sexta-feira, 5 de março de 2021

'Se fizermos muita besteira, dólar vai a R$ 5', disse Guedes há um ano; moeda fechou hoje a R$ 5,68, FSP

 Júlia Moura

SÃO PAULO

Há exatamente um ano, cerca de uma semana após a confirmação do novo coronavírus no Brasil, o ministro Paulo Guedes (Economia) dizia que a cotação do dólar poderia ir a R$ 5 caso fosse feita "muita besteira".

Naquele dia, a moeda americana subiu 1,6%, a R$ 4,653, após o Banco Central fazer três leilões de contratos de swap cambial —venda de dólares no mercado futuro— para conter a desvalorização do real.

"Pode chegar a R$ 5? Ué, se o presidente pedir para sair, se todo mundo pedir para sair. É um câmbio que flutua, se fizer muita besteira, ele pode ir para esse nível", afirmou Guedes em 5 de março de 2020.

A desvalorização, porém, continuou –sete pregões depois, a moeda americana fechou acima de R$ 5 pela primeira vez, devido ao avanço do coronavírus pelo mundo.

Nesta sexta-feira (5), o dólar terminou o pregão com alta de 0,38% cotado a R$ 5,6820, um salto de 22% em relação à mesma data do ano passado.

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De lá para cá, a moeda se aproximou dos R$ 6, indo até R$ 5,90, seu recorde nominal (sem contar a inflação). Segundo analistas, as principais razões para a alta no câmbio são o risco fiscal e os juros baixos.

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes (Economia) em Brasília, em agosto de 2020
O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes (Economia) em Brasília, em agosto de 2020
EVARISTO SA / AFP
Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes (Economia) em Brasília, em agosto de 2020

“Não é um movimento exclusivo do real, é dos emergentes, mas a nossa moeda está mais desvalorizada que os pares pela questão fiscal”, diz João Leal, economista da Rio Bravo Investimentos.

Investidores temem o aumento de gastos de governo durante a pandemia, sem contrapartidas, o que eleva a relação dívida-PIB (Produto Interno Bruto). Diante do endividamento do governo e queda na atividade econômica, o risco-país medido pelo CDS de cinco anos subiu 53% desde março passado, e está em 197 pontos

O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias dos países, especialmente emergentes. Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país; se ele cai, o recado é o inverso.

A alta nos novos casos de Covid-19 no Brasil, que levaram diversos estados, como São Paulo e Minas Gerais, a ampliarem as medidas restritivas, também impacta o real. Outro fator negativo para a divisa são as recentes interferências do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em estatais.

Desde a crítica de Bolsonaro ao atual presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, em uma live na noite do dia 18 de fevereiro, o dólar sobe 4,4%. Em relação aos principais pares gobais, o dólar americano se valorizou apenas 1,5% no período, segundo dados da Bloomberg.

A queda da Selic, hoje na mínima histórica da 2% ao ano, também tem grande impacto na desvalorização da divisa brasileira por meio do carry trade, prática de investimento em que o ganho está na diferença do câmbio e do juros.

Nela, o investidor toma dinheiro a uma taxa de juros menor em um país, no caso, os EUA, para aplicá-lo em outro, com outra moeda, onde o juro é maior, o Brasil. Com a Selic no atual patamar, essa operação deixa de ser vantajosa e estrangeiros retiram seus recursos, em dólar, do país, o que eleva a cotação.

“Com a queda da Selic, o fluxo de retirada [de dinheiro do país] é enorme e faz o dólar subir”, diz Rodrigo Friedrich, diretor de renda variável da Renova Invest.

Em 2021, o real é a terceira moeda que mais se desvaloriza no mundo, atrás apenas do peso cubano e do dinar líbio. As intervenções do BC continuam para conter a queda. Nos últimos pregões, o BC tem feito leilões de swap tradicional. Nesta sexta, foram 16 mil contratos.

“O BC está preocupado com a alta do dólar. Se deixasse flutuar, o dólar estava acima de R$ 6”, afirma Friedrich.

Nos últimos pregões, outro fator impacta o real: a força internacional do dólar, com a alta nos juros dos títulos do Tesouro americano (Treasuries), o que impulsiona um fluxo de investimentos para os Estados Unidos em detrimento de países emergentes.

