11 de março de 2020 | 19h44
O petróleo é um produto sujeito a choques. Os mais importantes foram de forte alta. O de agora é choque de baixa.
Em 1973, os preços saltaram de US$ 3,50 por barril para cerca de US$ 12. Em 1979, chegaram a US$ 30 e, ao longo dos anos 2000, foram para a altura dos US$ 60. A partir daí, o forte aumento da procura proporcionado pelo crescimento da China e dos tigres asiáticos puxou as cotações para a altura dos US$ 120. A crise de 2008 voltou a derrubá-las. A estocada, que acontece em sentido inverso, acentuou o declínio, da faixa dos US$ 50 a US$ 60 para os US$ 35, em vigor desde domingo.
Essa derrubada determinada pela Arábia Saudita vem sendo vista por certos analistas apenas como resultado do desacordo episódico com a Rússia sobre a proposta de reduzir a oferta, de modo a estabilizar a demanda enfraquecida pela pandemia. Mas deve ser entendida como mais do que consequência desses fatores.
O que há é a primeira manifestação impactante do declínio da idade do petróleo, que já dura 150 anos. O quadro hoje é de superprodução e o mundo está encharcado de óleo. Os grandes produtores enfrentam grandes estoques e capacidade ociosa.
Antes da decisão da Arábia Saudita, tomada no último fim de semana, de aumentar a oferta em 2 milhões de barris diários ou até em 3 milhões, se for o caso, o mercado já mostrava instabilidade e forte dependência de que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) reduzisse a produção.
Há 20 anos, preços atraentes em torno dos US$ 100 por barril colocaram em movimento investimentos em óleo e gás em todo o mundo, inclusive aqui no Brasil. A mais importante dessas iniciativas aconteceu nos Estados Unidos na exploração de suas abundantes jazidas de xisto, onde petróleo e gás são liberados em terra por meio de bombardeio de água, areia e produtos químicos. Essa exploração tornou os Estados Unidos não apenas autossuficientes, mas também exportadores.
A primeira derrubada das cotações, por meio de aumento da oferta da Opep, há cinco anos, teve por objetivo tirar do mercado esses produtores americanos que operavam a custos acima de US$ 70 por barril. O resultado, no entanto, foi forte redução de custos desse segmento que, sozinho, produz hoje petróleo e gás em volume equivalente ao que vinha produzindo e exportando a própria Arábia Saudita.
Essa nova operação decidida agora parece ter o objetivo imediato de quebrar os produtores de óleo de xisto e também os que vinham operando com produção convencional de alto custo. Se conseguirá ou não, parece depender da disposição do governo dos Estados Unidos de apoiar o setor.
Mas o encolhimento da demanda mundial não acontece e está sendo acentuada apenas pelo mais baixo crescimento econômico imediato e pelo alastramento do coronavírus. Em todo o planeta crescem as pressões pela redução do consumo de combustíveis fósseis, tanto na produção de energia quanto na movimentação dos motores a explosão. A Comissão Europeia (Poder Executivo da União Europeia) fixou metas drásticas para reduzir até 2050 o consumo e incentivar a produção de carros elétricos e de energia renovável, especialmente as de fontes solar e a eólica.
O súbito barateamento dos preços pode até aumentar temporariamente o consumo e adiar projetos de produção de energia limpa, mas está no horizonte o declínio da importância do petróleo na economia mundial.
Para o Brasil, este é um sinal amarelo de forte intensidade, porque o governo federal e os Estados se tornaram fiscalmente dependentes do petróleo caro. Obtiveram receitas imensas nos leilões de áreas, pagamentos de royalties e contribuições especiais e arrecadação de impostos, especialmente de ICMS pelos Estados, sobre os preços dos combustíveis. As novas cotações derrubarão as receitas do setor público, que já vinham mergulhadas com a baixa atividade econômica.
Qual será a resposta política do governo? Certos setores pedem aumento imediato das despesas públicas com base em emissões de moeda e, portanto, de pressão inevitável sobre a inflação. A outra opção é redução das atribuições do Estado. Os debates sobre esse tema, que já vinham se acentuando com base na definição sobre a apropriação das verbas do Orçamento da União, deverão se ampliar agora. Especialmente depois que a Câmara derrubou o veto presidencial no caso da concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
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