terça-feira, 7 de maio de 2019

Troca de Plumas, Opinião FSP

Troca de plumas

Convenção tucana explicita disputa entre Geraldo Alckmin e João Doria

No centro, o presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, fala ao microfone em convenção estadual do partido, em São Paulo; próximos a ele estão o senador José Serra e o governador João Doria
No centro, o presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, fala ao microfone em convenção estadual do partido, em São Paulo; próximos a ele estão o senador José Serra e o governador João Doria - Carolina Linhares/Folhapress
A convenção estadual do PSDB, que elegeu Marco Vinholi, 34, o novo presidente do partido em São Paulo, explicitou as divisões que vêm se acentuando entre os tucanos desde que João Doria projetou-se como liderança emergente ao assumir a prefeitura da capital, em janeiro de 2017.
Beneficiado pelo apoio do então governador Geraldo Alckmin, o novato não tardou a entrar em competição com seu padrinho. Seu objetivo, desde o primeiro momento, era nada menos do que a conquista da candidatura presidencial da legenda em 2018.
Com apoio de uma estratégia de marketing que visava transformá-lo em figura nacional, o novo alcaide posou de gari, pintou muros da cidade e anunciou um ambicioso programa de privatizações e parcerias com a iniciativa privada. 
Suas inclinações pró-mercado o ajudaram a ser apontado como personalidade do ano pela Câmara de Comércio Brasil-EUA, que promoveu encontros com empresários e uma homenagem de gala em Nova York —mesma honraria dispensada ao presidente Jair Bolsonaro, mas provisoriamente suspensa devido a pressões de opositores.
Afoito e determinado a tomar um atalho para a disputa pelo Planalto, atritou-se com Alckmin, que acabou, a duras penas, levando a melhor na disputa pelas simpatias da máquina partidária.
Entretanto o retumbante fiasco do ex-governador na disputa presidencial e a vitória de Doria na corrida pelo Bandeirantes mudaram o equilíbrio de forças. 
Hoje, o PSDB perdeu muito de sua projeção e está dividido tanto do ponto vista ideológico quanto geracional. A velha guarda, representada por nomes como o senador José Serra, parece acreditar numa improvável regeneração do partido a partir do reencontro com suas teses e práticas originais. Alckmin assumiu tal pregação.
A ideia seria retomar a linha social-democrata, pragmática no terreno econômico, mas compromissada com políticas de proteção aos mais pobres na área social.
Já Doria bateu na tecla da renovação —algo cujo significado concreto permanece um tanto obscuro.
Na campanha, o tucano aproximou-se do bolsonarismo com o discurso antipetista e o apoio a teses conservadoras, em especial na segurança pública. No governo do estado, porém, não dá mostras de seguir o populismo do presidente. Seu secretariado junta técnicos de peso e quadros partidários.
Os sinais, não há dúvida, são de que o atual governador se encontra bem posicionado para assumir a liderança do espólio tucano. A eleição de Vinholi é apenas um dos indicadores desse panorama.
Para maiores voos, resta a ele mostrar capacidade para a condução de políticas de governo e a negociação legislativa, predicados até aqui em segundo plano na sua meteórica ascensão na vida pública.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Solução para aposentadoria, confiança no teletrabalho e roubo de assentos, Dan Ariely, FSP

Querido Dan,
Qual é a melhor maneira de garantir que os americanos tenham fundos suficientes para a aposentadoria?
—Ben
Existem basicamente duas maneiras de ajudar as pessoas a terem dinheiro suficiente para a aposentadoria: incentivar que economizem mais dinheiro ou que morram mais jovens. O mais fácil, de longe, é estimular que as pessoas morram mais jovens. Como podemos fazer isso? Permitindo que os cidadãos fumem, subsidiando alimentos açucarados e gordurosos e dificultando o acesso a cuidados de saúde preventivos. Opa, pensando bem, parece que já estamos fazendo o nosso máximo nessa frente.

