Como para todos, obviamente é difícil para um artista ou um gestor cultural encontrar o lado positivo de uma crise sanitária que tem mantido centros culturais fechados. Apesar desse impacto esmagadoramente negativo, vislumbra-se uma oportunidade excepcional e proveitosa para focarmos de maneira quase exclusiva no planejamento e na gestão das organizações.
Forçados pela crise atual, tanto gestores quanto artistas voltaram-se para a internet para oferecer uma programação cultural, como acertadamente está fazendo a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo). Antes da chegada da Covid-19, o streaming e as gravações eram, em geral, um suporte complementar às apresentações ao vivo. Hoje, é o único meio. As instituições que continuaram funcionando com programação pela internet entenderam que devem manter o vínculo com seu público e que têm uma função social a cumprir.
Neste novo contexto de consumo cultural, cabe indagar se uma instituição é imprescindível para sua comunidade e qual é sua real contribuição. Assim, distinguimos entre uma instituição cultural que oferece espetáculos variados sem uma “linha editorial” comum, de um lado, e uma que tenha uma missão clara e que busque um objetivo particular com sua programação, de outro.
A primeira limita-se ao mero entretenimento; a segunda busca ser relevante, mediante a educação e a discussão de temas que reflitam sobre o papel do ser humano em relação com seu ambiente —em suma, que abordam como a arte pode contribuir para o desenvolvimento da sociedade. A segunda é indispensável e pode se apresentar para buscar associados de longo prazo. As organizações culturais precisam ter uma identidade artística que as distinga, para fidelizar o público e ter um impacto positivo em suas comunidades.
Assim, o festival de ópera de Bayreuth, na Alemanha, foi concebido para apresentar o repertório wagneriano nas condições que o compositor imaginou originalmente. Bayreuth também é reconhecido por suas produções vanguardistas e provocadoras. De maneira similar, o Globe de Londres mantém a disposição do teatro elisabetano utilizado por Shakespeare e busca resgatar as práticas teatrais do início da Idade Moderna.
Se quando um centro cultural fecha suas portas e a produção que estava agendada pode apresentar-se da mesma maneira no teatro ao lado sem que altere em nada sua audiência, deduz-se que o público não estava identificado com a sala, mas sim com o espetáculo. Assim, é difícil observar a contribuição que esse centro cultural faz efetivamente para sua comunidade.
Esta crise sanitária oferece um momento privilegiado para que uma organização cultural elabore um plano de ações próprio, que desenvolva ou potencialize o compromisso com sua comunidade, para assim tornar-se indispensável. Não é apenas uma questão de financiamento, mas sim de criatividade.
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