Nesta sexta, o dólar se fortaleceu com dados da criação emprego nos EUA em fevereiro, que superaram as expectativas do mercado, indicando força na recuperação da economia americana e aumentando o apelo para investimentos no país.

Os EUA criaram no mês passado, em termos líquidos, 379 mil empregos fora do setor agrícola, após aumento de 166 mil em janeiro. Economistas ouvidos pela agência Reuters previam 182 mil de postos a mais.

Com isso, os rendimentos dos Treasuries foram a novas máximas em um ano e o dólar ganhou terreno frente a quase todos os seus principais rivais. O índice do dólar contra uma cesta de moedas fortes subia 0,33% no fim do dia, nos picos desde novembro do ano passado.

O índice do dólar ante moedas de países ricos, que caiu 6,8% no ano passado, sobe cerca de 2,2% neste ano e 3,1% desde a mínima de janeiro.

Nesta sessão, o mercado de ações americano relfetiu a criação de empregos e o índice S&P 500 subiu 1,95%. O Dow Jones teve alta de 1,85% e Nasdaq, de 1,55%.

A alta no mercado exterior impulsionou a recuperação de ações brasileiras. O Ibovespa subiu 2,22%, a 115.202 pontos nesta sexta. Na semana, acumulou alta de 4,7%, após tombo de 7,1% na semana anterior. No ano, o índice recua 3,2%.

A Vale teve forte alta de 5,79%. Santander subiu 4,43% e as ações ordinárias (com direito a voto) do Bradesco, 5,48%.

A Bolsa brasileira também se beneficia da aprovação da PEC Emergencial no Senado com um teto para as despesas com o auxílio emergencial.

"A resistência à queda por parte do dólar ainda reflete um certo grau de preocupação. Afinal, a PEC ainda precisa ser aprovada na Câmara e, por mais que a expectativa seja de aprovação sem alterações drásticas, Brasília é sempre uma caixinha de surpresas", diz a equipe da Guide Investimentos em relatório.

A temporada de resultados também segue no radar dos investidores. Na quarta (3), o BofA Global Research destacou que mais de 50% das empresas do Ibovespa já haviam divulgado balanço e que quase 60% desses superaram as estimativas.

Os estrategistas do BofA disseram que até o momento as companhias tem adotado um tom positivo. Novos lockdowns e juros mais altos, porém, devem impactar lucros à frente, alertaram.

(Com Reuters)


Quarta maior hidrelétrica do País, Santo Antônio vê risco de paralisação total, OESP

 André Borges, O Estado de S.Paulo

04 de março de 2021 | 11h23

BRASÍLIA - A hidrelétrica de Santo Antônio, quarta maior usina do País, com capacidade de atender até 45 milhões de pessoas, corre risco de ficar 100% desligada por até 57 dias, ainda no primeiro semestre deste ano. A paralisação da estrutura erguida nas águas do Rio Madeira, em Porto Velho (RO), causaria um rombo bilionário nas contas de luz e levaria ao acionamento de usinas térmicas para recompor a carga. A situação foi alertada ao governo pela própria concessionária Santo Antônio Energia, dona da usina.

Estadão teve acesso a um documento de caráter confidencial que a empresa levou ao Ministério de Minas e Energia (MME), durante uma reunião ocorrida com o comando da Pasta, no fim de janeiro. O objetivo era discutir as regras de operação impostas à hidrelétrica e o volume de água que Santo Antônio deve armazenar em seu reservatório.

No documento, a concessionária afirma, basicamente, que o volume de água determinado para passar por suas turbinas entre fevereiro e junho pode resultar no desligamento de todas as suas 50 máquinas, por causa da redução de queda da água. O projeto de Santo Antônio prevê uma queda mínima de 9 metros de altura entre a crista da água, na parte de cima da barragem (montante) e a margem que fica na parte de baixo da usina (jusante), para que as turbinas funcionem. Abaixo desse número, pode haver comprometimento mecânico de toda hidrelétrica.

Santo Antônio
Para evitar parada total, Santo Antônio pede que governo autorize a ampliação do volume de água armazenado em seu reservatório. Foto: Divulgação

A usina tem solicitado ao Ibama e ao Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) que seja autorizada a ampliar o volume de água em seu reservatório, de forma a manter uma diferença superior a 9 metros. Ocorre que isso ampliaria o nível do Rio Madeira acima da barragem, inundando uma área de 536 hectares de uma unidade de conservação, o Parque Nacional do Mapinguari, localizado nos Estados de Rondônia e Amazonas.

