quinta-feira, 22 de julho de 2021

Para pressionar Alckmin, vice de Doria veste figurino de candidato para 2022 e viaja pelo interior de SP, FSP

 Carolina Linhares

SÃO PAULO

Filiado ao PSDB e com a candidatura ao Governo de São Paulo assumida, o vice-governador Rodrigo Garcia, 47, vestiu o figurino de candidato nas últimas semanas e partiu para viagens ao interior, inaugurações e entrevistas coletivas.

Adotou ainda uma nova estratégia de redes sociais –sempre incentivado pelo governador João Doria (PSDB), que também está em franca campanha para a Presidência da República.

O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), inaugura creche em Timburi (SP)
O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), inaugura creche em Timburi (SP) - Divulgação - 16.jul.21/Governo do Estado de SP

Como postulante ao Palácio dos Bandeirantes, Garcia, que se elegeu deputado estadual pela primeira vez com 24 anos, tem obstáculos pela frente —os índices baixos de intenção de voto captados em pesquisas até agora e a concorrência com Geraldo Alckmin (PSDB), que aparece bem mais acima nas sondagens eleitorais.

O ex-governador quer disputar mais um mandato e, para isso, deve deixar o PSDB, o que facilita o caminho de Garcia, mas deixa mágoas entre os tucanos paulistas.

Garcia e Doria têm adotado a estratégia de percorrer o estado separadamente, em uma espécie de campanha dupla pelo interior. O governador, no entanto, interrompeu a agenda após receber um resultado positivo em teste para Covid na semana passada.

Com anúncios e inaugurações, pretendem desfazer a imagem negativa que atribuem à gestão da pandemia, que exigiu medidas impopulares.

Ao mesmo tempo, concorrentes de Garcia na corrida estadual também se movimentam, como mostrou a FolhaNa esquerda, Guilherme Boulos (PSOL) iniciou um giro pelo estado, e Fernando Haddad (PT) elabora um plano de governo.

Na direita, Arthur do Val (Patriota) avalia filiação ao PSL, o que daria ao youtuber mais tempo no horário eleitoral de rádio e TV.

A entrada de cabeça de Garcia na campanha representa uma mudança de estratégia para quem deixou o DEM e se filiou ao PSDB, em meados de maio, com o discurso de que só avaliaria uma candidatura no ano que vem. A saída do DEM provocou o rompimento entre o presidente da sigla, ACM Neto, e Doria.

A anterior hesitação de Garcia em assumir-se candidato evidenciava uma incoerência de Doria –que defendia prévias tucanas o quanto antes no nível nacional e jogava para frente a questão estadual, na tentativa de evitar o embate com Alckmin.

Na última segunda-feira (19), porém, a executiva estadual do PSDB, comandada pelo aliado e secretário de Doria, Marco Vinholi, formalizou em reunião a decisão de fazer prévias —nas mesmas datas e com as mesmas regras das prévias nacionais.

Apesar de ter pregado a eleição direta nacionalmente, Vinholi acabou decidindo que as prévias paulistas seguirão as mesmas regras de grupos, em que filiados representam 25% da votação e políticos, 75%. Para aliados de Alckmin, trata-se de outra incoerência com a finalidade de beneficiar Garcia.

Na reunião da executiva estadual, tucanos próximos ao ex-governador tentaram pleitear regras que consideram mais justas, como a eleição direta de filiados e a data separada da prévia nacional, mas foram derrotados.

Foi a pá de cal nas chances de Alckmin aceitar prévias. Da forma em que foram desenhadas, o ex-governador considera a disputa desigual e contaminada pela máquina partidária e de governo. Agora, só restaria a ele deixar o PSDB.

Tucanos avaliam, nos bastidores, que ao declarar sua candidatura, Garcia teve uma estratégia mais acertada e jogou pressão sobre Alckmin.

