terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Pacote de Moro prevê prisão após 2ª instância e crime para caixa 2; leia a íntegra

BRASÍLIA e RIO DE JANEIRO
Na sua principal ação desde que deixou a 13ª Vara Federal de Curitiba para ingressar no governo Jair Bolsonaro (PSL), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, divulgou nesta segunda (4) um projeto para modificar 14 normas e endurecer as penas para o crime organizado, corrupção e delitos violentos.
O texto inclui o cumprimento provisório da pena após condenação em segunda instância —tema considerado prioritário por Moro —e a criminalização do caixa dois.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, se reúne com governadores e secretários estaduais de Segurança Pública para apresentar o Projeto de Lei Anticrime
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, se reúne com governadores e secretários estaduais de Segurança Pública para apresentar o Projeto de Lei Anticrime - Marcelo Camargo/Agência Brasil
“Não adianta mexermos no restante da legislação se o processo penal não funcionar e não chegar ao fim num tempo razoável”, justificou Moro.
Para permitir a execução da pena antes do trânsito em julgado, Moro defende alterar o Código de Processo Penal.
“Ao proferir acórdão condenatório, o tribunal determinará a execução provisória das penas privativas de liberdade, restritivas de direitos ou pecuniárias, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos”, diz o texto apresentado.
Trata-se de um dos temas que mais geraram controvérsia nos últimos meses.
Desde 2016, o STF (Supremo Tribunal Federal) adotou o entendimento de que uma pessoa já condenada por um tribunal colegiado pode começar a cumprir sua pena.
Esse entendimento teve impacto direto na prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sentenciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. O STF marcou para 10 de abril nova análise sobre o tema.
Já a criminalização do caixa dois consta da parte do pacote que trata da lei eleitoral. Moro pede que seja considerado crime eleitoral “arrecadar, receber, manter, movimentar ou utilizar qualquer recurso, valor, bens ou serviços estimáveis em dinheiro, paralelamente à contabilidade exigida pela legislação eleitoral”.
Atualmente casos de caixa dois eleitoral são julgados com base em um dispositivo que aborda omissão ou falsidade na prestação de contas. Não há registro no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de condenações nesse sentido. Tampouco há previsão de uma pena mínima ou responsabilização para o doador.
Moro advoga por um novo entendimento nessa área. Ele pede que seja estabelecida pena de dois a cinco anos para o caixa dois, com aumento de até dois terços caso o condenado seja agente público. 
Não será a primeira vez que deputados vão se debruçar sobre o tema. A criminalização dessa prática chegou a constar de um projeto encampado pelo Ministério Público, conhecido como dez medidas de combate à corrupção. Os parlamentares acabaram desfigurando a matéria, que nunca foi aprovada.
Questionado nesta segunda se seu pacote anticrime não poderia ter o mesmo destino, Moro afirmou que no Congresso há “um outro momento político”. “Há uma abertura maior para propostas relacionadas à área de corrupção.”
“E o governo federal agora é um parceiro para melhorar essas medidas. Talvez não tenha sido tanto, em relação às medidas contra a corrupção, no passado”, acrescentou.
Moro começou a costurar alianças que lhe permitam reunir apoio parlamentar.
A apresentação do texto foi feita nesta segunda a um grupo de governadores, que ouviram do ministro um apelo para movimentar suas bancadas no Congresso para facilitar a tramitação.
Ao sair do Ministério da Justiça, o governador paulista, João Doria (PSDB), disse acreditar que os governadores trabalharão pelo sucesso da pauta de Moro no Congresso.
Antes da audiência com os governadores, o ex-juiz teve uma reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). Ao longo da semana, ele pretende se encontrar com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
A proposta de Moro precisará passar por comissões do Congresso e ser aprovada pelo plenário das duas Casas, por maioria simples, antes de ir para sanção de Bolsonaro.
