terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Guilherme Boulos Lula, sim; Alckmin, não, FSP

 

Nesta semana completam-se dez anos do massacre do Pinheirinho. Em 2012, a polícia de São Paulo executou uma operação de guerra para despejar milhares de famílias de um terreno em São José dos Campos. Muita gente ferida, casas incendiadas, uma "barbárie", nas palavras da então presidente Dilma.

Eu estava lá e pude presenciar o desespero de quem perdeu tudo. Diante de um conflito de competências entre as Justiças estadual e federal, que tinha suspendido a ordem, a palavra final para ordenar a ação veio de Geraldo Alckmin, o governador.

Três anos mais tarde, o mesmo Alckmin tomou a decisão de fechar escolas estaduais enquanto seu governo inaugurava presídios e fazia crescer os índices de letalidade policial. Dessa vez, foi derrotado pelos estudantes, que ocuparam centenas de escolas para manter as vagas. A propósito, sua política para educação nas três oportunidades em que governou São Paulo foi fiel à famosa frase de Darcy Ribeiro, de que a crise da educação no Brasil não é uma crise, mas um projeto político.

Fui professor da rede estadual num de seus governos. Faltava giz nas salas, papel higiênico nos banheiros e, acima de tudo, respeito aos educadores. O salário era um dos piores do país, sem plano de carreira e com precarização nas contratações, a chamada "categoria O". Quando nos manifestávamos por melhores condições, a resposta era à base de bombas de gás. Aliás, a mesma régua usada com servidores de todas as áreas.

Foi também em seu governo que a Sabesp, maior empresa de saneamento da América Latina, foi capitalizada na Bolsa de Nova York. E a Cesp, empresa de energia, foi privatizada. Quando Alckmin defendeu, nas eleições de 2018, "privatizar tudo", falava com conhecimento de causa. Foi nesse mesmo período que ele declarou, após ataque a tiros contra a caravana de Lula, que Lula e o PT "colhiam o que plantavam".

Política deve ser feita com grandeza e capacidade de diálogo, mas jamais com esquecimento. Os sem-teto do Pinheirinho, os professores e, as mães que perderam filhos pela letalidade policial guardam vivas na memória as cicatrizes do governo Alckmin, pelas quais não houve reparação, nem mudança de rota.

Neste ano, temos o desafio de derrotar Bolsonaro, e não tenho dúvidas de que Lula é quem tem melhor condição de enfrentá-lo. Mas precisamos derrotar também a agenda política antipopular e de retirada de direitos, da qual Alckmin é sócio.

Meu foco agora será na batalha eleitoral, para ajudar o Brasil a vencer o pesadelo e voltar a sonhar. Por isso, como serei candidato, esta é minha última coluna aqui. Agradeço a todos os que me acompanharam.

Alvaro Costa e Silva - Bolsonaro nos debates, FSP

 Como na fábula do menino pastor e o lobo, o dia chegou. Pressionado pela surra que está levando nas pesquisas, Bolsonaro disse que pretende comparecer a todos os debates da campanha presidencial. Nem a seita acreditou.

Ainda mais agora que ele arranjou uma desculpa perfeita para se ausentar: comer camarões sem mastigar, engolindo-os com cabeça e tudo, baixar no hospital e, deitado na cama, tirar aquela foto já clássica, exibindo a sonda nasogástrica. Cada internação por dores na barriga ressuscita o atentado sofrido em 2018. Os bolsonaristas acreditam que o episódio, já virado pelo avesso do avesso pela Polícia Federal, ainda pode ter influência no eleitor de 2022. O chato da narrativa é a realidade: o candidato sobreviveu à facada e foi eleito, sendo obrigado a ocupar o cargo e a fingir que governa há mais de três anos.

As facadas que Bolsonaro desfechou no país —destruição institucional, sanitária, ambiental, econômica, educacional, cultural, moral, ética, estética— estão refletidas nele, são indissociáveis da sua imagem de hoje. Tirou a máscara o político que se vendia como outsider, revelando-se o pior presidente da história. Aquele que, com apoio de generais superalimentados, inventou um orçamento secreto para comprar o centrão.

Se participasse dos debates, o capitão não poderia impor regras. Tampouco mandar o oponente calar a boca, como faz com jornalistas. O que diria sobre os filhos, todos envolvidos em tenebrosas transações? E sobre a primeira-dama, cuja conta bancária recebe pagamentos jamais esclarecidos? Revelaria ele, diante das câmeras, os gastos do seu cartão corporativo?

A oposição nem precisaria se esforçar diante do adversário nas cordas. Bastaria apontar e dizer: o senhor é o presidente, portanto, o responsável. Longe do cercadinho, seria suficiente uma só questão —"Cite alguma coisa que deu certo no seu governo"— para o mito beijar a lona.

A campanha do ódio em ação, Cristina Serra, FSP

Reportagem de Jamil Chade e Lucas Valença, no UOL, mostra tratativas do "gabinete do ódio" para adquirir tecnologias de espionagem israelense. Uma das empresas procuradas, que atende pelo sugestivo nome de DarkMatter (em português significa "matéria escura"), desenvolveu dispositivos que podem invadir computadores e celulares, mesmo com os aparelhos desligados.

Essas movimentações prenunciam que os mecanismos de disparo em massa de mentiras por aplicativo, largamente utilizados em 2018, serão brincadeira de criança perto do que estará, agora, ao alcance das quadrilhas que apoiam o chefe miliciano. Indicam também como a campanha de reeleição de Bolsonaro poderá atuar totalmente fora do radar do TSE, deixando os concorrentes a comer poeira e as instituições a enxugar gelo.

Talvez seja a confiança de Bolsonaro em esquemas criminosos que explique seu comportamento, em alguns aspectos, pouco compatível com o de quem busca a recondução ao cargo. Ele nunca demonstra compaixão pelas vítimas de tragédias. Ao contrário, exibe frieza e desdém, como fez durante as enchentes na Bahia e em Minas Gerais e como tem feito ao longo da pandemia, chegando ao cúmulo de negar vacinas para crianças.

Bolsonaro já deu o tom da violência que vai estimular nos próximos meses. Em recente pronunciamento, ameaçou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra com o excludente de ilicitude, uma licença para matar, a ser dada para policiais que ajam "sob violenta emoção". A proposta foi derrotada no Congresso, mas ainda é defendida pela bancada da bala.

É tudo na mesma linha do "vamos fuzilar a petralhada toda aqui do Acre" e "petralhada, vai tudo vocês (sic) para a ponta da praia [gíria para lugar de execução de presos políticos na ditadura]".

O golpista emite sinais eloquentes de que não aceitará a derrota e de que tudo fará para tumultuar as eleições. Nossas instituições estão preparadas para detê-lo?