Ainda faltavam três meses para as eleições, mas, em agosto passado, a equipe de marketing de Danilo Cortez de Souza achou que valia dar um gás na campanha.
O desenho de um garotinho com olhos azuis gigantes, cabelinho arrumado com gel, calçando luvas e adornado por uma capa de super-herói foi a estratégia escolhida para o Instagram do candidato.
A versão infantil e estilizada de Danilo do Posto de Saúde mereceu apenas 120 likes —é pouco, se comparado aos números das outras fotos e vídeos que o perfil oficial divulgou desde sua criação, em janeiro de 2020. Danilinho, o desenho, nunca mais apareceu na página.
De todo modo, mesmo com o discreto malogro do personagem, o Danilo de carne e osso acabou eleito.
A candidatura de Danilo pelo Podemos saiu do pleito com 19.024 votos. O futuro vereador, que toma posse em janeiro, acha que Danilinho ainda terá uma sobrevida, mesmo que não seja mais necessário lutar por votos.
“A gente teve uma reação inesperada do público infantil na minha campanha, as crianças se identificaram comigo”, diz Danilo do Posto de Saúde, 37. “Não sei se foi pela musiquinha, o jingle, né? Ou se é por eu ser carismático. Mas explodiu muito com as crianças, e eles tiveram a ideia do personagem."
Inicialmente, Danilinho daria conselhos na área de saúde. “Acredito que ele continue, porque a ideia deu certo.” Entre outros assuntos, o personagem falaria sobre o calendário de vacinação, assunto que também não parece ser problema para o Danilo real.
“Na minha concepção, acho que todos estão aguardando ansiosamente a vacina porque é uma esperança de a gente se livrar do vírus. Tem logicamente uma disputa política em cima disso, visando 2022, Doria e Bolsonaro, mas é a esperança do povo. A comprovação de eficácia já foi feita."
Ele, no entanto, não pretende se vacinar. Não é que não queira, mas diz que talvez não precise, ao sugerir uma imunidade prolongada.
Danilo contraiu Covid-19 durante a campanha. Ele conta que, quando a quarentena parecia estar menos radical, por volta do mês de abril, decidiu visitar comunidades. “Fui saber se eles precisavam de alguma coisa, e numa dessas idas aconteceu.”
Começou a perceber que havia algo de errado quando apareceram sintomas que pareciam de uma gripe normal. A febre surgiu, e Danilo fez o teste. “Fiquei 15 dias resguardado. Tive falta de ar em alguns momentos, fiquei preocupado.”
O receio principal era porque Danilo divide a casa com o pai, o psicólogo Vanderlei Vieira de Souza, 66, diretor de uma unidade da Fundação Casa, na zona norte. Os dois passaram duas semanas “isoladíssimos”, sem contato um com o outro. “Ele é grupo de risco, já tem problemas pulmonares e pressão alta."
Danilo usou na campanha o slogan “zona norte precisa voltar a crescer”. “São mais de 80 anos de Vila Maria, minha família inteira é daqui.”
Ele se diz apaixonado pelo bairro, e que isso é comum entre seus moradores. “A Vila Maria é um dos bairros mais bairristas de São Paulo, ao lado da Mooca, se não for o mais."
“E é um sentimento que vai passando de geração para geração. Acho que é por causa da união dos moradores, o conhecimento das famílias. O pai nasceu lá, o avô nasceu lá”, afirma, ressaltando também o fator geográfico para a popularidade da região.
“O pessoal procura muito lá pelo acesso rápido. Fica do lado da Dutra, da Marginal Tietê, e da Fernão Dias. Três principais vias de São Paulo são rodeadas pela Vila Maria. E é um bairro muito seguro."
Por achar que a região não tinha um representante na Câmara Municipal, ele focou em prometer levar mais saúde à zona norte, “principalmente na parte que abrange o Edu Chaves até a Casa Verde e que tem mais de um milhão de habitantes”.
“Vejo a deficiência de equipe de saúde, de exames, temos pouquíssimas alternativas nessa região, enquanto a região Norte Dois tem bem mais. A nossa luta sempre foi essa, de trazer mais centros de exames e equipamentos para a população”.
Com o superior incompleto em administração —ele conta que precisou trancar a faculdade em 2019 por cauda da “correria da campanha”—, Danilo se tornou conhecido pelo trabalho de auxiliar administrativo na UBS Dr. Luiz Paulo Gnecco, ou, como ele diz, “popularmente conhecido como posto de saúde da Vila Munhoz".
Entre suas atribuições principais estava coordenar a agenda de consultas e exames.
“Comecei a cativar as pessoas por fazer um serviço de tratamento mais humanizado, mais diferenciado do que na época os funcionários públicos que já estavam lá há 30 anos faziam. Eu atendia diferente, e o pessoal queria passar comigo."
Ele conta que seu plano era trazer ideias novas para desburocratizar a UBS. “Vir com um SUS novo mesmo, sabe?”, diz. Uma das propostas seria unificar pedidos de encaminhamento dos médicos para especialistas.
“Hoje o paciente passa com o clínico geral e é encaminhado para uma especialidade. Se ele passa num posto do governo ou no hospital público, o pedido não serve, então ele tem que passar novamente no clínico geral da UBS, e acaba tirando a vaga de quem precisa passar pela primeira vez."
“Acho que tem que começar a aceitar encaminhamento independente de onde veio. O cara já foi avaliado, então por que tem que passar de novo na UBS só para trocar esse pedido?”, questiona.
A vida pública, ele diz, “está no sangue”. O avô e os pais foram dirigentes de partidos políticos por anos, e Danilo costumava ajudar nas campanhas quando criança. “Eu panfletava com seis anos de idade, mas nunca pensei em ser candidato."
“Mas os pacientes me procuravam e falavam: ‘Pô, Danilo, você tem que ser, você trata todo mundo bem, todo mundo gosta de você, você é o cara'. Isso foi entrando na minha cabeça e abracei a ideia”, lembra. “De lá pra cá, não parei de trabalhar visando as eleições de 2020."
Danilo acredita que sua relação com o público da UBS foi decisiva para a eleição. “Conheço 99% dos pacientes que frequentam pelo nome e sobrenome. E olha que a gente atende uma média de 7.000 no mês.”
“Com certeza vou sentir saudade. Gostava muito de fazer aquilo ali. De acordar todo dia sabendo que vou ajudar alguém”.
RAIO-X
- Danilo do Posto de Saúde
- Podemos
- Superior incompleto
- 19.024 votos