quinta-feira, 6 de maio de 2021

Bolsonaro ataca a China e retoma a normalidade de sua política externa, por Cassio Faeddo, OESP

 A tranquilidade gerada pela saída de Ernesto Araújo do Ministério da Relações Exteriores parece ter sido apenas um sonho de uma noite do outono brasileiro.

Acossado por uma Comissão Parlamentar de Inquérito – que provavelmente apenas materializará provas para um futuro incerto, Bolsonaro voltou a tumultuar a política externa.

Muito possivelmente, Jair Bolsonaro não sofrerá impeachment ao final da CPI. Ocorre que nem Aras, o Procurador Geral da República, nem Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, devem tocar qualquer relatório de CPI para frente.

Se há algum risco, este se situa em momento posterior, seja no cenário interno ou mesmo externo. Mas ninguém pode afiançar absolutamente nada quanto ao futuro consequente ao que a CPI materializará.

Lamentavelmente, Jair Bolsonaro ataca novamente, e não se segura quando o tema é criar tumulto diplomático. Desta feita, Bolsonaro acusou a China de ter criado o Coronavírus em laboratório para dominar o mundo. Mais ou menos isso. Como se a China já não ditasse as regras do jogo há muito tempo.

O ambiente que estava um pouco ameno na gestão do novo Ministro das Relações Exteriores, Carlos França, pode mudar.

Lembremos que há pouco França amenizou o impacto das palavras do poderoso Ministro Paulo Guedes, que temerariamente acusou a China de propagar o vírus para vender vacinas. E, mais, que a melhor vacina seria norte-americana, a Pfizer.

Ora, a vacina da Pfizer é da alemã BioNTech, fundada pelo casal de médicos Ugur Sahin e Özlem Türeci; ele, médico nascido na Turquia, ela, filha de descendentes turcos.

Em um primeiro momento, com as desculpas de Guedes, tudo parecia entrar para o folclore de mais uma fala aloprada deste governo. Porém, o presidente teorizou novamente conspirações chinesas. O grande problema é que não sabemos até quando vai a paciência da China com os devaneios e agressões vindas do máximo mandatário do país.

O presidente, além de tudo, mostra-se mais preocupado em lançar uma irresponsável declaração como cortina de fumaça, do que calar-se quando se trata de China, o fornecedor de matéria prima para mais de 80% das vacinas aplicadas no Brasil.

A fala de Bolsonaro, na verdade, municia a oposição que lida com ações e omissões do governo federal. Atacar a China, maior parceira comercial e de vacinas neste momento, pode ter efeito contrário ao desejado pelo presidente, reiterando a figura de sabotador de vacinas e de controle da pandemia.

Em alguma medida, Bolsonaro atendeu a demanda de Ernesto Araújo, que há pouco lamentava ter o governo federal perdido a alma. Sabe-se lá a qual alma Araújo se referia. Talvez a alma do Dr.Evil, interpretado pelo ator Mike Myers, no filme Austin Powers, man of mistery (1997).

*Cássio Faeddo, advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP


COMO CHEGAR BEM AOS 100 Alzheimer não é o fim, FSP

 “Muito provavelmente dona Nilva está manifestando a doença de Alzheimer” foi o que nos disse o médico em uma consulta de 15 minutos. Não creio que ele mensurava o impacto da frase em nossas vidas –eu certamente não fazia ideia. Mais parecia um recorte de sua rotina.

Já em casa pedi socorro ao Google e fui massacrado com termos técnicos, matérias pessimistas e a aparentemente inevitável realidade: nada a ser feito. Ainda não há cura para a doença, que acabará por interferir em nossa independência e autonomia, afetando todas as nossas relações –até com nós mesmos.

Os desafios de um diagnóstico de Alzheimer não se restringem à pessoa, afetando também familiares que cuidam e vivenciam o impacto em sua saúde física, emocional, social, financeira e psicológica. Os obstáculos são incontáveis e começam pelo mais sofrível: aceitar não poder curar ou reverter os danos a alguém que tanto se ama.

Os textos que li, quinze anos atrás, me transformavam em mero coadjuvante já que não havia dinheiro ou esforço possível capaz de curar vovó Nilva. O Alzheimer nos acompanharia até o último dia de sua vida. Depois de muito ler sobre reserva cognitiva e sua relação com a doença, comecei a perceber outra relação ainda mais importante, uma que explicava a razão de eu estar ali apesar das interrogações, da raiva e do medo.

homem careca de meia-idade sentado em um sofá ao lado de um homem idoso; o homem mais jovem coloca a mão na cabeça do homem idoso, fazendo carinho
Cena do filme "Alzheimer na Periferia", que conta a história de cinco famílias que cuidam de portadores da doença - Reprodução

Vovó Nilva fora uma grande amiga durante toda a nossa vida juntos, e ao longo do caminho acabamos por construir uma bem recheada reserva de afeto. No entanto, demorou um tempo até que eu entendesse que meu papel ali não era o de observar seu declínio, mas de continuar a ser seu melhor amigo, neto, e, às vezes, um pouco pai também. Tínhamos ambos protagonismo!

