no Supremo Tribunal Federal, deturpada pelo parlamentar do PSOL em seu parecer, indicam que ele já estava de posse do mandato.

Boulos foi questionado pela Folha sobre esses pontos por mais de uma vez e nunca deu resposta. Na sessão do conselho, seus adversários preferiram tentar lhe imputar a pecha de defensor da "rachadinha" e ninguém o questionou especificamente sobre as discrepâncias de seu relatório.

A tropa de choque bolsonarista que lotou o Conselho de Ética mesmo sem integrar o órgão estava direcionada a outros objetivos: alvejar a imagem de Janones, o adversário da campanha e arquirrival das redes sociais, e fustigar a pré-campanha de Boulos.

O Conselho é composto por 21 deputados titulares, mas 44 registraram presença. Com apenas uma exceção —o petista Rogério Correia (MG)—, todos os outros "forasteiros" eram bolsonaristas.

Foram eles Abilio Brunini (PL-MT), Delegado Éder Mauro (PL-PA), Delegado Paulo Bilynskyj (PL-SP), Julia Zanatta (PL-SC), Junio Amaral (PL-MG), Nikolas Ferreira (PL-MG), Pastor Marco Feliciano (PL-SP), Rodolfo Nogueira (PL-MS), Zé Trovão (PL-SC), Sargento Fahur (PSD-PR) e Mauricio Marcon (Podemos-RS).

Além dos deputados, ganhou assento na sala o pré-candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, que de celular nas mãos teve direito ao seu bate-boca pessoal com Boulos após esse chamá-lo de "coach picareta".

Nenhum bolsonarista demonstrou constrangimento pelo fato de que o tema que eles usavam para atacar de forma virulenta —e quase física— Janones, a suspeita de "rachadinha", tem na família Bolsonaro um de seus maiores símbolos.

Coube ao deputado Cabo Gilberto (PL-PB), suplente do conselho, ler voto divergente, a favor do prosseguimento do caso, exemplo quase solitário de parlamentar que ao menos tentou promover alguma argumentação técnica.

Nos discursos e xingamentos fora dos microfones, termos com "palhaço" (de Nikolas a Janones), "Moleque de rede social" (de Rogério Correia a Marçal) e "cachaceiro" (de Marcos Polon a Lula) precederam a fala de defesa de Janones —segundo a qual se a tese de cassação para crimes anteriores ao mandato valesse, tinha deputado ali que perderia o mandato por ter agredido namorada, assaltado banco e matado pessoas.

Nesse momento, Éder Mauro, ex-delegado de polícia que já declarou ter matado "muita gente", levantou o dedo, arrancando risos de colegas.

A vitória do aliado de Lula na comissão ocorreu não só com o apoio da esquerda, mas dos partidos de centro e de direita que compõem a base do governo, tudo mediante suspeita de acordão para livrar o aliado.

"Defender o Janones é pagar uma conta. A conta de quem trabalhou na campanha de 2022 com uma série de acusações de fake news para proteger o Lula. Estão pagando o preço possivelmente de uma candidatura a prefeito para não deixar um dos seus para trás", disse, por exemplo, Abilio Brunini.

Após o anúncio do resultado, bolsonaristas foram para frente da bancada onde estava Janones para proferir xingamentos contra o parlamentar, que devolveu os chamando de "gado". A seguir, chamou Nikolas para resolver a questão no braço do lado de fora e o resultado pode ser visto nos vários vídeos feitos na ocasião.

Depois de muito empurra-empurra e ameaças de agressão, a arenga se transportou para fora da sala, seguindo pelos corredores da Câmara, com Nikolas e Janones novamente ameaçando ou tentando se pegar, não estivessem ali os policiais legislativos para contê-los.

E não parou por aí. Nas redes, Janones discutiu ainda com vários opositores e, ao final, postou pedido de desculpas à comunidade LGBTQIA+ por ofensas homofóbicas contra Nikolas.

Já o bolsonarista postou vídeo em que conclama as pessoas a entrar na política porque, em suas palavras, "isso aqui está um lixo".

Boulos, que saiu da sala do conselho antes do anúncio do resultado da votação de seu relatório, não estimulou o assunto em suas redes.

Mesmo tendo dito a frase por outros motivos, talvez Gustavo Gayer (PL-GO) tenha sido profético ao afirmar, na primeira fala da sessão deste dia 5, que "o Brasil vai olhar para essa votação de hoje".

Justiça condena quadrilha especializada no golpe do amor, FSP

 A Justiça paulista condenou nove pessoas acusadas de formar uma quadrilha especializada no chamado golpe do amor, também conhecido como o golpe do Tinder.

A quadrilha, segundo denúncia feita pelo Ministério Público, utilizava aplicativos de relacionamento para se aproximar das vítimas e combinar encontros. Na hora marcada, a pessoa era abordada por criminosos armados e levada para um cativeiro, onde tomavam seus cartões bancários, telefone celular e senhas.

