É difícil não ficar meio arrasado quando penso no relativo otimismo que tomou conta de mim e de muitos colegas, jornalistas de ciência e divulgadores científicos, quando ficou claro o tamanho do desafio que seria cobrir a pandemia de Covid-19 em março do ano passado. Achávamos que realmente seria possível fazer a diferença para o público trazendo informação de qualidade, embasada em ciência séria. Hoje (aliás, ao longo dos últimos vários meses), a minha sensação é de derrota quase completa. Eu me sinto um fracasso total. Falhamos.
Em março de 2020, o argumento que nos dava um grau considerável de esperança era este: numa situação como a que a gente está vivendo, o negacionismo seria inviável. É fácil minimizar ou negar a existência do aquecimento global quando os efeitos mais catastróficos da mudança climática causada pelo homem ainda estão a décadas de se concretizarem claramente. Já o tsunami do coronavírus engole as pessoas na escala de tempo de poucas semanas ou, no máximo, alguns meses, raciocinávamos então. Chegará uma hora em que a negação vai se tornar impossível — algo como gritar “Nem doeu!” depois de levar uma martelada na cabeça que tirou sangue e pode ter fraturado o crânio.
Tolinhos. Subestimamos o quanto as pessoas são capazes de viver em negação. O Brasil nunca tinha tido um movimento antivacinação de massas — antes, eram poucos bichos-grilos endinheirados os que fugiam de vacinas. No momento mais perigoso possível, um movimento desse tipo acaba de florescer, pelo que indicam as pesquisas de opinião.
O pior de tudo na sensação de desamparo, ao menos do meu ponto de vista, é não saber como fazer uma correção de rota na comunicação pública sobre o coronavírus, ou mesmo se uma correção desse tipo é possível. Precisamos tentar outro caminho, mas não faço ideia de qual ele seria. E, como estamos falando de uma doença infecciosa que depende primordialmente dos contatos sociais para continuar se espalhando, não adianta cruzar os braços e dizer que “Darwin cuida” de quem não quiser se proteger. Ou a imensa maioria de nós põe a mão na consciência, ou 200 mil mortos serão só o começo.
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