quarta-feira, 23 de setembro de 2020

THOMAS YAKSIC BECKDORF Como uma instituição cultural pode ser indispensável?, FSP

 Como para todos, obviamente é difícil para um artista ou um gestor cultural encontrar o lado positivo de uma crise sanitária que tem mantido centros culturais fechados. Apesar desse impacto esmagadoramente negativo, vislumbra-se uma oportunidade excepcional e proveitosa para focarmos de maneira quase exclusiva no planejamento e na gestão das organizações.

Forçados pela crise atual, tanto gestores quanto artistas voltaram-se para a internet para oferecer uma programação cultural, como acertadamente está fazendo a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo). Antes da chegada da Covid-19, o streaming e as gravações eram, em geral, um suporte complementar às apresentações ao vivo. Hoje, é o único meio. As instituições que continuaram funcionando com programação pela internet entenderam que devem manter o vínculo com seu público e que têm uma função social a cumprir.

Neste novo contexto de consumo cultural, cabe indagar se uma instituição é imprescindível para sua comunidade e qual é sua real contribuição. Assim, distinguimos entre uma instituição cultural que oferece espetáculos variados sem uma “linha editorial” comum, de um lado, e uma que tenha uma missão clara e que busque um objetivo particular com sua programação, de outro.

A primeira limita-se ao mero entretenimento; a segunda busca ser relevante, mediante a educação e a discussão de temas que reflitam sobre o papel do ser humano em relação com seu ambiente —em suma, que abordam como a arte pode contribuir para o desenvolvimento da sociedade. A segunda é indispensável e pode se apresentar para buscar associados de longo prazo. As organizações culturais precisam ter uma identidade artística que as distinga, para fidelizar o público e ter um impacto positivo em suas comunidades.

Assim, o festival de ópera de Bayreuth, na Alemanha, foi concebido para apresentar o repertório wagneriano nas condições que o compositor imaginou originalmente. Bayreuth também é reconhecido por suas produções vanguardistas e provocadoras. De maneira similar, o Globe de Londres mantém a disposição do teatro elisabetano utilizado por Shakespeare e busca resgatar as práticas teatrais do início da Idade Moderna.

Se quando um centro cultural fecha suas portas e a produção que estava agendada pode apresentar-se da mesma maneira no teatro ao lado sem que altere em nada sua audiência, deduz-se que o público não estava identificado com a sala, mas sim com o espetáculo. Assim, é difícil observar a contribuição que esse centro cultural faz efetivamente para sua comunidade.

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Esta crise sanitária oferece um momento privilegiado para que uma organização cultural elabore um plano de ações próprio, que desenvolva ou potencialize o compromisso com sua comunidade, para assim tornar-se indispensável. Não é apenas uma questão de financiamento, mas sim de criatividade.

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