quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Favorito à presidência da Câmara de SP, Milton Leite deve reunir apoios de Covas a PT, FSP

Se os eleitores de São Paulo escolheram a continuidade ao eleger Bruno Covas (PSDB), a orientação deve ser a mesma na Câmara Municipal, onde Milton Leite (DEM) larga como favoritíssimo na briga pela presidência.

Chefe do Legislativo em 2017 e 2018, Leite somará o apoio da base do tucano à costura com o PT, que já votou nele em eleições anteriores com o objetivo de assegurar espaços na Mesa Diretora. A provável vitória é mais uma expressão das dobradinhas entre PSDB e DEM pelo país.

O vereador Milton Leite no desfile das escolas de samba de São Paulo no Anhembi
O vereador Milton Leite no desfile das escolas de samba de São Paulo no Anhembi - Marcus Leoni-1º.mar.2019/Folhapress

Trinta e quatro dos 55 vereadores fazem parte da base do prefeito na Câmara —são todos exceto os vereadores de PSOL, PT, Patriota e Novo.

Os votos da base de Covas mais os do PT, que são oito, deverão garantir vitória tranquila para Leite em 1º de janeiro, quando a nova legislatura tomará posse.

João Jorge (PSDB) começou a articular também uma candidatura, mas mesmo aliados dizem que ela não deve prosperar, com Leite na parada. Mas o vereador assim já coloca seu nome para as próximas disputas.

Em 2021, a Câmara discutirá a revisão do Plano Diretor da cidade, e o debate deverá marcar um dos ápices de tensão numa legislatura que promete turbulência. Leite e aliados têm interlocução mais próxima com empresas da construção civil, e a oposição, tradicionalmente, com urbanistas e associações de bairros.

Com PSOL, Patriota e Novo fortalecidos, vereadores imaginam a reedição de episódios que aconteceram na Assembleia Legislativa recentemente: antagonistas se unindo estrategicamente em votações contra o Executivo.

Vereadores próximos de Leite alertam que, caso vença, ele deverá ter desgaste em prováveis embates com representantes do PSOL e do Patriota, de estilo combativo e bastante capacidade de mobilização nas redes sociais.

Outros ponderam que vereadores de estilo similar na atual legislatura, como Fernando Holiday (Patriota), foram obrigados a mudar de estilo para se adaptarem à negociação política na Câmara.

Painel

Editado por Fábio Zanini (interino), espaço traz notícias e bastidores da política. Com Mariana Carneiro e Guilherme Seto.

 

Antonio Delfim Netto - A disputa pelo poder, FSP

 O presidente Bolsonaro gastou os primeiros 18 meses de seu mandato recusando-se a entender um fato elementar das democracias pluripartidárias: o único caminho para o presidente eleito cujo partido não foi majoritário é dividir o poder com outros partidos e organizar uma maioria estável no Congresso para aprovar um programa consensualmente negociado com eles.

Meteu-se na aventura de uma indefinida "nova" política, com a pior Casa Civil da história da República, sem entender que, quando a Constituição diz que todo poder emana do povo, está implícito que é impossível o Executivo governar sem o Parlamento... Agora corre para reparar o prejuízo.

O que está em jogo hoje, e que posterga perigosamente as difíceis, mas necessárias, decisões para o futuro do país, é a luta pelo controle das duas casas do Legislativo. Quem dominar o Congresso no biênio 2021/2022 terá grande poder de decisão e de pauta. Controlará a Presidência da República, pois será dono do destino dos inúmeros pedidos de impeachment que dormem nas gavetas da Câmara dos Deputados, e terá influência decisiva no destino do jogo eleitoral deste horizonte.

Não foi à toa que até o Supremo Tribunal Federal foi, mais uma vez, chamado a judicializar a política pelos que tanto disso reclamam. Espera-se que seja ele a (re)interpretar o texto cristalino do artigo 57 da Constituição Federal e , com isso, deixe a sua marca no processo.

A incerteza sobre os rumos que tomarão esses temas uma vez eleitos os presidentes do Legislativo talvez explique o jogo arriscado do Executivo em se meter nessa matéria, o que aumenta a chance de que a aposta não acabe bem. O governo finalmente entendeu que precisava de base política para se sustentar e implementar seu projeto —e agora tenta recuperar o tempo perdido.

A luta é sobre quem deterá esse poder político --e tem pouco a ver com a direção em que a economia brasileira irá caminhar. É disso que se trata. Não é sobre uma disputa em torno de um projeto mais ou menos "desenvolvimentista", ou mais ou menos "monetarista", ou sobre o sacerdote de qual igreja das crenças econômicas rezará a missa.

Enquanto esse jogo é jogado, vamos encerrar o ano sem termos sequer a Comissão Mista de Orçamento instalada, muito menos tendo claro o que se pretende fazer para reorganizar as contas fiscais após os necessários e justificáveis gastos extraordinários requeridos pelo enfrentamento da pandemia em 2020.

Durante essa disputa, corremos o risco de que o teto, sem gatilhos, acabe caindo na cabeça da sociedade.

Antonio Delfim Netto

Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.