terça-feira, 13 de outubro de 2020

Como extrair o melhor, financeiramente, dos espaços públicos de São Paulo?, Livro

  

Endividamento do Estado, ineficiência administrativa, austeridade e responsabilidade fiscal, transparência. Essas são questões básicas para a gestão econômica dos países. No Brasil, particularmente, nunca estiveram em tamanha evidência. Mas há um aspecto fundamental geralmente subaproveitado – quando não desconsiderado – pelos governos: os enormes ativos que eles têm à sua imediata disposição. Escrito por Dag Detter e Stefan Fölster, dois experts em economia e finanças públicas, A Riqueza Pública das Nações –Como a Gestão de Ativos Públicos Pode Impulsionar ou Prejudicar o Crescimento Econômico mostra como o poder público pode utilizar esses recursos para aumentar seus rendimentos, reduzir custos e melhorar os serviços prestados aos cidadãos.

 

Quase todos os governos possuem mais riqueza do que têm conhecimento

A solidez de uma empresa pode ser medida pela capacidade administrativa de seus gestores. Uma diretoria com larga experiência no mercado é capaz de otimizar processos e fazer com que os recursos disponíveis rendam bons frutos. Todavia, quando esses recursos são públicos é comum que eles fiquem sob a responsabilidade de políticos e dirigentes politicamente indicados, que, com frequência, não possuem a competência necessária para geri-los.

Governos do mundo inteiro sofrem com o déficit em suas contas, mas têm bilhões de dólares em ativos públicos – bens e direitos que podem gerar renda se estruturados e utilizados de modo adequado (estatais, imóveis comerciais, infraestrutura, florestas e patrimônio histórico, por exemplo). O problema é que, no geral, esses ativos são mal

administrados ou negligenciados. Gerir melhor essa riqueza ajudaria a equalizar o endividamento ao mesmo tempo que contribuiria para um possível crescimento econômico. Para tanto, uma solução seria levar esses recursos para um Fundo Nacional de Riquezas administrado por profissionais que, livres de interferências políticas, o fariam em prol de toda a população.

 

A doce armadilha da riqueza pública

Muitos países que se encontram em situação financeira difícil possuem centenas de empresas, escrituras de terras e outros ativos, mas não se dão o trabalho de avaliar essa riqueza pública e muito menos administrá-la em prol do bem comum. Mas é justamente a maneira como a riqueza pública é gerida um dos elementos básicos que separam países bem administrados dos malsucedidos.

Por todos esses motivos, A Riqueza Pública das Nações chama a atenção para uma questão nevrálgica nesse contexto: o importante não é quem ou sob que orientação ideológica se administram os ativos públicos, mas a qualidade da gestão desses recursos. O foco, quando se trata de riqueza pública, deve ser o rendimento que ela pode propiciar, não sua propriedade em si.

Por meio de exemplos concretos, como Cingapura, Áustria e Suécia, e apresentando uma série de números impressionantes, Dag Detter Stefan Fölster calculam que uma gestão aprimorada e melhor controle dos recursos comerciais em propriedades públicas poderiam:

 restringir a pressão sobre os orçamentos governamentais;

 reduzir a dívida e os impostos;

 custear investimentos dos próprios governos em áreas como infraestrutura;

 fortalecer a democracia;

 coibir a corrupção, diminuindo as brechas para o mal-uso do patrimônio do Estado (vide o ocorrido com a Petrobras, por exemplo, foco de escândalos e que acabou perdendo mais da metade do valor de mercado).

O caminho apontado: impedir os governos de ter acesso direto à riqueza pública e confiar todos os ativos estatais a um Fundo de Riqueza Nacional que possa empregar as pessoas mais talentosas – dos setores público e privado – para administrá-los do modo mais eficiente possível.

Trazendo argumentos atrativos e bem estruturados ao longo de um texto bastante detalhado, mas de leitura agradável, o livro demonstra que, com criatividade e transparência, as soluções para as crises que muitas nações enfrentam estão, literalmente, bem ao seu alcance.

 

* Mais informações sobre o livro e seus autores podem ser acessadas pelo site publicwealthofnations.com.

* Em 2015 o livro também recebeu o Asset Leadership Impact Awards, concedido pela Asset Leadership Network em reconhecimento à avaliação criteriosa de ativos do governo e à contribuição nas discussões sobre o endividamento público.

* Na opinião de Adrian Wooldridge, editor e colunista da revista The Economist, “os estrategistas políticos de todas as convicções políticas seriam tolos se não dessem atenção a este livro”.

 

Sobre os autores

Dag Detter é consultor de investimentos na Europa e na Ásia, especializado em identificar ativos de elevado potencial que exibem um desempenho fraco. Como presidente da Stattum, a holding do governo sueco, e um dos diretores do ministério da indústria desse país, realizou a primeira e mais profunda transformação de ativos comerciais em estatais. Também atuou amplamente como banqueiro de investimento e consultor nos setores corporativo, imobiliário e financeiro da Ásia e Europa.