Logo do Tinder, aplicativo de namoro usado por quadrilha para sequestrar e roubar pessoas, o que ficou conhecido como "golpe do Tinder" - Martin Bureau / AFP

A fim de não despertar suspeitas dos sistemas antifraude das instituições bancárias, antes de começar a desviar os recursos, os criminosos procuravam conhecer o comportamento financeiro das vítimas: saber os tipos de transações que costumavam fazer, os valores e a frequência das movimentações.

Com isso, evitavam um bloqueio precoce das contas bancárias.

Na sentença em que condenou os acusados, o juiz Paulo de Mello afirmou que a quadrilha agia com "enorme sofisticação", dividindo-se em setores que cuidavam das diversas atividades necessárias para o crime.

Um setor, por exemplo, era incumbido de criar perfis falsos nos aplicativos de encontro. Outro era responsável por sequestrar as vítimas. Um terceiro cuidava dos cativeiros. Havia ainda uma equipe responsável por arregimentar pessoas dispostas a abrir contas bancárias e alugá-las para a organização.

Em outubro de 2022, segundo a denúncia do Ministério Público, um integrante da organização criminosa, fazendo-se passar por uma mulher de nome Maria Clara, marcou encontro com uma das vítimas na Vila Jaguara, em São Paulo.

Ao chegar ao local marcado, por volta das 20h20, a vítima foi rendida por três criminosos. O grupo o levou vendado para o cativeiro, um barraco de madeira sem janelas e com forte cheiro de urina e fezes.

Ele ficou cinco dias no lugar, período no qual a quadrilha conseguiu desviar R$ 220 mil por meio de diversas operações bancárias com seu cartão de crédito e débito.

Os criminosos também foram à casa da vítima, onde roubaram eletrodomésticos, bem como um automóvel.

Na decisão em que condenou os acusados, o juiz afirmou que as vítimas eram soltas apenas quando concluíam que haviam retirado todos os valores possíveis.

Foram condenados Alisson Porfírio (18 anos de reclusão), apontado como o líder do grupo, Wallace de Oliveira e Diego Lopes (18 anos e 4 meses) e Jaqueline Alves, João Warnava, Stephany Nunes, Paulo da Silva, Jairan Santos e Jéssica Jesus (15 anos e 9 meses dez)

Eles ainda podem recorrer.

A defesa de Alisson disse à Justiça que ele nunca integrou qualquer organização criminosa e que não existem provas de que ele tenha participado dos crimes

Diego disse ser inocente e que foi utilizado como "laranja", apenas cedendo sua conta bancária.

Wallace disse que a acusação não foi provada pelo Ministério Público e requereu sua absolvição.

Jairan e Jéssica Jesus disseram não haver provas de que participaram da organização criminosa.

Sthefany afirmou à Justiça que apenas emprestou sua conta bancária para uma amiga e que nada recebeu por isso.

Paulo afirmou não haver provas de que tenha participado dos crimes.

João disse que suas contas foram utilizadas por pessoas que aproveitaram de sua candura e ingenuidade.

Jaqueline declarou não ter participado de qualquer crime.

Bolsonaros provam do próprio veneno com a 'PEC das Praias', FSP

 Na década de 1970, auge da especulação imobiliária na zona sul carioca e nas orlas de São Conrado e Barra da Tijuca, os cartunistas exploraram a situação olhando o futuro: praias cercadas e com roletas antes das quais o banhista tinha de pagar para ter direito a se bronzear, relaxar embaixo da barraca, dar um tchibum ou apenas molhar os pés.

Em 2013 a previsão se confirmou. Dentro do Forte de Copacabana, uma faixa de areia com 70 metros de extensão tornou-se território exclusivo, um clube de luxo para 500 felizardos que se dispunham a desembolsar uma fortuna e usufruir de camarotes, salão de beleza, banheiras de hidromassagem, apresentação de DJs, serviço de mordomo, equipe médica e segurança reforçada. "Nem em Paris os garçons entendem tanto de bebida. Posso bebericar uma taça de Veuve Clicquot e fazer escova no cabelo após mergulhar", elogiavam as frequentadoras.

A farra vip durou um verão. Acabou quando o Exército, pressionado pelo Ministério Público e o instrumento legal que protege "o livre acesso às praias e às águas públicas", cancelou o contrato com a empresa que explorava o espaço. A patuleia o apelidou de "praia dos riquinhos".

Tão discutida nos últimos dias, a PEC relatada pelo senador Flávio Bolsonaro incentiva a criação dos beach clubs. Alguns já operam no país sem impedimento, em Florianópolis e no litoral do Nordeste. É um sonho do ex-presidente Bolsonaro. Transformar lugares como Angra dos Reis em réplicas da Cancún mexicana, quem sabe com o acréscimo de cassinos. Um paraíso para lavar dinheiro.

Aprovado com facilidade na Câmara em 2022, o controle das praias hoje é motivo de indignação nas redes e combustível para tretas entre celebridades e ex-jogadores de futebol que viraram empresários. Depois de provar do próprio veneno, Flávio disfarça, prometendo mexer no texto da proposta. Como quem anda dando pulinhos na areia quente.

O Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli/Folhapress

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