Querido Dan,
Estou escrevendo para você sentado no chão de um trem na Alemanha. O trem está lotado e todos os assentos estão ocupados. No entanto, existe uma classe especial de “clientes conforto” que tem preferência pelos assentos podendo requerer que o passageiro sem esse status ceda o seu lugar. “Cliente conforto” é aquele que, assim como eu, viaja muito de trem. Seria bom conseguir poder sentar em um assento e, de acordo com as regras, eu tenho direito a um. Mas eu não consigo pedir a um dos passageiros que não é “cliente conforto” que ceda seu lugar para mim. Por que isso é tão difícil?
—Frederick
Sua pergunta tem a ver com o que chamamos de “efeito da vítima identificável”. A ideia básica é que, quando vemos uma pessoa necessitada, nosso coração se apega a ela —nós nos importamos e ajudamos. Mas quando o problema é muito grande, distante ou não vemos a pessoa que está sofrendo, não nos importamos nem ajudamos com a mesma intensidade.
No seu caso, suspeito que, se o condutor do trem escolhesse um passageiro aleatório para ceder o assento para você, e especialmente se o condutor fizesse isso antes de você embarcar no trem, você conseguiria desfrutar do assento. Nessa mesma situação, se o condutor pedisse que algum conhecido seu liberasse o assento para você, a sensação seria um pouco pior. Entretanto, escolher você mesmo a pessoa que deverá ceder o lugar é provavelmente o cenário mais difícil, porque você terá que enfrentar o efeito da sua ação (a pessoa se levantar e ter de se sentar no chão), além da reação dela ao seu pedido.
Qual é a lição aqui? É que o contato direto com outras pessoas possibilita nos importarmos e agirmos de acordo. E quando a distância é grande, ou as ações são tomadas sem o nosso conhecimento, nos importamos muito menos. Agora, a questão é como levar políticos, banqueiros, CEOs e todos os outros a sentir mais diretamente as consequências de suas ações no bem-estar dos outros.
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Aposentados durante leilão de fazendas no Kansas (EUA) - Reuters

Querido Dan,
Eu trabalho para uma agência do governo que está nos estágios iniciais de tornar o teletrabalho uma opção para seus colaboradores. A ideia está gerando muita desconfiança entre os gerentes. Eu sei que os gerentes devem confiar em seus subordinados, mas me parece óbvio que os colaboradores trabalharão menos em casa. Qual a sua opinião sobre trabalhar em casa?
—Julisa
Existem várias razões possíveis para a recente decisão de oferecer a opção de trabalho remoto —algumas boas e outras más. Deixe-me concentrar aqui em apenas duas delas: horas de trabalho e atenção. Em termos de horas de trabalho esperadas, aqueles que estão em um escritório são expostos a dois padrões: o padrão oficial de 40 horas por semana e o padrão social, aquele definido pelas pessoas que trabalham junto delas. Por exemplo, nós todos sabemos que o padrão social na indústria de alta tecnologia é muito maior do que o oficial de 40 horas por semana. Nesses casos, as pessoas que ficam no escritório seguirão esse padrão social de muito mais horas trabalhadas. Para aqueles que trabalham em casa, a jornada de 40 horas será uma referência e, consequentemente, é provável que adotem isso como uma dedicação justa.
Em termos de atenção ao trabalho, minha própria experiência me diz que quando as pessoas estão juntas na mesma sala, elas prestam atenção e concentram-se com grande parte de sua capacidade cognitiva. Mas quando as pessoas estão remotas, participando via telefone ou videoconferência, elas não estão totalmente engajadas e, em muitos casos, até tentam (sem sucesso) realizar tarefas em paralelo durante reuniões importantes.
A propósito, minha mãe sempre sabe quando eu estou realizando outras tarefas enquanto converso com ela, então talvez a sua empresa deva contratá-la para monitorar suas conferências onine e repreender aqueles que não estão focados o suficiente.
Dan Ariely
Professor de economia comportamental e psicologia na Universidade Duke (EUA), autor de “Previsivelmente Irracional”.
TÓPICOS