Ao listar os riscos, a concessionária chega a detalhar o prazo de 57 dias sem geração, dos quais 27 dias seriam de paralisação total e 30 dias para restabelecimento da usina, “em razão da restrição de queda mínima operativa e comprometimento das estruturas da usina, associada ao tempo para sua recomposição plena”.

A Santo Antônio alerta ainda para a interrupção do sistema de transposição de peixes, uma escada artificial onde algumas espécies simulam uma piracema, além do rompimento de estruturas usadas para conter a passagem de troncos carregados pelo rio.

Das 50 turbinas da hidrelétrica, seis são usadas para alimentar a energia de Rondônia e Acre. Trata-se de uma expansão em relação ao projeto original da usina, que previa 44 máquinas e seu reservatório com cota máxima de 70,5 metros de altura. Com a ampliação de turbinas, a empresa requereu o aumento desta cota em mais 80 centímetros, chegando a 71,3 metros. Ocorre que, com isso, passou a inundar as áreas do parque de Mapinguari, o qual já tinha sido reduzido há mais de dez anos, justamente para abrir espaço para o lago artificial do empreendimento.

“A usina de Santo Antônio é especialmente importante para o atendimento dos Estados do Acre e Rondônia. A redução poderá afetar o suprimento energético da região”, afirmou a concessionária ao MME, acrescentando que “poderá ocorrer restrição de atendimento” de cerca de 20% da região, com “possibilidade de ocorrer eventos similares verificados recentemente no Amapá”, ou seja, blecaute geral.

Ao discorrer sobre os impactos na paralisação, a hidrelétrica chega a mencionar que haveria “aumento do risco de racionamento” no País, por causa da redução de energia ao sistema nacional, além de “custo adicional de R$ 1,39 bilhão para recompor o armazenamento”.

A reportagem apurou que a Santo Antônio Energia tem mantido diálogo com o Ibama, o MME e o ICMBio, na tentativa de se chegar a um novo acordo sobre o nível do reservatório. A ideia é incluir alguma mudança na licença de operação da usina. Desde o fim de 2019, a usina espera a aprovação de um projeto de lei que tramita no Congresso, com a previsão de reduzir a área do Parque do Mapinguari, uma vez que isso só pode ser feito por meio do parlamento. Dois anos depois, porém, o projeto ainda não foi votado.

Por meio de nota, a Santo Antônio Energia minimizou os alertas que fez ao governo, dando um ar de normalidade às suas colocações. À reportagem, declarou que “tem por prática fornecer informações aos órgãos reguladores do setor sobre os vários cenários sobre as condições operativas da UHE Santo Antônio e os possíveis impactos no fornecimento de energia ao Sistema Interligado Nacional (SIN)”.

“As projeções de cenários são relatadas com antecedência, mas nem sempre se configuram. Medimos diariamente a vazão do rio e, no momento, a usina está operando normalmente. Portanto, não há nenhum risco de interrupção da geração de energia capaz de atender mais de 45 milhões de pessoas”, informou a companhia. O MME e Ibama não se manifestaram até a publicação deste texto.

05.03.21 | Dia Mundial da Eficiência Energética: entenda a importância da data - Procel

 Rio de Janeiro - Quando se fala em eficiência energética, é comum a associação do termo à economia da energia. Mas, na prática, este é um conceito muito mais amplo. O consumo energético racional propicia inúmeros benefícios ambientais e econômicos. Entre eles, a redução de custos operacionais, aumento da competitividade e produtividade para empresas e maior conforto para residências. A eficiência energética também é considerada por alguns especialistas a fonte de energia mais limpa que existe, uma vez que o recurso energético não consumido evita o aumento da geração e, consequentemente, os impactos ambientais que ela acarreta. Assim, a estratégia favorece a preservação de recursos naturais, ecossistemas e evita o aumento da emissão de gases poluentes.


Para conscientizar a população mundial sobre a relevância desta alternativa energética, em 1998, durante uma conferência internacional sobre o tema realizada na Áustria, foi instituída a data de 5 de março como Dia Mundial da Eficiência Energética. O objetivo é fazer com que, a partir de então, este dia sirva para chamar a atenção para a pauta, diante da preocupação com a possibilidade de um colapso energético e com os danos ambientais causados pela demanda global de energia.