Stefan Fölster é diretor executivo do Reform Institute, um think-tank de Estocolmo cujo foco são as reformas inovadoras, e professor associado de Economia no Royal Institute of Technology. Ele foi anteriormente o economista chefe da Confederação das Empresas Suecas. É autor de muitos artigos e livros sobre economia.

segunda-feira, 12 de outubro de 2020

New York Times questiona trabalho de sua repórter sobre terrorismo, FSP

 Diogo Bercito

A repórter Rukmini Callimachi, do New York Times, se firmou nos últimos anos como uma das grandes especialistas da imprensa em terrorismo. Foi  indicada ao consagrado prêmio Pulitzer por suas investigações sobre as organizações radicais al-Qaida e Estado Islâmico. Virou uma das estrelas daquele jornal americano. Foi tida como um novo modelo de repórter, conectado às redes sociais e capaz de produzir um variado material audiovisual em diversas plataformas.

Até que, no fim de setembro, a polícia canadense acusou um homem conhecido como Abu Huzayfah de ter mentido sobre ter feito parte do Estado Islâmico. Huzayfah é um dos personagens principais do podcast Caliphate, do New York Times, e Callimachi baseou parte de sua premiada narrativa na história dele — que, ao que parece, era falsa. Caíram por terra, assim, algumas das detalhadas descrições de Callimachi sobre como funcionava aquele auto-proclamado califado.

A notícia não ruiu apenas o podcast da repórter. Com as informações divulgadas desde então, ficou evidente que Callimachi, assim como seus chefes, estavam cientes da fragilidade do depoimento de Huzayfah. Ainda assim, decidiram lançar o projeto em abril de 2018, pelo qual colheram loas. Colegas e ex-colegas foram a público, ademais, para questionar o trabalho de Callimachi. O New York Times decidiu investigar algumas das reportagens da jornalista. No domingo (11), o próprio jornal publicou um artigo sobre os problemas no trabalho.

“Ela era tida como  uma estrela — uma posição que a ajudou a sobreviver uma série de questionamentos feitos nos últimos seis anos por colegas no Oriente Médio”, segundo o texto do New York Times. Ela foi criticada por um de seus tradutores, por exemplo. Foi acusada, também, por ter coletado milhares de documentos no Iraque e levado embora. Foi dito que sua abordagem em relação ao terrorismo resvalava no sensacionalismo. E veio à tona um episódio do ano passado, em que especialistas em terrorismo provaram que os documentos usados por Callimachi em outra matéria eram falsos. Veja abaixo, em inglês, alguns dos tuítes desmentindo a apuração dela.

Além do New York Times, outros grandes veículos americanos têm acompanhado a crise em torno do trabalho de Callimachi. O Washington Post, por exemplo, publicou também um longo artigo destrinchando as inconsistências na apuração dela. Mas a questão não é apenas sobre prática jornalística. O trabalho de um repórter como Callimachi tem consequências na elaboração de políticas. Como lembra o New York Times, a apuração dela foi citada por autoridades americanas avessas à migração de muçulmanos aos Estados Unidos. Os textos de Callimachi também influenciaram o debate no Canadá sobre o que fazer com as mulheres de membros do Estado Islâmico.

Para este Orientalíssimo blog, a questão toca em outro ponto importante sobre a cobertura feita pela imprensa em lugares como a Síria e o Iraque. Por vezes, jornalistas não seguem o mesmo rigor que é esperado, por exemplo, de quem escreve sobre os Estados Unidos ou a Europa. Proliferam, ademais, jornalistas que — como Callimachi — não falam árabe e, portanto, dependem de tradutores para conversar com seus interlocutores. Não é raro encontrar em campo jornalistas que pouco ou nada estudaram sobre o Oriente Médio, mas acabam determinando o tom do debate público. Testemunhei isso inúmeras vezes, como correspondente da Folha em Jerusalém em 2013 e 2014.

Ainda há, por outro lado, bastantes entusiastas do trabalho de Callimachi. Ela própria tem compartilhado em seu perfil na rede social Twitter diversas mensagens de apoio e elogios à cobertura. Em uma das mensagens que Callimachi retuitou, Margaret Sullivan — do Washington Post — sugere que parte das críticas à repórter é resultado de ressentimento de seus colegas, inveja por seu sucesso e machismo.


Primeira semana de volta às aulas em SP tem desinformação e confusão, FSP

 Laura Mattos

SÃO PAULO

A primeira semana da reabertura da educação em São Paulo esbarrou na desinformação de escolas e de diretorias de ensino sobre as regras para a retomada.