Ao deixar o PSDB, provavelmente rumo ao DEM ou PSD, Alckmin deve buscar uma aliança com Márcio França (PSB), que já foi seu vice-governador, também é pré-candidato ao Palácio dos Bandeirantes e é adversário político de Doria.

As viagens de Garcia pelo estado, intensificadas nos últimos dois meses, dão a dimensão do poder da máquina estatal a seu favor. Desde 1º de maio, o vice esteve em 44 cidades fazendo entregas.

Os compromissos incluem distribuição de vouchers de cesta básica, autorização para construção de moradias e reforma de estradas, além de inaugurações de creches, escolas, veículos escolares, delegacias e centros de idosos –seguindo a estratégia de explorar ao máximo programas e medidas já anunciadas em eventos do governo.

Além disso, em maio e junho, Garcia abriu espaço na agenda em dois dias para conceder, de São Paulo, entrevistas a rádios de 11 cidades do interior. ​

Para membros do governo paulista, não se trata apenas de agenda eleitoral, mas de executar inaugurações que estavam represadas na pandemia.

“O governo tem mais de R$ 21 bilhões em investimentos em 2021. Doria e Garcia estão acompanhando de perto essas ações”, afirma Vinholi sobre as viagens ao interior.

As agendas, por sua vez, servem para alimentar as redes sociais do vice. Garcia testa, desde o fim de maio, uma nova equipe para gerenciar suas páginas.

Desde então, ele passou a veicular dois tipos de vídeos de cerca de um minuto: um chamado Sextou, com o resumo da semana, e outro com nome Direto ao Ponto, em que aparece em frente ao computador em seu gabinete e comenta, com o forte sotaque do interior, programas de governo, como a vacinação, a privatização de aeroportos e a ampliação de creches.

Entre as publicações nas redes, algumas são de cunho pessoal, como fotos com a mulher no Dia dos Namorados e o retrato de um abraço nos pais. O vice também aposta na divulgação, em vídeo, de trechos de seus discursos.

De toda forma, a presença de Garcia na internet é tímida. O vice tem cerca de 7.000 seguidores no Twitter e 43 mil no Facebook, contra 1,4 milhão e 2,4 milhões de Doria, respectivamente.

Como mostrou a Folha, Garcia já ocupava posição central na administração Doria ao acumular os cargos de vice e de secretário de Governo, responsável pela articulação política e por planejar e acompanhar programas, obras e privatizações.

Diante do desgaste da imagem de Doria com entrevistas coletivas sobre a pandemia, o vice foi escalado também para cumprir esse papel e dividir eventuais repercussões negativas. Em abril, por exemplo, coube a ele anunciar a saída da fase emergencial e a entrada na fase de transição, também restritiva.


Semipresidencialismo não é para desviar foco político, diz deputado autor de PEC, FSP

 O semipresidencialismo, ideia encampada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não é para ser contra ou a favor de Jair Bolsonaro ou Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e sim um sistema para melhorar a governabilidade do país, defende o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), autor da PEC (proposta de emenda à Constituição) sobre o tema.

"Não se pretende desviar o foco de nada e nem ela é feita contra ou a favor a alguém”, afirmou Moreira, 58, em entrevista à Folha.

A proposta é criticada pelo PT, que lidera as pesquisas de intenção de voto para 2022, e por partidos de oposição a Bolsonaro, que veem nela uma tentativa de Lira de se esquivar da análise dos pedidos de impeachment.

Moreira diz que a mudança deixaria mais clara a coalizão formada para dar sustentação a governos. “O semipresidencialismo é uma evolução do presidencialismo. Não é um novo regime, é um novo modelo de governança."

O deputado federal Samuel Moreira (PSDB-SP), autor da PEC do semipresidencialismo
O deputado federal Samuel Moreira (PSDB-SP), autor da PEC do semipresidencialismo - Pablo Valadares - 11.nov.2019/Câmara dos Deputados

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Como surgiu a proposta? Surgiu de conversar com alguns amigos da política. É uma proposta que em alguns momentos já foi ventilada.

