15 de agosto de 2020 | 03h00
Em sua conta no Instagram, a prefeita de Bogotá, Claudia López, percorre bairros assolados pela pandemia – nunca sem máscara. Nas horas de folga, flana pela cidade em sua bicicleta – nunca sem capacete. Numa live na semana passada, a “alcaldesa” lamentou a tragédia do coronavírus, mas disse que a situação poderia levar a uma modernização na mobilidade urbana. Para compensar a restrição de passageiros nos ônibus do TransMilenio – o BRT que interliga Bogotá –, ela criou 84 novos quilômetros de ciclovias. Claudia López pretende aumentar as faixas para bicicletas em 50% até o fim do mandato.
A opção pelas duas rodas não é capricho de prefeita que anda de bike. Trata-se de uma tradição da cidade. Em 1974, por demanda de moradores, Bogotá foi pioneira em fechar ruas para ciclistas. Hoje, 7% dos deslocamentos da cidade são em bicicletas, maior índice da América Latina. Andar de carro em Bogotá é um tormento. Em média, seus motoristas perdem 191 horas por ano em congestionamentos. “Temos que atacar esse problema e também evitar que o planeta acabe por causa das emissões de carbono”, disse Claudia López na live. “A bicicleta pode ser uma solução para as duas coisas.”
São Paulo dá café, Minas dá leite, Vila Isabel dá samba – e a Colômbia é celeiro de prefeitos instagramáveis e premiados internacionalmente. Em Bogotá, Claudia López segue a trilha de Antanas Mockus e Enrique Peñalosa. Em seus mandatos, eles transformaram a cidade em referência no urbanismo, apesar do trânsito. Por causa deles – e de prefeitos que, com a ajuda da sociedade civil, estancaram a criminalidade na Medellín de Pablo Escobar –, a Colômbia se tornou a Meca do urbanismo social, a vertente mais vibrante do debate atual sobre cidades. Com sorte, ouviremos muito a expressão nas campanhas municipais.
A capital brasileira que mergulhou mais fundo no urbanismo social foi o Recife. Ex-prefeitos de Medellín e Bogotá visitaram a “Veneza brasileira” durante a elaboração do projeto Compaz, destinado a comunidades carentes. Pelo menos três princípios da escola colombiana foram aplicados por lá: ouvir a sociedade local em cada projeto (como no caso das bicicletas em Bogotá); construir junto com os moradores; e deixar que eles próprios participem da gestão dos projetos. “É um ato de cidadania”, diz Murilo Cavalcanti, secretário de Segurança Urbana do Recife. Ele exemplifica com o centro de artes marciais Dojô, criado sob demanda dos moradores de uma comunidade. “Seus líderes reafirmaram algo forte na cultura do bairro e ainda usam as artes marciais para incentivar a educação formal dos jovens”, afirma Cavalcanti.
“Uma função central das prefeituras, hoje em dia, é criar oportunidades para os moradores das periferias”, diz Tomas Alvim, coordenador de um curso de urbanismo social no Insper, em São Paulo (ele e Cavalcanti são personagens dos minipodcasts da semana). A frase está em linha com outro adágio dos prefeitos colombianos: “As melhores obras para os lugares mais carentes”. A máxima – que, longe de populismo, implica estudos, envolvimento dos cidadãos e avaliações de impacto – poderia inspirar os candidatos brasileiros, ainda afeitos a obras que propiciem grandes inaugurações. Precisamos cada vez menos de gente que corta fitas – e cada vez mais de prefeitos padrão Colômbia.
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