No Brasil, apesar dos esforços e das políticas públicas já existentes, é consenso no setor de energia que ainda há muito para ser feito para que o país alcance um patamar de eficiência. Assim, neste dia 5, em que se comemoram os 23 anos da criação da data, o Procel Info traz a visão de cinco especialistas da área para falar sobre a importância da eficiência energética para diversos setores da economia, além dos rumos que o país precisa seguir para progredir ainda mais nesse sentido.

Indústria tem enorme potencial de ganhos com eficiência energética

O setor industrial brasileiro responde por cerca de 40% da energia elétrica consumida no país, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Além da energia necessária para o funcionamento das cadeias produtivas, muitas indústrias têm fontes de desperdício de energia causadas pela utilização de iluminação e equipamentos ineficientes, gestão energética e operacional inadequadas e até mesmo pela falta de investimento em tecnologias e ações de modernização. Mas, ao mesmo tempo em que representa um dos maiores consumidores do setor elétrico, a Indústria também tem grande potencial para a implementação de estratégias eficazes de redução de consumo de energia.

Dessa forma, a eficiência energética na área industrial oferece a possibilidade de corrigir perdas de eletricidade, além de permitir que a operação aconteça com um menor dispêndio do recurso. Isso significa que indústrias que investem nessa alternativa podem reduzir os custos de operação e até mesmo aumentar sua competitividade no mercado. Além disso, a menor utilização de energia também minimiza os impactos ambientais gerados pela produção industrial, como ressalta o engenheiro da Eletrobras, integrante da equipe do programa Procel Indústria, Samuel Moreira Duarte Santos.

“A palavra-chave para o setor industrial é “competitividade”. Neste sentido, a busca de ganhos advindos da eficiência energética é o propulsor de uma espiral de benefícios para o setor, além de importantes reflexos financeiros, com a redução do consumo de energéticos, o que contribui também para ganhos ambientais, consequentemente, melhorando a imagem da empresa junto ao consumidor final, ou seja, a empresa, por sua vez, alavanca as vendas junto ao público cada vez mais ambientalmente consciente. Deste modo, o principal papel da eficiência energética no setor industrial é o aumento da competitividade”, destaca o especialista.

Na Construção Civil, benefícios vão além da redução do consumo de energia

Assim como a Indústria, a Construção Civil também está entre os maiores consumidores do setor de energia. Nesse caso, a energia utilizada pelas edificações comerciais, residenciais, de serviços e públicas corresponde a quase metade do consumo total do país. Diante dessa alta demanda, a eficiência energética é considerada neste mercado como o instrumento ideal para reverter esse panorama. De acordo com o Programa Nacional de Eficiência Energética em Edificações (Procel Edifica), a implementação de ações para o uso racional de energia pode reduzir em 50% o consumo de novas construções e em 30% no caso de edificações que passam por processo de retrofit.

“O consumo de energia elétrica nas edificações é de aproximadamente 50% do consumo total de energia elétrica do país. O que nos leva a crer que o investimento em eficiência energética para edificações é um objetivo que deve ser perseguido de modo a reduzir tal consumo. No entanto, embora a redução do consumo esteja atrelada à redução das despesas, ela também auxilia na redução dos impactos ambientais, uma vez que reduz a necessidade de ampliação dos sistemas de geração de energia ou o uso de energia não renovável para a geração, por exemplo”, explica a arquiteta do Procel Edifica, Elisete Cunha.
O consumo eficiente de energia elétrica propicia inúmeros benefícios ambientais e econômicos, entre eles, a redução de custos operacionais, aumento da competitividade e produtividade para empresas e maior conforto para residências e ambientes corporativos

Para que sejam alcançados tais índices de redução, determinados segundo os critérios do Programa Brasileiro de Etiquetagem de Edificações (PBE Edifica), há inúmeras medidas que podem ser adotadas, como implantação de sistemas de geração de energia, iluminação eficiente, sistemas de iluminação e ventilação integrados ao local onde a construção está localizada, entre outras. Dessa forma, é possível concluir que, além da redução dos gastos com energia elétrica, a utilização da eficiência energética em edificações resulta em outros benefícios, como a possibilidade de aumentar o conforto daqueles que as utilizam, além de tornar as construções mais sustentáveis do ponto de vista ambiental.

