Há um problema com os liberais brasileiros. Eles parecem não saber o que é liberalismo. A demonstração de ignorância desta vez vem do Novo, partido que se vende como agremiação genuinamente liberal. Pois bem, lideranças do Novo pedem a expulsão do fundador da legenda, João Amoêdo, por ter declarado voto em Lula. A sigla havia liberado seus filiados a se posicionarem como quisessem no segundo turno, mas a ala bolsonarista do partido, francamente majoritária, entende que Amoêdo difamou a imagem ou reputação do Novo, o que, pelo estatuto, é infração que pode gerar expulsão.
Há em primeiro lugar uma contradição lógica. Num pleito em que só há dois candidatos, como é o segundo turno, liberar filiados "para declararem seus votos e manifestarem seu apoio de acordo com sua consciência" implica aceitar qualquer um dos contendores. Ou a nota deveria ter explicitamente vetado o nome de Lula. Mas, se o tivesse feito, teria traído, não a lógica, mas os princípios liberais.
O que distingue o liberalismo de outras filosofias políticas e morais é a aceitação de que o mundo é um lugar cheio de incertezas e que indivíduos não precisam ter os mesmos objetivos e inclinações nem estabelecer as mesmas hierarquias de valores. Diante disso, cada pessoa deve ser livre para dizer e fazer o que preferir. Limitações a essa liberdade só são legítimas para evitar perigos concretos a terceiros.
É meio vago, admito, mas é essa vagueza que torna o liberalismo compatível com autores e correntes políticas tão diversos como Kant e Keynes, a democracia cristã e a social-democracia europeias.
A traição ao liberalismo promovida pelo Novo não é um caso isolado. O MBL, outro grupo supostamente liberal, já defendeu censura à nudez, e não são poucos os empresários que exigem liberdade na economia, mas a rejeitam na política e na agenda dos costumes. Com liberais desse quilate, nem precisamos de ditadores.
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