Quando pisou em Pequim, em 1972, Richard Nixon estabeleceu um paradigma na política. Naquele momento de tensão global, um gesto de conciliação com os chineses seria encarado com desconfiança pelo eleitor americano. Mas a reputação do presidente como um anticomunista incontestável foi visto como garantia de rigor com os rivais.
A expressão "Nixon vai à China" passou a ser usada para descrever episódios em que um representante de uma corrente ideológica faz uma jogada tipicamente associada a uma linha política contrária. Seu objetivo é explorar a credibilidade interna para reduzir resistências e persuadir seu próprio campo da importância de determinada medida.
Flávio Dino pareceu disposto a desembarcar em Pequim quando decidiu dar peso à pauta da segurança pública. Num evento ao lado de Lula, no terceiro mês de governo, o ministro reconheceu que a esquerda tinha dificuldade de enfrentar o assunto. "Segurança pública não é um tema da direita", sentenciou.
Boa parte dos eleitores de Lula cobra soluções rápidas para a violência. Assim como parte da direita, muitos defendem o aumento do policiamento e admitem rigor no enfrentamento ao crime. Resistências ficam por conta de elites políticas e movimentos sociais, escaldados por décadas de brutalidade estatal.
Dino usou credenciais de esquerda para flexibilizar visões nesse campo. Manteve um discurso firme contra a matança policial e o vale-tudo das armas de fogo, mas também trabalhou para convencer Lula a mergulhar numa agenda de combate ao crime organizado que incluísse a ampliação de despesas com as polícias.
Em seu balanço final como ministro, Dino buscou um equilíbrio direcionado ao público interno. Disse que segurança "não é invadir bairros populares e fuzilar idosos, crianças e mulheres", mas também reconheceu que hoje esse trabalho é impossível sem um aumento do encarceramento. Ricardo Lewandowski e seus auxiliares podem ter mais trabalho para enviar essas mensagens.
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