Economista Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES, disse que o País não demonstrou sinais de que sairá da depressão econômica em que se encontra; sobre uma candidatura do ex-presidente Lula, ele diz que ela será "obviamente vitoriosa"; "Do ponto de vista de Presidência da República, se a crise continuar, a candidatura de Lula é, obviamente, a candidatura vitoriosa. Porém, não penso que o PT seja o partido vitorioso. Com isso se criará uma situação muito curiosa: teremos uma renovação enorme na base do Congresso, e as pessoas que vão se eleger são aquelas que se dizem não políticas. Com isso teremos uma espécie de renovação de currículos", afirmou
domingo, 7 de maio de 2017
Só cadeia não dá jeito na roubança - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 07/05
Um cafajeste da gangue de Sérgio Cabral compôs um verbete lapidar do dicionário do diabo da roubança institucionalizada, soube-se na semana que passou. "Meu chapa... Podemos passar pouco tempo na cadeia... Mas nossas putarias têm que continuar", escreveu esse Sérgio Côrtes, ex-secretário de Saúde (!) do Rio, para um comparsa.
Um tempo na cadeia, a evasão de parte do roubo confesso e planos de continuar no crime não são considerações estratégicas apenas desse sujeito, Côrtes, como tem sido possível perceber pelo descobrimento da história da corrupção neste século. Para muito político, servidor, empresário e executivo, ser flagrado ou preso parece apenas um momento ruim e reversível dos negócios.
Torna-se mais claro, como sempre deveria ter sido, que impunidade é apenas parte do problema. O suborno federal ganhou volume da descoberta do mensalão (2005) até bem depois do primeiro aniversário da Lava Jato. A taxa de investimento em propina da Odebrecht chegou ao auge no ano das condenações do mensalão (2012).
As punições parecem insuficientes. Perda de direitos políticos por oito anos ou ficha suja são ora restrições leves. Multas para empresas também: algum método de expropriação deve ser considerado na lei, além de longas inabilitações para o direito de ocupar cargos de direção em companhias. Não estamos tratando de corrupção episódica, ainda que frequente, mas de subornocracia.
No entanto, isso tudo é remédio e remendo. Os quase 80 anos em que muita grande empresa brasileira foi cevada pelo Estado contribuíram para essa degeneração terminal. Os 30 anos de apodrecimento negocista do sistema partidário e de seleção perversa de políticos, também (esse sistema que era "funcional" para muito cientista político).
Mas, posto assim, o diagnóstico é genérico e amplo demais para permitir tratamentos viáveis, alguns de urgência, pois o país está carcomido, à beira de ruir.
Um passo é apartar empresas do Estado, não importa se nem todas as grandes se aproveitaram, mamaram ou saquearam. O Estado é sócio de pelo menos 22 das 50 maiores empresas. Das 25 maiores, uma dúzia está metida nos escândalos que explodiram desde 2014. Nem se mencionem subsídios, empréstimos subsidiados ou proteções e reservas de mercado variadas. É nocivo que o BNDES seja sócio de mais de 30 grandes empresas.
Gente no governo quer acabar com subsídios via empréstimos, inclusive no crédito rural. Além de distorcer preços, juros etc., subsídio via banco estatal amplia o poder de arbítrio. O plano, velho, é dar subsídio direto, se for o caso, discutido pelo Congresso e registrado no Orçamento.
Parece bonito, em tese. Mas, dado que parlamentares vendiam a rodo leis para empresas, não se sabe bem como o troço pode funcionar. Também não se desmontam as participações acionárias do Estado de hora para outra. Mas a reforma tem de começar já, ao lado de privatizações tradicionais (e estes são poucos exemplos de mudanças necessárias). Talvez o país precise até de novas empresas ou agências estatais de desenvolvimento. Mas seriam outras e poucas. Isso que está aí em geral está podre ou morto.
Além de cana dura, precisamos de muita reforma institucional, sobre o que não estamos falando.
Um cafajeste da gangue de Sérgio Cabral compôs um verbete lapidar do dicionário do diabo da roubança institucionalizada, soube-se na semana que passou. "Meu chapa... Podemos passar pouco tempo na cadeia... Mas nossas putarias têm que continuar", escreveu esse Sérgio Côrtes, ex-secretário de Saúde (!) do Rio, para um comparsa.
Um tempo na cadeia, a evasão de parte do roubo confesso e planos de continuar no crime não são considerações estratégicas apenas desse sujeito, Côrtes, como tem sido possível perceber pelo descobrimento da história da corrupção neste século. Para muito político, servidor, empresário e executivo, ser flagrado ou preso parece apenas um momento ruim e reversível dos negócios.