De quem partiu a ideia de fazer essa proposta começar a avançar na Câmara agora? Em agosto do ano passado, protocolei essa proposta. Eu procurei recentemente o Arthur Lira. O país sempre debatendo suas crises, falando de impeachment, sempre com problemas de governabilidade. O parlamentarismo é uma proposta mais difícil. Esse presidencialismo de coalizão também é muito difícil.

O semipresidencialismo é uma evolução do presidencialismo. Não é um novo regime, é um novo modelo de governança. Há ganhos de transparência, há ganhos para solução de crises, e o país ganha mais estabilidade política que se reflete também no crescimento da economia. Você vai ter que montar uma maioria para poder governar, mas quem indica o primeiro-ministro é o presidente.

O presidente da República é eleito pelo povo, podendo ser reeleito apenas uma vez, de maneira consecutiva ou não. Ao aprovar o primeiro-ministro, ele, em dez dias, apresenta um programa de governo para ser também aprovado no Congresso.

O primeiro-ministro necessariamente precisaria sair do Congresso? A proposta diz que é preferencialmente alguém do Congresso, não exclusivamente. Pode ser um parente do presidente que exerce atividade política. Isso não é considerado nepotismo para cargo político. Não pode é nomear um parente que não é da política.

Estamos a quase um ano da eleição e o governo está acuado diante da queda de popularidade. É o momento correto de se discutir uma mudança dessas? Acho que temos que abrir o debate na sociedade. É importante também ouvir a opinião do próprio governo. Não se pretende desviar o foco de nada e nem ela é feita contra ou a favor de alguém.

A questão do presidente da República continua a mesma regra, eleito. O cargo mais importante continua sendo o de presidente. Não acho que alguém desistiria de concorrer à Presidência da República por causa de um sistema que melhora a governabilidade e dá muito respaldo e prestígio ao presidente. Ela [a proposta] não é para resolver uma crise. Ela é para resolver o problema de governança do país.

Já houve tentativas anteriores de mudar o sistema, mas falharam. A crise pode dar impulso a essa discussão? Acho que sim. Os momentos de crise revelam claramente as deficiências do sistema. Vejam o impeachment, como é traumático para o país, que sofre com a paralisação do governo. Gera uma insegurança inclusive na própria economia do país.

O que mudaria em relação a isso no semipresidencialismoSe tiver uma crise direcionada ao primeiro-ministro, há condições de trocá-lo rapidamente. Ou seja, o governo não sofre essa paralisação tão longa como no sistema de hoje. A Lei do Impeachment continua valendo para o presidente da República.

Ela vai valer também para o primeiro-ministro? O primeiro-ministro pode ser sacado por um voto de censura.

Não precisaria de um ano de impeachment para trocar… Não precisaria. O impeachment do presidente poderia até durar um ano. Mas o governo continuaria andando com o primeiro-ministro.

O semipresidencialismo pode ser visto como uma forma de tirar poderes do presidente? O presidente sempre tem mais poder que o Parlamento. Quem indica o primeiro-ministro é o presidente. Não há hipótese de ter um primeiro-ministro sem um presidente. Mas não há hipótese também de ter um primeiro-ministro que o presidente queira, mas que não consiga construir uma maioria.

O que mudaria nessa busca por maioria no Congresso em relação ao modelo atual? É às claras, uma coalizão formada. Hoje, por exemplo, qual é a maioria do Bolsonaro? PSDB é da maioria? É no varejo? Ninguém sabe quem são, quanto custa, a que tipo de indicação. Quem é que tem cargo no governo?

No semipresidencialismo, vai ter que ter um bloco, vai ter que ter um programa aprovado, vai ter que ter responsabilidade com o plano de governo, vai ter que aprovar esse primeiro-ministro. Com uma coalizão mais transparente, não precisa fazer negociações de conchavo. Quando os partidos realmente assumem uma posição de governo, e os deputados também, é legítima a participação no governo. Acho que fica mais claro para quem é governo participar do governo.

