terça-feira, 17 de outubro de 2023

Bolsonaro é tratado como 'eterno presidente' em evento da Rota com Tarcísio e Nunes, FSP

 Artur Rodrigues

SÃO PAULO

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o prefeito Ricardo Nunes (MDB) voltaram a se reunir em São Paulo nesta segunda-feira (16), em evento de aniversário de 53 anos da Rota, tropa de elite da Polícia Militar de São Paulo.

O trio apareceu junto em meio a indefinição sobre o apoio de Bolsonaro à reeleição de Nunes.

O governador Tarcísio de Freitas e o ex-presidente Jair Bolsonaro em evento na região central de São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress

No evento, realizado na região central da capital paulista, houve exaltação da Rota e defesa da Operação Escudo, na Baixada Santista, marcada por relatos de violência policial.

Bolsonaro sofreu afagos da organização do evento, onde foi apresentado como "eterno presidente" e recebeu aplausos e gritos de "mito".

O ex-presidente foi homenageado com a medalha da Rota, que recebeu das mãos de Tarcísio. Bolsonaro não chegou a discursar e apenas desfilou com os veteranos do batalhão.

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Tarcísio, como costuma fazer em eventos públicos, agradeceu ao padrinho político e exaltou feitos da gestão do ex-presidente, da qual participou como ministro. "Agradeço muito a oportunidade de ter aprendido com o senhor", afirmou.

O governador também exaltou a Rota e citou a operação, deflagrada após a morte de um PM do batalhão.

"Nesse pátio sagrado, temos homens corajosos, homens que toparam enfrentar o crime, que se voluntariaram, saíram da folga para combater o crime organizado no Guarujá na Operação Escudo", disse, finalizando ao afirmar que "São Paulo precisa de vocês".

Depois do evento na Rota, Bolsonaro seguiu para o Mercado Municipal, onde ficou por alguns minutos. Já Tarcísio foi almoçar com Nunes na prefeitura.

Em agosto, Nunes, Tarcísio e Bolsonaro almoçaram na sede da prefeitura.

Como mostrou a Folha, entusiastas da reeleição de Nunes apostam na parceria com o governador Tarcísio de Freitas para reverter o desgaste do prefeito com a deterioração do centro e transformar a região em vitrine eleitoral no ano que vem.

Entre auxiliares do emedebista, o apoio do governador na campanha eleitoral é considerado crucial, principalmente diante do impasse em relação à aliança com Bolsonaro.

Nunes e Bolsonaro em evento na Rota - Zanone Fraissat/Folhapress

Nesta semana, a Assembleia Legislativa deve votar o projeto de lei de Tarcísio que inclui anistia às multas aplicadas na pandemia de Covid-19. A proposta enfrenta obstrução da oposição e criou um novo constrangimento entre o governador e seus aliados na Alesp.

O governo bolsonarista quer aprovar uma proposta que facilita a cobrança da dívida ativa, medida que tem a simpatia da maior parte dos parlamentares. A questão é o chamado jabuti do projeto —um artigo que perdoa os débitos das multas da pandemia e que é visto como um benefício para o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Por não usar máscara e provocar aglomerações, Bolsonaro foi multado pela gestão de João Doria (PSDBao menos seis vezes. A dívida já chega a R$ 1,1 milhão, e o governo passou a cobrar o ex-presidente em ações judiciais que estão em andamento.

Seca amazônica estrangula tráfego fluvial e ameaça exportações de milho do Norte, FSP

 Ana Mano

SÃO PAULO | REUTERS

Uma seca severa que assola os principais rios da região amazônica interrompeu o tráfego de navios perto de Manaus e aumentou os custos das rotas comerciais do Norte do país, elevando os riscos para as exportações de milho nos próximos meses.

O calor e a seca atípicos, responsáveis pelas mortes em massa de peixes e botos, já limitaram o acesso das comunidades locais a alimentos e água potável, levando o governo federal a criar um grupo de trabalho para lidar com a emergência. As autoridades alertam agora que o baixo nível dos rios poderá prejudicar as exportações de cereais na região.

"Há preocupação com o escoamento de parte da safra de milho, que deve levar de dois a três meses ainda", disse o Ministério da Agricultura em um comunicado.

Vista aérea do rio Tumbira, em Iranduba, no Amazonas
Vista aérea do rio Tumbira, em Iranduba, no Amazonas - Bruno Kelly - 7.out.2023/Reuters

Os piores efeitos da seca concentraram-se a oeste de Manaus, capital do Amazonas, disse o ministério, acrescentando que o baixo rio Amazonas e o rio Tapajós possuem ainda condições de navegabilidade.

Mas a navegação ao longo dos afluentes superiores do rio Amazonas, muitas vezes complicada na estação seca, tornou-se especialmente difícil.

Os rios da região amazônica têm sido fundamentais para os avanços logísticos pelos quais o Brasil consolidou as rotas de exportação do norte, aumentando a competitividade de grãos.

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No rio Madeira, o governo disse que os corredores de barcaças entre Porto Velho e Itacoatiara, onde operam empresas como Cargill, Bunge e Amaggi, "estão funcionais mas as cargas nas barcaças estão sendo diminuídas um pouco como medida de cuidado."

Os baixos níveis dos rios também afetaram a atracação de navios transoceânicos ao redor de Manaus e aumentaram os custos de pilotagem, disse Thiago Pera, coordenador de pesquisa logística da Esalq-LOG. Ele disse que a abundante safra de soja do Brasil já está resolvida, mas as condições podem ser complicadas para o embarque da segunda safra de milho deste ano.

