Há não muito, já por causa dos ataques a Vinicius Junior na Espanha, escrevi neste espaço ("Arquibancadas racistas") que uma maneira de combater o racismo nos estádios daquele país seria a paralisação da partida assim que um torcedor urrasse a primeira ofensa. Não só o jogador atingido, mas os 22 abandonariam a bola, e o juiz pararia o jogo por quanto levasse para identificar os racistas. Se a paralisação acontecesse num lance de gol iminente para o time ofendido, este teria um pênalti a seu favor quando voltasse a partida. A punição seria esportiva, mas dura, e quem sabe os torcedores espanhóis se civilizassem.
Medida pouco prática e, vê-se hoje, tímida. Diante do gesto de Vinicius Junior neste domingo, de reagir aos insultos contra a sua dignidade de ser humano, insurgir-se contra seus agressores e cobrar responsabilidades de quem nunca esperava ser cobrado —cartolas, patrocinadores, televisões, governantes e a própria Espanha como nação—, algo de muito importante pode estar acontecendo.
Com sua coragem, Vinicius desbravou um caminho sem volta. Graças a ele, o racismo, que nunca foi mudo, deixará também de ser cego. Todos seremos obrigados a enxergá-lo.
Com sua atitude, Vinicius ofereceu a todo jogador preto que atua em campos de brancos o caminho para agir contra qualquer manifestação racista —o peso de ter de tomar uma iniciativa assim não existe mais. Uma grita planetária, exercida por muitos outros Vinicius, obrigará os conglomerados que bancam o futebol a impor a civilidade no esporte, para não verem seus produtos boicotados. E eles têm poder para isso, porque os clubes, mesmo os gigantes europeus, com suas dívidas bilionárias, não podem mais viver sem eles.
Mas, se Vinicius perder a luta —se nada se alterar no futebol e na sociedade—, é o caso de pensar a sério sobre quem enxergamos ao nos olharmos ao espelho.
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