O sr. defende um plebiscito sobre a proposta? Constitucionalmente, não há necessidade de um plebiscito porque não mexe com o presidencialismo. O presidente continua sendo eleito. Não está mudando para o sistema parlamentarista. O semipresidencialismo é parecido com o sistema da França e de Portugal. Você separa as funções de Estado e as funções de governo. Mesmo assim o presidente tem poder de veto a projetos, por exemplo.

O Congresso continuaria bicameral? Isso. São parlamentares ligados a partidos, a identidades ideológicas e programáticas. O Congresso também continua com as prerrogativas de aprovar embaixador, ministro do Supremo.

eleição de 2022 poderia ainda ocorrer mesmo se a PEC estiver em discussão e em estágio avançado no Congresso? Normalmente. Pode até ser uma ideia para que cada presidente diga o que pensa sobre ela. Essa discussão de data de início do novo sistema ainda pode ser feita [Lira defende que comece a valer em 2026]. Essa PEC não é pessoal, ela é impessoal. Ela é um sistema de governo.

Se a PEC for promulgada antes do fim de um mandato presidencial, como funcionaria? Haveria uma transição? Ela valeria a partir da promulgação. Ela permite que o presidente da República, caso queira, indique um ministro-coordenador que vai até o final do mandato dele e pode exercer as atribuições que estão previstas para o primeiro-ministro. Teria uma função hoje parecida com o ministro da Casa Civil. A partir do próximo mandato, aí sim, o presidente eleito indica o primeiro-ministro, a ser aprovado pelo Congresso.

O sr. teve algum termômetro de como o presidente Bolsonaro recebeu essa ideia? Não.

E do Senado? Também não. A proposta é muito recente.

O senhor defende como uma forma de estancar crises institucionais. Mas em países como Israel ou Itália houve uma dificuldade de formar governos. Isso também não imobiliza o governo? Na verdade, a PEC tem algumas medidas para impedir isso. No primeiro ano, você não pode dar nenhum voto de censura [do presidente] e nem de desconfiança [do Congresso]. Ou seja, o primeiro-ministro vai atuar por um ano. E nem nos últimos seis meses. Então você tem aí dois anos e meio de exercício do barulho, onde ele fica mais instável. Mas, depois da terceira vez que o Congresso trocar [o primeiro-ministro], o presidente pode dissolver a Câmara. E aí, [ocorrem] novas eleições para a Câmara.

Não dissolve o Senado também? O Senado, não. Ele [o presidente] dissolve a Câmara. A ingovernabilidade, nesse caso, estaria mais atribuída à Câmara, onde está a ampla maioria dos congressistas.

Mas é um dispositivo em que a Câmara abriria mão de ser estável por quatro anos. É o risco de conviver com a ingovernabilidade.

Quais funções seriam mantidas pelo presidente no semipresidencialismo? As funções do presidente são de Estado, mas ele não pode se ausentar da responsabilidade do que o primeiro-ministro está fazendo. O que ele não paga mais é o preço pelos erros que o primeiro-ministro pode estar cometendo e sua equipe. Poderão ser trocados sem precisar tirar o presidente. No fundo, isso também preserva o presidencialismo. É uma engrenagem.

O país tem mais de 30 partidos. O sr. acha que vai ser necessária alguma reformulação nesse número? A PEC não mexe nos critérios de eleições e representações partidárias. Lógico que o presidente terá que construir essa maioria, ele vai construir essa maioria com mais partidos.

SAMUEL MOREIRA, 58

Engenheiro, foi prefeito de Registro (SP) e presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo. Está no segundo mandato de deputado federal pelo PSDB. Em 2016, se licenciou do cargo para assumir a Casa Civil do Governo de São Paulo. Foi relator da reforma da Previdência na Câmara