Ricardo Lacaz Martins
Voltamos ao debate sobre a isenção dos dividendos das empresas do Simples e a necessária adequação da nova tributação para as sociedades optantes pelo lucro presumido.
Muito se tem dito e afirmado, com base em teorias econômicas, que a tributação simplificada dos modelos acima desequilibra a competitividade entre as pequenas e médias empresas (supostamente beneficiadas por uma tributação reduzida) e as grandes corporações, que teriam uma carga tributária mais elevada. Tal fato encobriria uma ineficiência alocativa do capital, pois o benefício fiscal concedido manteria abertas empresas ineficientes, devendo tais negócios serem fechados se não puderem concorrer com seus pares maiores.
Constituiriam, ainda, um desincentivo ao crescimento, já que, chegando ao limite do faturamento, deixariam de crescer. E, por fim, esses regimes gerariam uma iniquidade, pois tributariam de forma desigual rendimentos equivalentes.
Sem adentrar no debate das teorias econômicas que sustentam essa ou aquela opinião, vamos aos fatos do mundo real —ou melhor, da realidade tributária brasileira.
Iniciamos pela carga tributária desses dois grupos. A alíquota efetiva do lucro presumido, ou seja, o quanto representa o recolhimento do imposto de renda sobre o faturamento das empresas tributadas por essa sistemática, é de 2,49%, enquanto nas empresas tributadas pelo lucro real esse percentual cai para 0,99%.
Conclusão: as empresas tributadas pelo lucro presumido recolhem proporcionalmente, em relação ao faturamento gerado, mais imposto de renda do que as grandes empresas. A explicação desse fenômeno deve-se ao fato de as empresas tributadas pelo Simples e pelo lucro presumido pagarem imposto mesmo com prejuízo (o que não ocorre com as grandes empresas), não possuírem qualquer incentivo fiscal (tais como Reidi, Reiq, Suframa) e não terem qualquer planejamento tributário, já que o cálculo dos tributos se dá com base no faturamento declarado.
Hoje são 4.221 milhões de empresas optantes pelo Simples e 883 mil pelo LP, representando 97% de todas as pessoas jurídicas nacionais. Dessas, só 68 mil possuem faturamento superior a R$ 10 milhões (1,3%). Alegar que parte das 68 mil empresas de maior faturamento teria um desincentivo ao crescimento e, por tal razão, condenar a sistemática de tributação simplificada é reduzir a análise, ignorando dados do mundo real e tratando exceção como regra.
Seria melhor olharmos as razões pelas quais 98,7% dessas empresas optaram por um sistema em que não há complexidade, com reduzidos custos de conformidade —demonstrando que, mesmo pagando eventualmente um pouco mais de impostos, preferem a simplificação e a segurança de um recolhimento definitivo, sem futura contestação pelas autoridades fiscais.
Por fim, a crítica, infelizmente corrente, de que essas empresas pagam menos impostos do que um trabalhador assalariado, já que ambos teriam “rendimentos equivalentes”, ignora que essas são de fato organizações empresariais, com funcionários, custos, investimentos e gestão profissional, enquanto as pessoas físicas são remuneradas pela sua força de trabalho, sem os citados encargos e os riscos correspondentes. Não há, assim, qualquer equivalência entre seus rendimentos. São receitas de origens diversas e, como tal, devem ser tratadas de formas distintas.
A elevação injustificada da carga tributária de 97% das empresas brasileiras levará à desorganização empresarial, ao desincentivo ao empreendedorismo e, no extremo, não ao fechamento de negócios supostamente ineficientes, mas à possível volta à informalidade, o que todos nós não desejamos.