Dizem que o amor é difícil. Dizem que os relacionamentos amorosos são ainda mais difíceis. Tudo mentira. O amor é simples. Os relacionamentos que importam são mais simples ainda.
Há quem discorde. Jean Garnett, em ensaio para o New York Times, compartilha as suas dores e ensina alguns conceitos a este cavalo velho e cansado. "Heterofatalismo." "Desafiliação performativa da heterossexualidade." "Alexitimia masculina normativa".
Você não sabe o que significam? Little Couto está aqui para ajudar.
"Heterofatalismo" designa a frustração das mulheres heterossexuais com o comportamento emocional ou sexual dos homens. Jean Garnett descreve encontros promissores que terminaram em retirada. Numa hora, estão interessados. Na hora seguinte, não têm certeza. Aparecem. Desaparecem. Aparecem e desaparecem de novo.
Como escreve a autora, em desespero: por que motivo os homens usam eufemismos —"não posso", "não tenho certeza"— quando seria mais honesto se optassem pelo "não quero"?
A "desafiliação performativa da heterossexualidade" é consequência dessa ambivalência. Ocorre quando duas amigas hétero lamentam a sua sorte por não serem lésbicas. Tudo seria mais fácil se pudessem desistir dos homens de uma vez por todas.
Os homens não conseguem expressar os seus sentimentos com clareza e maturidade. Esse é o problema. Sofrem de "alexitimia masculina normativa".
Se você é leitora habitual de Little Couto, pode estar achando que estou de gozação. Não estou. Várias amigas relatam a mesma experiência. Pedem conselhos.
Eu dou. "Foge" ou "esquece" são os verbos que mais uso. Quando insistem para eu desenvolver, eu desenvolvo: você foi avaliada, minha querida, e não tirou nota máxima. Não sei se foi seu rosto, sua altura, seu peso, sua idade —ou só a comparação com outras mulheres que ele já conheceu, ou conhece, ou espera ainda conhecer. Não importa. Não perca seu tempo com homens assim.
Eu mesmo já perdi tempo com mulheres assim e gostaria que alguém tivesse me dito "foge" ou "esquece" na hora certa. Para usar um conceito científico: esse tipo de ambivalência sempre acaba em merda.
Felizmente, poderei agora recomendar um filme de Celine Song, que trata do mesmo assunto, "Amores Materialistas". Estreia esta semana no Brasil. Na trama encontramos Lucy, papel de Dakota Johnson, "matchmaker" de Nova York que já conseguiu nove casamentos entre clientes.
Como ela mesma se define, é uma espécie de doutora Frankenstein do amor. A cliente chega, diz o que procura —a altura, a idade, o preparo físico, o estado capilar, a conta bancária do futuro namorado— e Lucy sai caçando.
No mercado sentimental de Nova York, quanto mais novas, melhor (para eles) e quanto mais altos, melhor (para elas).
Num dos diálogos mais insanos do filme, Lucy conversa com uma colega sobre as cirurgias a que os homens se submetem para crescerem mais 15 centímetros. É um procedimento doloroso e caro —custa US$ 200 mil—, que pode compensar no final: um centímetro a mais significa um degrau acima na cadeia alimentar.
O materialismo que Lucy pratica não serve apenas para os clientes. Ela mesma reconhece que é uma "celibatária voluntária" em busca de um homem rico. O ex-namorado, que preenchia quase todos os requisitos, falhava nesse detalhe. Onde estava o dinheiro para pagar o uísque das crianças?
Já Harry, papel de Pedro Pascal, que Lucy conhece no casamento de uma cliente, parece feito à medida —ou quase: o que falta em amor será compensado com todo o resto. Ou, como dizia o sábio Nelson Rodrigues, dinheiro compra tudo, até amor verdadeiro.
"Amores Materialistas" é uma comédia romântica —o gênero mais difícil do cinema, porque sempre exige afinação perfeita nos diálogos. Celine Song é uma escritora nata —já sabíamos disso desde "Vidas Passadas"—, e a sua própria experiência como "matchmaker" confere à história uma verossimilhança que a afasta do tradicional conto de fadas.
Não revelo o final do filme. Exceto para reafirmar o que escrevi no início —e que aprendi com meio século de vida: o amor é simples, e os relacionamentos que importam são mais simples ainda.
No seu texto desesperançado para o New York Times, Jean Garnett escreve, como se fosse um pedido irrealista: "Um homem deve me desejar urgentemente ou não me desejar de forma alguma". Será exigir muito?
Não é, minha querida. Para falar a verdade, isso é o mínimo dos mínimos.
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