Estamos estarrecidos, não é mesmo? Que alívio perceber que não perdemos a capacidade de nos indignar, que as imagens do dia de Nossa Senhora Aparecida que correram os jornais e as redes sociais ainda são capazes de nos despertar o horror. Mas o episódio, que teve vários momentos dentro e fora do santuário, ilustra a naturalização da barbárie no país.
O bolsonarismo consegue transformar tudo em arruaça, é mestre em deixar qualquer ambiente com clima de rebelião em presídio. Teve tumulto e agressividade. Arcebispo vaiado, fiéis hostilizados, imprensa agredida. Gente bêbada no interior da basílica disputava selfies com Jair Bolsonaro como se estivessem numa festa de peão. Um menino gritava contra jornalistas, tomado pela raiva cultivada por essa que virou uma seita política.
Nem dá para dizer que chegamos ao fundo do poço. Este lugar foi alcançado há tempos. Chafurdamos na lama cada vez mais. Buzinaço na porta de hospitais lotados de pacientes com Covid, tentativa de invasão de unidades de saúde, mortes causadas por divergência ideológica, exaltação à tortura, racismo e machismo institucionalizados, negação da fome.
O fanatismo protagonizado em Aparecida apenas evidencia o que sabemos. Além de terem sequestrado os símbolos nacionais, usam a religião apenas como veículo para engambelar o povo e fingir que seu projeto reacionário é calcado em valores cristãos, quando tudo o que têm é ódio e ressentimento.
Adoro igrejas, não porque seja de igrejas, de santos, de orações, mas porque são refúgios. Gosto de igrejas, não porque acredite nelas, mas porque elas acolhem os desesperados, os falidos, os doentes, os chifrudos. Somos iguais em nossos sofrimentos e ninguém liga se estamos descabelados, malvestidos, ranhentos. Gosto delas porque encontro conforto em seus bancos desconfortáveis, onde posso me ajoelhar e morrer de pena de mim mesma. Nesta semana, senti mais uma vez pena do país.
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