terça-feira, 30 de maio de 2023

Repensar São Paulo, editorial FSP

 Lá se vão quase 70 anos desde que as autoridades paulistanas propalavam, com indisfarçável orgulho, que São Paulo era "a cidade que mais crescia no mundo".

Se o slogan dos festejos do quarto centenário, em 1954, anteviu o que seria a maior metrópole da América Latina, a expansão vertiginosa e desenfreada produziu iniquidades urbanísticas em série.

O escasso planejamento e um certo fetiche rodoviarista de seus governantes legaram ocupações em regiões sensíveis, como morros, entornos de cursos d’água e represas; impermeabilização excessiva do tecido urbano; inequivalência de infraestrutura nos bairros, a destacar malha de transportes e áreas verdes; bolsões de pobreza nas franjas da cidade.

Em meio à emergência climática, projetar um regramento que oriente o crescimento sustentável da capital —e que ao menos mitigue graves equívocos do passado— é uma imposição premente.

Torna-se inevitável e bem-vinda, portanto, a revisão do Plano Diretor Estratégico de São Paulo, que determina, entre outros pontos, a distribuição e proporcionalidade de moradias, serviços e indústrias.

Aprovado em 2014, ainda na gestão Fernando Haddad (PT), o plano atual teve sua atualização adiada em 2021, devido à pandemia, e segue em discussão, agora sob a administração Ricardo Nunes (MDB).

A necessidade, contudo, não justifica o açodamento em curso. Dias antes da votação do projeto na Câmara Municipal, marcada para quarta-feira (31), o relator Rodrigo Goulart (PSD) apresentou substitutivo que altera significativamente o texto original —que havia sido discutido por meses entre especialistas, autoridades e munícipes em audiências públicas.

Reportagem desta Folha apontou que construtoras propuseram 26 alterações: 15 delas foram incluídas e 3 parcialmente acatadas.

Entre os pontos polêmicos estão a possibilidade de ampliar a verticalização, com prédios mais altos, e as vagas de garagem no entorno de corredores de ônibus e estações de metrô. São justamente nesses locais que hoje estão mais da metade dos lançamentos imobiliários.

De forma correta, o Ministério Público de São Paulo entrou com pedido de liminar para que a tramitação seja interrompida e ocorram novas audiências públicas.

O que está em jogo é o futuro da cidade: adensamento desordenado, mais carros nas ruas e moradias populares afastadas dos eixos de transporte certamente não contemplam o interesse público.

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