O ministro Sergio Moro (Justiça), durante apresentação de pacote de propostas para segurança pública e contra a corrupção
O ministro Sergio Moro (Justiça), durante apresentação de pacote de propostas para segurança pública e contra a corrupção - Pedro Ladeira/Folhapress
Para ter maior chances de êxito no Legislativo, Moro optou por não encampar mudanças constitucionais em seu pacote anticrime —ele poderia, por exemplo, tentar cristalizar o entendimento sobre a prisão sem o trânsito em julgado na Constituição.
No entanto, caso houvesse uma emenda constitucional na proposta, a tramitação seria mais lenta, necessitaria de quóruns de votação maiores e ritos mais difíceis.
O ministro da Justiça também cita nominalmente, no texto, as principais facções do Brasil no trecho que enquadra o que são organizações criminosas.
Moro quer inserir na lei referências diretas ao PCC (Primeiro Comando da Capital), Comando Vermelho, Família do Norte, Terceiro Comando Pura e Amigo dos Amigos, além das milícias.
Ao justificar esse ponto, ele disse que se baseou na legislação italiana, que cita explicitamente associações mafiosas.
“Vamos deixar claro que essas são organizações criminosas”, pontuou o ministro. Em outro momento, ele defendeu que “é necessário jogar mais duro com essas entidades”.
Em mensagem enviada ao Congresso para início dos trabalhos legislativos, Jair Bolsonaro reforçou esse discurso e afirmou que o governo declarou “guerra ao crime organizado”. “Guerra moral, guerra jurídica, guerra de combate. Não temos pena e nem medo de criminoso. A eles sejam dadas as garantias da lei e que tais leis sejam mais duras. Nosso governo já está trabalhando nessa direção”, afirmou.
Moro também colocou em seu pacote um item que estabelece que pessoas condenadas por peculato, corrupção passiva ou corrupção ativa devem começar a cumprir suas penas já em regime fechado.
Ele deixa como exceção apenas se “a coisa apropriada ou a vantagem indevida” for de “pequeno valor”.
Outro item que consta no pacote é a possibilidade que estados e o Distrito Federal construam presídios de segurança máxima. Hoje, apenas a União é responsável por esse tipo de estabelecimento.
O projeto de lei de Moro, considerado uma espécie de superministro do atual governo, repercutiu no Congresso.
O deputado Marcelo Freixo (PSOL) criticou um item da redação que modifica o que é considerado excludente de ilicitude e legítima defesa.
Entre outras mudanças, Moro quer enquadrar nesse rol o “agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem”.
Para Freixo, “a medida dará salvo conduto jurídico a policiais que cometerem execuções”. Moro rebateu: “Não existe nenhuma licença para matar. Quem afirma isso está equivocado, não leu o projeto”, afirmou. “Na verdade, estabelece uma situação de conflito armado ou um risco iminente. Então acho que o policial não precisa esperar levar um tiro para ele poder tomar alguma espécie de reação, o que não significa que se está autorizando que se cometa homicídios indiscriminadamente”, completou.
Na base de apoio de Bolsonaro o pacote anticrime de Moro foi recebido com entusiasmo.
“‘Confronto armado com a polícia’ é eufemismo para bandido tentando assassinar policial. Parabéns ao ministro Moro por incluir no pacote a proteção aos policiais que fazem o seu serviço”, declarou, no Twitter, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP). 

TJ-RJ

Minutos antes de tomar posse, o novo presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Claudio Mello, elogiou, nesta segunda-feira (4), o pacote de medidas anunciado por Moro.
Segundo Mello, “Moro tem toda razão”. Alertando para a já existente superlotação dos presididos, o desembargador disse que a decisão em favor da prisão em segunda instância deve ser acompanhada de um aporte de recursos do governo federal.
Há uma superlotação e, com condenação em segundo grau, evidentemente haverá mais presos”, ressaltou Mello.
No estado do Rio, a superpopulação chega a 179%. “Tem que haver recursos. O governo deve fazer uma parceria ou emprestar dinheiro a fim de possibilitar [o atendimento de] essa demanda já existente e que poderá aumentar ainda mais”, disse.

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