Ao longo do processo de aceitar a doença, acabei vivendo 50 tons de frustração. É difícil entender e se adaptar ao abstrato quando esse está em constante mudança. A doença de Alzheimer se caracteriza por ser degenerativa e progressiva, implicando em novos desafios e aprendizados a cada instante.

Logo me dei conta que precisava entender e aceitar muito além de um diagnóstico. Era preciso aceitar minhas emoções, inclusive a raiva e a frustração, e entender que tudo isso era consequência do amor imensurável que tínhamos um pelo outro. Vi, como já pensava, que não seria fácil viver o Alzheimer, mas que o amor me levaria a cometer erros benevolentes...

Quantas vezes a fiz reviver a morte dos pais com a mesma intensidade da primeira. Afinal tinha como regra inviolável a verdade como protetora da dignidade do outro.

Entendi, por fim, que a reserva afetiva era o que me mantinha ali. Não precisava ser o cuidador perfeito, pressionar-me a ter todas as respostas ou agir com a emoção esperada por outros. Pelo contrário, passei até mesmo a admirar meus erros, vendo neles parte do que nutrimos ao longo de 20 anos. Ah, e o Alzheimer te permite errar, pois em 10 minutos você vai ter outra chance. Aí é preciso lembrar do próprio erro e ressignificar a experiência, pois eles esquecerão, mas você não tem desculpa.

Quem cuida está em um constante processo de aprendizado até o último suspiro em vida –quando por sinal aprenderemos lições impensáveis sobre a vida e a morte. Mas o mais importante a dizer aqui é: o Alzheimer não é o fim, a morte não é uma derrota e você será capaz de viver tudo isso.

SEÇÃO DISCUTE QUESTÕES DA LONGEVIDADE

A seção Como Chegar Bem aos 100 é dedicada à longevidade e integra os projetos ligados ao centenário da Folha, celebrado neste ano de 2021. A curadoria da série é do médico gerontólogo Alexandre Kalache, ex-diretor do Programa Global de Envelhecimento e Saúde da OMS (Organização Mundial da Saúde).


Justiça rejeita 'quadrilhão do MDB' e absolve Temer, Cunha, Geddel e Yunes, FSP

 A Justiça Federal da 1ª Região absolveu o ex-presidente Michel Temer, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, o ex-ministro Geddel Vieira Lima, o empresário José Yunes e outros oito nomes acusados de integrarem o "quadrilhão do MDB".

denúncia, feita pelo Ministério Público Federal (MPF), os acusava de integrar uma organização criminosa que arrecadava propina por meio de órgãos públicos como Petrobras e Caixa Econômica Federal, além da Câmara dos Deputados e ministérios do governo federal.

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O ex-presidente Michel Temer durante entrevista para a Folha, em São Paulo - Eduardo Knapp - 11.abr.2019/Folhapress

Em sua decisão, o juiz Marcus Vinicius Reis Bastos afirma que a narrativa apresentada pelo MPF não permite concluir a existência de uma associação com divisão de tarefas, hierarquia e estabilidade —como seria próprio de uma organização criminosa.

"A denúncia apresentada, em verdade, traduz tentativa de criminalizar a atividade política. Adota determinada suposição —a da existência de 'organização criminosa' que perdurou entre 'meados de 2006 até os dias atuais'— apresentando-a como sendo a 'verdade dos fatos', sequer se dando ao trabalho de apontar os elementos essenciais à caracterização do crime de organização criminosa", afirma Reis Bastos.

"A imputação a dirigentes de partidos políticos do delito de organização criminosa sem os elementos do tipo objetivo e subjetivo, provoca efeitos nocivos à democracia, entre os quais pode se mencionar a grave crise de credibilidade e de legitimação do poder político como um todo", segue o magistrado.

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Também foram absolvidos os ex-deputados Henrique Eduardo Lyra Alves e Rodrigo Rocha Loures, os ex-ministros Eliseu Padilha e Wellington Moreira Franco, o coronel João Baptista Lima Filho, o ex-doleiro Lúcio Funaro e os supostos operadores de propinas para Eduardo Cunha Altair Alves Pinto e Sidney Norberto Szabo.

A absolvição do "quadrilhão do MDB" foi comemorada pela defesa de Cunha, que classificou a denúncia do MPF como "absurda tentativa" de caracterizar um partido político como organização criminosa. "Uma fracassada tentativa de criminalização da atividade política que merece total repúdio", seguem os advogados Aury Lopes Jr. e Delio Lins e Silva Jr. por meio de nota.

O advogado Fabio Tofic Simantob, que representa Moreira Franco, endossa o argumento de que houve tentativa de criminalização e diz que o MDB é "um dos mais importantes partidos do país". "A decisão coloca as coisas em seus devidos lugares. A Justiça Federal reconheceu a falta de provas em relação ao ex-ministro Moreira Franco", afirma.

Em março deste ano, o juiz Marcus Vinicius Reis Bastos, da 12ª Vara do Distrito Federal, também absolveu Temer "sumariamente" no processo em que era acusado de receber vantagens em troca de beneficiar empresas no Porto de Santos.

Na ocasião, o dono da empresa Rodrimar, Antonio Celso Greco, o ex-executivo da empresa, Ricardo Conrado Mesquita, e outros três acusados também foram absolvidos.