O presidente-executivo da operadora de barcaças Hidrovias do Brasil, Fabio Schettino, disse que ainda não houve impacto em suas rotas ao longo do Tapajós, onde as barcaças normalmente operam com dois terços da capacidade na estação seca.

Schettino disse que as condições climáticas podem adiar a estação chuvosa, que geralmente começa em novembro, por "semanas ou um mês", acrescentando que vê o clima incomum como parte da variação anual, e não como uma "mudança estrutural".

O meteorologista Gilvan Sampaio, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), disse que a seca deste ano na Amazônia pode ser a pior já registrada. Ele disse que a seca pode durar até 2024 se o El Niño se intensificar no Oceano Pacífico e não houver resfriamento das águas tropicais no Atlântico Norte.

A Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais), cujos membros também contam com portos do sul e sudeste para exportar soja e milho, disse que não mudou sua perspectiva de fortes exportações para este ano. O diretor-geral da Anec, Sergio Mendes, disse em comunicado que o clima ainda pode colocar as colheitas em risco.

O Ministério da Agricultura disse que havia o risco de os custos de transporte subirem no Brasil sem um aumento correspondente nos preços globais, o que poderia pressionar os agricultores e comerciantes locais, acrescentando que "até agora não vemos esse impacto".

Vera Iaconelli -Ninho vazio e outros bichos, FSP

 Já estava previsto no primeiro dia em que a criança dormiu fora de casa, mas pode ter sido no primeiro dia da creche, no desmame ou, talvez, no parto. Para alguns, em nenhum desses momentos: a ficha pode ter caído na entrada no ônibus da primeira excursão escolar. Entender que os filhos vão é ficha que nunca para de cair, mas tem seus momentos cruciais.

A forma como encaramos essa ida não está solta no vácuo, sendo regida por expectativas e fantasias próprias dos discursos de cada época. Nossa geração é aquela que apostou em criar intimidade com os filhos, assim como gerações anteriores apostaram na autoridade e na independência. Cada uma paga o preço por suas escolhas, não cabendo nostalgia.

O dito "ninho vazio" —expressão piegas, mas consagrada em vários idiomas— é mais do que a saudade de ter a casa ocupada pela onipresença desses hóspedes preguiçosos, demandantes e injustos que chamamos de filhos. Afinal, é prerrogativa dos mais jovens se fazerem de tontos enquanto os mais velhos se vangloriam de saber tudo. Bastam uns meses morando sozinhos que os filhos revelam capacidades insuspeitas de cuidar de si mesmos e de seu pequeno reino recém conquistado.

Tremzinho incompleto de brinquedo; ao fundo, uma criança com as pernas cruzadas
Com a partida, resta o paradoxo de ver o desejo realizado de, após décadas, ter o “ninho” só para si, ao mesmo tempo em que lida com um silêncio ensurdecedor - Irina Velichkina/Adobe Stock

Para quem fica resta o paradoxo de ver o desejo realizado de, após décadas, ter o "ninho" só para si, ao mesmo tempo em que lida com um silêncio ensurdecedor. Se fosse apenas falta dos filhos, a dita "síndrome do ninho vazio" não mereceria a atenção que a mídia lhe dá. (E fica aqui meu protesto veemente contra a patologização/medicalização midiática de todos os fenômenos da vida ordinária)

A questão que me interessa hoje, no entanto, diz respeito ao acerto de contas que fazemos com o tempo cada vez que um marco da finitude se coloca. Não há formatura que não nos remeta ao primeiro dia de aula, não há despedida que não nos transporte para os começos. O tempo é essa invenção humana que afeta todos os seres, mas só a nós angustia a ponto de nossa vida se resumir à tentativa de aprendermos a lidar com ele. A morte deixa claro quem ganha a batalha contra o tempo e são poucos entre nós que conseguem seguir os passos do filósofo Pagodinho: "deixa a vida me levar".

Os filhos saem, na melhor das hipóteses, nos desprezando o suficiente para conseguir fazê-lo sem culpa, e voltam como visita (sempre folgada, claro!). A nós resta a elaboração do tempo que passou entre a primeira troca de fralda e o caminhão de mudança. E aí fica a questão: o que fizemos afinal da juventude até aqui, uma vez que essas décadas são aquelas durante as quais nos tornamos irremediavelmente velhos. Insisto na palavra velho porque acho um desserviço fingir que envelhecimento é um termo pejorativo (velho sonha, deseja e trepa o quanto quiser).

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O ninho vazio é cheio de lembranças de como éramos ingênuos, despreparados e arrogantes a ponto de assumir a tarefa de criar outra pessoa. Mas também de como fomos corajosos e esperançosos ao fazê-lo. Se os jovens se veem projetados num futuro abismal —muitas vezes paralisante— a nós cabe prestar contas de um passado recente no qual fizemos nossas escolhas. Trata-se de elaborar justamente o ponto em que eles estão agora e cujos resultados imprevisíveis também terão que prestar contas a si mesmos em algumas décadas.

A pausa necessária para o reconhecimento da passagem da juventude para a velhice não deveria servir de desculpas para a precipitação dos fins. Feito o trabalho de luto, a flecha do desejo deverá ser relançada, assim como será a dos nossos filhos em seu tempo.

Moral da história: o bicho voa.