As diferentes normas para escolas estaduais, municipais e privadas, com o governo do estado e cada prefeitura legislando ao mesmo tempo sobre a reabertura, além de confundir gestores escolares, deve levar a ações judiciais em alguns municípios.

Em Assis (SP), na última quarta (7), o Tribunal de Justiça revogou o decreto da prefeitura que autorizava a volta às aulas apenas na rede privada, dizendo que era preciso haver equidade entre alunos do ensino particular e do público. A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, que defende a abertura simultânea, calcula que o mesmo deve ocorrer em Marília e em Bauru, onde só as privadas puderam voltar.

A única regra comum para todos na capital é a limitação de 20% do número de estudantes. Nas regras do estado, há a limitação de até 35% do número de alunos, que passará a 70% depois de 14 dias na fase verde.

Já a rede estadual está autorizada a funcionar até cinco horas por dia. A privada não tem limite de horário.

Mesmo assim, na diretoria de ensino da região centro sul da capital, por exemplo, supervisores exigiram que escolas privadas só recebessem os alunos duas vezes por semana e, no máximo, por duas horas. Na diretoria centro oeste, houve colégios obrigados a abrir somente no contraturno.

Essas limitações foram determinadas pela Prefeitura de São Paulo apenas para as escolas municipais e não valem nem para as estaduais nem para as privadas, mas a comunicação se mostrou falha, e a Secretaria de Educação do Estado tem interferido a fim de impedir restrições maiores do que as oficiais.​

O governo estadual autorizou a reabertura para atividades extracurriculares em setembro e para aulas regulares em outubro em todas as cidades que estivessem há pelo menos 28 dias na fase amarela do Plano SP.

As prefeituras podem seguir essa diretriz ou ser mais restritivas. Às vésperas das eleições, em meio ao medo de pais e à pressão de sindicatos de professores pela manutenção do fechamento, prefeitos continuam adiando o retorno. Na capital, Bruno Covas (PSDB) autorizou apenas a abertura para extracurricular e recuperação em outubro e ainda não confirmou o início das aulas regulares para este ano. Além disso, em vez dos 35% de alunos permitidos pelo estado, reduziu o número para 20%.

No entanto, com a entrada 76% da população do estado na fase verde, inclusive a capital, deverá pesar na equação um apelo maior pelo retorno. Na sexta (9), circulou em grupos de WhatsApp de pais, nos quais há até pouco tempo só se compartilhava conteúdo contrário à volta às aulas, um vídeo que em que prefeitos são chamados “hipócritas” por manter as escolas fechadas.

No material, uma mãe e seu filho aparecem espremidos no metrô entre pessoas sem máscara, passam calor. Ela está com a máscara no queixo, e ele tira a dele para falar. Um homem espirra na cabeça do menino, e se dá o seguinte diálogo: “Mãe, por que não posso ir para a escola?”; “Aglomeração, meu filho! É muito perigoso. Vai ficar na casa da sua avó”; “Mas ela não é do grupo de risco?”; “Eu preciso trabalhar! Vou te deixar na casa do prefeito, então?!”

O governo estadual, que já que tem falado publicamente sobre os riscos do isolamento prolongado para a saúde de crianças e jovens, reforçará a campanha pela reabertura e tem a expectativa de que haja maior adesão nos próximos dias. Na quarta (7), o Conselho Estadual de Educação de São Paulo, órgão formado por educadores para definir políticas educacionais, aprovou recomendação para que as escolas reabram, mencionando prejuízos do fechamento, inclusive a explosão da evasão escolar.

No estado de São Paulo, de acordo com a secretaria de Educação, 128 municípios autorizaram por decreto a abertura a partir de setembro e outros 90, em outubro. Incluindo cidades que liberaram a volta sem um decreto específico, ou seja, baseando-se no do estado, são 322 das 645 do Estado com o retorno das aulas permitido.

Na capital, até a última sexta-feira (9), haviam retornado 394 das 1.086 escolas estaduais e somente uma municipal.

A rede pública esbarra em falta de estrutura. Em uma escola estadual da zona norte, por exemplo, a diretora mandou um áudio por WhatsApp aos pais explicando que não iria reabrir em outubro porque ainda não havia recebido máscaras, totens para álcool em gel e termômetros. Além disso, explicou que a equipe de limpeza não é suficiente.

A Secretaria Estadual de Educação afirmou que está trabalhando para solucionar esses problemas, que o órgão defende que são pontuais. Segundo a secretaria, já foram entregues mais de 3 milhões de máscaras, 120 mil face shields e 5.000 totens de álcool em gel, e esses números vão subir. A entrega, de acordo com o governo, prioriza escolas que já tenham previsão de retorno. Além disso, os colégios podem também buscar equipamentos nas diretorias de ensino.