“A eficiência energética relaciona-se diretamente com um ambiente de maior conforto térmico e lumínico, o que auxilia no bem-estar de seus usuários, além de contribuir para o aumento da produtividade. Outro ponto positivo da eficiência energética são projetos arquitetônicos mais conectados com o local onde estão inseridos, de acordo com seu clima, usando estratégias passivas de ventilação e iluminação para o atingimento do conforto necessário”, complementa a arquiteta do Procel.

No setor de Comércio e Serviços, Eficiência Energética também é sinônimo de competitividade

Para as empresas de Comércio e Serviços, a conta de energia elétrica costuma ser um dos grandes vilões do orçamento. De modo geral, o gasto representa parte significativa das despesas, sobretudo para os negócios de pequeno e médio portes. Atualmente, com a crise econômica causada pela pandemia da covid-19 e os constantes aumentos da tarifa, a conta de luz pode pesar ainda mais e se tornar um entrave para a recuperação econômica das empresas. Diante desse cenário, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco), Frederico Araújo, aponta que, mais do que nunca, a eficiência energética deve ser buscada por esse setor, pois pode ser tornar uma aliada nesse período de retomada.

“Eficiência Energética é sinônimo de competitividade para toda e qualquer empresa, independentemente do setor e do momento econômico. Entretanto, em um momento de crise como este em que vivemos, com os efeitos econômicos da pandemia, percebemos mais claramente o peso das despesas como a da energia elétrica em nosso dia a dia empresarial”, afirma Frederico Araújo.

O presidente da Abesco ressalta que não é apenas em momentos de crise que as estratégias de uso racional da energia são vantajosas para empresas. Ele reitera que a redução de custos operacionais propiciadas por essas ações podem se refletir em aumento de competitividade, tanto no mercado interno quanto externo. Frederico Araújo aponta que, diante de tais benefícios e do grande potencial do Brasil para a Eficiência Energética, é preciso investir em ações que possam contribuir com o desenvolvimento desta área no país.

“Além das situações de crise, também temos usualmente a concorrência interna e principalmente externa que, com o cenário do dólar baixo e produtos importados e competitivos, deixam ainda mais expostas as ineficiências produtivas, incluindo a energética. Temos que fazer mais com menos sempre buscando ser mais eficientes em todos os processos, evitando desperdício, transformando nossas corporações competitivas no âmbito nacional e internacional. Sabemos que o Brasil ocupa a penúltima posição em termos de eficiência energética divulgado pela ACEEE – Conselho Americano para uma Economia Energeticamente Eficiente e está em penúltima colocação entre as 16 maiores economias do mundo. Esses dados demonstram que ainda estamos longe de sermos eficientes como nação. Mas podemos transformar esse quadro. A eficiência energética pode auxiliar de forma muito significativa na competitividade das nossas empresas. Temos um enorme potencial de eficiência energética no Brasil. É preciso avançar”, indica Araújo.

Reduzir a demanda de energia é essencial para o desenvolvimento sustentável

Há algumas décadas é crescente a preocupação em como o uso desmedido da energia afeta o meio ambiente. Ao mesmo tempo em que permite o desenvolvimento econômico, a geração energética causa prejuízos que vão desde danos diretos a áreas naturais até a emissão de gases poluentes responsáveis pelo aquecimento global. Por se tratar de um insumo essencial para a sociedade, o desafio é reduzir a demanda de geração de energia e encontrar um equilíbrio com a questão ambiental em um cenário de crescimento populacional e econômico. Desse modo, em todo mundo a tendência é buscar alternativas que possam garantir o desenvolvimento de forma sustentável. E a eficiência energética pode ser uma das chaves para alcançar esse objetivo.

“A eficiência energética deveria ser entendida como o primeiro combustível, na medida em que, em geral, revela-se a mais econômica dentre as alternativas energéticas e, mais do que isso, a que implica redução da pressão por recursos naturais e também emissões evitadas de gases do efeito estufa”, destaca a coordenadora da Iniciativa de Eficiência Energética do Instituto Clima e Sociedade (ICS), Kamyla Borges.
A eficiência energética também é considerada a fonte de energia mais limpa que existe, uma vez que o recurso energético não consumido evita o aumento da geração e, consequentemente, os impactos ambientais gerados pela produção de energia

A especialista aponta ainda que, de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA), a eficiência energética pode possibilitar uma diminuição anual das emissões de gases do efeito estufa no mundo que correspondem a mais de 40% da meta de redução estabelecida para a área de energia pelo Acordo de Paris, iniciativa internacional que visa conter o avanço da crise climática. Em âmbito nacional, ela destaca que a alternativa também representa maior preservação dos ecossistemas nacionais. Em outras palavras, a otimização do recurso pode suprir a necessidade crescente no curto prazo sem que seja necessária a ampliação ou criação de novas usinas de geração de energia no país.