Torna-se mais claro, como sempre deveria ter sido, que impunidade é apenas parte do problema. O suborno federal ganhou volume da descoberta do mensalão (2005) até bem depois do primeiro aniversário da Lava Jato. A taxa de investimento em propina da Odebrecht chegou ao auge no ano das condenações do mensalão (2012).
As punições parecem insuficientes. Perda de direitos políticos por oito anos ou ficha suja são ora restrições leves. Multas para empresas também: algum método de expropriação deve ser considerado na lei, além de longas inabilitações para o direito de ocupar cargos de direção em companhias. Não estamos tratando de corrupção episódica, ainda que frequente, mas de subornocracia.
No entanto, isso tudo é remédio e remendo. Os quase 80 anos em que muita grande empresa brasileira foi cevada pelo Estado contribuíram para essa degeneração terminal. Os 30 anos de apodrecimento negocista do sistema partidário e de seleção perversa de políticos, também (esse sistema que era "funcional" para muito cientista político).
Mas, posto assim, o diagnóstico é genérico e amplo demais para permitir tratamentos viáveis, alguns de urgência, pois o país está carcomido, à beira de ruir.
Um passo é apartar empresas do Estado, não importa se nem todas as grandes se aproveitaram, mamaram ou saquearam. O Estado é sócio de pelo menos 22 das 50 maiores empresas. Das 25 maiores, uma dúzia está metida nos escândalos que explodiram desde 2014. Nem se mencionem subsídios, empréstimos subsidiados ou proteções e reservas de mercado variadas. É nocivo que o BNDES seja sócio de mais de 30 grandes empresas.
Gente no governo quer acabar com subsídios via empréstimos, inclusive no crédito rural. Além de distorcer preços, juros etc., subsídio via banco estatal amplia o poder de arbítrio. O plano, velho, é dar subsídio direto, se for o caso, discutido pelo Congresso e registrado no Orçamento.
Parece bonito, em tese. Mas, dado que parlamentares vendiam a rodo leis para empresas, não se sabe bem como o troço pode funcionar. Também não se desmontam as participações acionárias do Estado de hora para outra. Mas a reforma tem de começar já, ao lado de privatizações tradicionais (e estes são poucos exemplos de mudanças necessárias). Talvez o país precise até de novas empresas ou agências estatais de desenvolvimento. Mas seriam outras e poucas. Isso que está aí em geral está podre ou morto.
Além de cana dura, precisamos de muita reforma institucional, sobre o que não estamos falando.
O arejamento da política - EDITORIAL ESTADÃO
A falta de lideranças no cenário político é resultado de um processo que, em grande medida, foi provocado. Mais do que isso, foi criteriosamente concebido no passado e segue sendo retroalimentado para tolher o aparecimento de qualquer novidade que represente uma ameaça a interesses estabelecidos.
A monótona repetição de sobrenomes que se vê nos quadros do Congresso Nacional a cada ciclo eleitoral não é, na maioria das vezes, o corolário de bem-sucedidas trajetórias políticas pautadas pelo interesse público, e por essa razão reconhecidas nas urnas. Ao contrário, é fruto de uma perniciosa dominação de quintais eleitorais e engrenagens partidárias por uma casta de próceres avessa à renovação.
Nesse processo de desertificação das lideranças políticas – tão gritante no cenário de crise que o País vive atualmente – não se pode deixar de ter em conta os efeitos nocivos de decisões arbitrárias tomadas durante a ditadura militar, principalmente após o Ato Institucional n.º 5 – baixado em 13 de dezembro de 1968 –, e que repercutem até hoje.
Foi a partir daquele momento – marcando o recrudescimento do regime – que os governantes sacramentaram o poder de identificar e punir qualquer pessoa que pudesse ser considerada uma “inimiga da revolução”, noção que de tão porosa foi responsável pelo afastamento de uns – tanto forçado como voluntário – e desinteresse de outros que poderiam desempenhar importantes papéis no campo político, não fosse a constante ameaça que passou a pairar sobre suas cabeças.
Pouco a pouco, a política foi perdendo o seu poder de atração de grandes quadros nas universidades, nas empresas, nas artes, em diversos setores da sociedade civil. O resultado foi a completa devastação de seus recursos humanos e a concentração do poder nas mãos de pequenos grupos que se encastelaram em seus feudos e passaram a amesquinhar a atividade política com a repetição de modelos oligárquicos que servem tão somente para manter o País no atraso, na pobreza e, agora, na indignidade.
Tido como um grande fenômeno de liderança política, o ex-presidente Lula da Silva é produto dos mais exemplares de todo esse processo. Eleito dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC em 1975, Lula representava o líder perfeito para uma esquerda sonhada pelo regime militar como arremedo de oposição – hoje se sabe a que preço. O escândalo de corrupção desvelado pela Operação Lava Jato mostrou ao País que a propalada liderança política do ex-operário que chegou à Presidência da República foi bancada justamente por aqueles contra os quais ele vociferava em cima dos palanques.
