sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Hélio Schwartsman Por que políticos mentem?, FSP

 Às vezes, o logro está no cerne de sua estratégia. É o caso de líderes da extrema direita, mas não só dela, cujo sucesso depende de criar uma realidade paralela e nela manter a base mais fiel de seguidores. Só que essa não é a única situação em que políticos mentem. Eles o fazem também em circunstâncias em que só podem sair perdendo.

É o que ocorre quando exageram suas realizações e desfilam dados absurdos, que são incontinenti contestados pelas agências de checagem. Se sabem que serão desmentidos, por que insistem no logro? Parte da resposta é a cara de pau mesmo. Você sempre pode dizer que é o checador que está errado. Uma parte dos seus eleitores acredita mais em você do que nas agências e outra não liga para as mentiras. Os que ficam irritados são aqueles que já não votariam mesmo em você.

Algumas mentiras, porém, são tão escancaradas que assustam até aliados. Bolsonaro se meteu com uma dessas esta semana. No afã de distanciar-se de Roberto Jefferson, disse que não existiam fotos dos dois juntos. Em minutos, sites jornalísticos estavam abarrotados de imagens da dupla. E essa é uma mentira difícil de desconversar.

Minha conclusão é que mesmo um indivíduo que respira falsidades como Bolsonaro às vezes crê em suas fabulações. Sua mente estava tão ansiosa para afastar-se de Jefferson que criou uma lorota que outros módulos cerebrais aceitaram acriticamente. Imagino que o próprio Bolsonaro se surpreendeu ao ver as fotos.

Meu ponto é que não podemos levar as mentiras, especialmente as de políticos, levianamente. Alguns cientistas, como o primatologista Frans de Waal, defendem que a mentira e o logro com vistas a obter melhores posições sociais foram uma força a moldar a evolução humana mais importante do que as ferramentas e o cozimento. Essa tese é conhecida como hipótese da inteligência maquiavélica. No caso de Bolsonaro, mais maquiavélica do que inteligente.

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