“No caso do Brasil, para além das emissões de gases do efeito estufa, estamos falando da possibilidade de adiamento da necessidade de novas usinas hidrelétricas e termelétricas, as quais têm implicações socioambientais bastante negativas para o país. Dentre elas, vale lembrar a pressão sobre biomas sensíveis, como o amazônico (no caso das hidrelétricas), e de agravamento de problemas relacionados à poluição do ar e aos conflitos pelo uso da água (no caso das termelétricas)”, afirma a representante do ICS.

Políticas públicas são o caminho para a efetiva redução do consumo de energia no país

Conforme exposto anteriormente, a eficiência energética se apresenta como uma alternativa eficaz para desenvolver as atividades econômicas sem que seja necessário aumentar a oferta de energia. Consequentemente, a utilização dessa estratégia ajuda a diminuir a demanda do setor elétrico, reduzindo custos, permitindo uma operação mais sustentável e aumentando as garantias de suprimento energético para abastecer o país.

“A eficiência energética é uma ferramenta poderosa de política pública, ela é transversal a todos os setores da economia e, portanto, tem impacto relevante. Não existe sociedade sustentável energeticamente sem que haja combate ao desperdício de energia e uma evolução contínua do uso eficiente dos seus recursos naturais”, opina George Soares, profissional que atua há 35 anos no setor elétrico, nas áreas pública e privada, com passagens pelo Ministério de Minas e Energia e Eletrobras.

Para alcançar esses resultados, o especialista afirma que as políticas públicas voltadas para essa área são fundamentais. Mas, segundo Soares, as estratégias devem ser bem direcionadas, observando as necessidades de cada setor. Para as indústrias pequenas, ele indica ações de capacitação, suporte técnico e financiamento; para as grandes indústrias, suporte especializado para lidar com a competição; para a construção civil, estratégias direcionadas para os vários tipos de consumidores, construções, fornecedores de materiais, além de financiamentos e regulamentações municipais; e, no setor público, regulamentação, fiscalização e suporte técnico para projetos de eficiência energética.

Para o profissional, os programas nacionais voltados para esta área, como o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), o Programa de Eficiência Energética da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a atuação de alguns ministérios, como o de Minas e Energia, já contemplam essas especificidades em suas ações, um direcionamento que ele considera essencial para que as atividades de eficiência energética sejam efetivas e se mantenham no longo prazo.

“Não obstante todos estes ganhos, as políticas públicas são essenciais para promover o contínuo avanço da eficiência energética de um país. Através de algumas ações, elas estabelecem um novo grau de utilização mais consciente da energia para a sociedade e os setores. Ações como a busca de incrementar os mecanismos de mercado, a minimização das barreiras, promoção da conscientização e mudança de hábitos dos consumidores, incentivo à adoção de tecnologias e serviços eficientes, enrobustecimento do quadro regulatório e adaptação e fortalecimento dos instrumentos financeiros de suporte e implementação das ações. Sem as políticas públicas, os avanços seriam bem mais lentos e capitaneados, basicamente, pelas forças de mercado que, muitas vezes se estabelecem em um determinado ponto e demoram muitos anos para evoluir”, enfatiza o atual CEO da Growing Energy.

Considerando o contexto atual, o especialista destaca que a busca pela eficiência energética se torna ainda mais necessária não só no Brasil, mas em todo o mundo. Pois, se antes da pandemia e da crise global, a estratégia já se apresentava como solução para o setor de energia, agora ela se mostra também como um dos caminhos para a recuperação das economias no futuro.

“Quando se pensa em um futuro próximo em termos globais nos cenários pós-pandemia, a eficiência energética se embute de maior relevância na medida em que pode ajudar a retomada da economia mundial, com a geração de empregos, segurança energética, diminuição de custos operacionais futuros, atingimento das metas de emissão de gases do efeito estufa, entre outros aspectos, colaborando para que a economia global seja mais sustentável nas vertentes ambiental, econômica e social”, avalia George Soares.