Por mais que se tente, é impossível, hoje, dissociar as imagens de Lula e do PT. O partido nada mais é do que a vontade e os desígnios de seu líder máximo, não obstante as vozes de alguns partidários – que agora parecem se elevar após um período de hibernação – propondo a “refundação” do partido.
De nada adiantará o estímulo para que as famílias, as escolas e as universidades formem lideranças se o ingresso na atividade política continuar a ser tolhido pelo caciquismo de meia dúzia de senhores que, quando muito, se valem da hereditariedade típica de regimes monárquicos para passar um verniz de renovação em suas agremiações. Isso não quer dizer que descendentes de lideranças políticas estejam, a priori, condenados ao banimento da atividade. Entretanto, a hereditariedade, por si, não é sinônimo de talento. O que se vê no cenário político hoje é a mais absoluta mediocridade, que prospera justamente por ser confortável, por não impor desafios.
Os esforços de superação da grave crise por que passa o País incluem, necessariamente, uma reforma político-partidária. A Constituição em vigor determina que o fazer político passe obrigatoriamente pelos partidos. Sem o seu arejamento, sem o surgimento de novas e modernas lideranças, a vida política nacional será sinônimo de podridão e mediocridade – de atraso, enfim.
A monótona repetição de sobrenomes que se vê nos quadros do Congresso Nacional a cada ciclo eleitoral não é, na maioria das vezes, o corolário de bem-sucedidas trajetórias políticas pautadas pelo interesse público, e por essa razão reconhecidas nas urnas. Ao contrário, é fruto de uma perniciosa dominação de quintais eleitorais e engrenagens partidárias por uma casta de próceres avessa à renovação.
Nesse processo de desertificação das lideranças políticas – tão gritante no cenário de crise que o País vive atualmente – não se pode deixar de ter em conta os efeitos nocivos de decisões arbitrárias tomadas durante a ditadura militar, principalmente após o Ato Institucional n.º 5 – baixado em 13 de dezembro de 1968 –, e que repercutem até hoje.
Foi a partir daquele momento – marcando o recrudescimento do regime – que os governantes sacramentaram o poder de identificar e punir qualquer pessoa que pudesse ser considerada uma “inimiga da revolução”, noção que de tão porosa foi responsável pelo afastamento de uns – tanto forçado como voluntário – e desinteresse de outros que poderiam desempenhar importantes papéis no campo político, não fosse a constante ameaça que passou a pairar sobre suas cabeças.
Pouco a pouco, a política foi perdendo o seu poder de atração de grandes quadros nas universidades, nas empresas, nas artes, em diversos setores da sociedade civil. O resultado foi a completa devastação de seus recursos humanos e a concentração do poder nas mãos de pequenos grupos que se encastelaram em seus feudos e passaram a amesquinhar a atividade política com a repetição de modelos oligárquicos que servem tão somente para manter o País no atraso, na pobreza e, agora, na indignidade.
Tido como um grande fenômeno de liderança política, o ex-presidente Lula da Silva é produto dos mais exemplares de todo esse processo. Eleito dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC em 1975, Lula representava o líder perfeito para uma esquerda sonhada pelo regime militar como arremedo de oposição – hoje se sabe a que preço. O escândalo de corrupção desvelado pela Operação Lava Jato mostrou ao País que a propalada liderança política do ex-operário que chegou à Presidência da República foi bancada justamente por aqueles contra os quais ele vociferava em cima dos palanques.
Por mais que se tente, é impossível, hoje, dissociar as imagens de Lula e do PT. O partido nada mais é do que a vontade e os desígnios de seu líder máximo, não obstante as vozes de alguns partidários – que agora parecem se elevar após um período de hibernação – propondo a “refundação” do partido.
De nada adiantará o estímulo para que as famílias, as escolas e as universidades formem lideranças se o ingresso na atividade política continuar a ser tolhido pelo caciquismo de meia dúzia de senhores que, quando muito, se valem da hereditariedade típica de regimes monárquicos para passar um verniz de renovação em suas agremiações. Isso não quer dizer que descendentes de lideranças políticas estejam, a priori, condenados ao banimento da atividade. Entretanto, a hereditariedade, por si, não é sinônimo de talento. O que se vê no cenário político hoje é a mais absoluta mediocridade, que prospera justamente por ser confortável, por não impor desafios.
Os esforços de superação da grave crise por que passa o País incluem, necessariamente, uma reforma político-partidária. A Constituição em vigor determina que o fazer político passe obrigatoriamente pelos partidos. Sem o seu arejamento, sem o surgimento de novas e modernas lideranças, a vida política nacional será sinônimo de podridão e mediocridade – de atraso, enfim.
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