Grandes mudanças nas relações de trabalho, Celso Ming, OESP



O desemprego é uma experiência tão traumática que tende a deformar a percepção das pessoas sobre tudo quanto diz respeito ao tema. Especialmente num momento histórico, como o de agora, em que a própria relação de trabalho, tal como se conhece, está em forte mutação.
Uma dessas deformações, observa o especialista em Economia do Trabalho Hélio Zylberstajn, em artigo recente no jornal Valor Econômico, é a de que a sociedade tende a tratar o emprego com uma visão maniqueísta. É a que vê tudo apenas em branco e preto, incapaz de considerar os inevitáveis tons de cinza. Emprego bom só é aquele que proporciona carteira de trabalho assinada, com todos os direitos trabalhistas a ela associados como férias, 13.° salário, plano de saúde, etc. Outras formas de ocupação, como o trabalho terceirizado, ocupações por conta própria e prestações de serviços temporários são todas, empurradas para dentro do mesmo balaio, o do trabalho precário.
Trabalho informal
As novas tecnologias e o uso crescente de aplicativos vêm criando novas ocupações, que dispensam contrato com um empregador Foto: Marcos Müller/Estadão
E, no entanto, 11,1 milhões de trabalhadores brasileiros não têm emprego com carteira assinada (estão no trabalho informal) e operam como autônomos, prestadores de serviços intermitentes ou sazonais. As novas tecnologias e o uso crescente de aplicativos vêm criando novas ocupações, que dispensam contrato com um empregador. É o caso dos motoristas do Uber, do 99 e do Cabify; das locações proporcionadas pelo Airbnb; dos motoqueiros do iFood e de grande variedade de prestações de serviços, como os de cuidadores de idosos, enfermeiros particulares, personal trainers, passeadores de cães e maridos de aluguel.
Em algumas localidades, as autoridades vêm tentando enquadrar as novas ocupações a um vínculo qualquer de emprego, mais como forma de salvar do desaparecimento algumas atividades tradicionais, como a dos taxistas ou a da rede hoteleira de baixo custo, do que de proporcionar proteção trabalhista adequada a esses novos profissionais. Mas a grande proliferação dessas novas atividades tende a atropelar iniciativas desse tipo. Como observa outro especialista da área, o professor da Universidade de São Paulo José Pastore, “se hoje são 25% os que vivem do trabalho flexível, dentro de dez anos, ou menos, serão 50%”.
Muitas vezes, os trabalhadores tiram seu sustento de ocupações fragmentadas, de grande mobilidade de locais e tipos de serviços, de maneira que é praticamente impossível determinar. Como atesta Pastore com base em pesquisa recente, essas não são apenas novidades impostas pela vida moderna, digamos assim, mas aspiradas por pelo menos 55% dos jovens brasileiros. Estes preferem trabalhar por conta própria e, assim, abrir mão dos direitos trabalhistas do que se sujeitar a horários fixos e às regras impostas por um contrato de trabalho padrão.
É uma realidade que se sobrepõe a outra aspiração crescente entre a população de baixa e média rendas, que é a de deixar de procurar um emprego convencional e tomar a iniciativa de exercer certo tipo de empreendedorismo.
Essa não é uma tendência apenas brasileira. No mundo inteiro, a tecnologia da informação, a automação e as novas arrumações do sistema de produção estão produzindo transformações importantes nas relações de trabalho.
As consequências são de enorme importância econômica, política e social. Os sindicatos e os acordos coletivos, por exemplo, saem enfraquecidos, até mesmo porque já não dispõem nem dos portões nem dos chãos de fábrica para mobilizar a companheirada. O financiamento dos sistemas de previdência baseados na contribuição do empregado e do empregador tende a definhar, as leis e as regras de proteção ao trabalhador estão sendo fortemente questionadas.
Diante disso, a atitude prevalecente até aqui de denunciar a “precarização” do trabalho sob o olhar conivente ou omisso das autoridades não leva a lugar nenhum, porque ignora o fenômeno mais poderoso, que é a irreversível transformação das relações de trabalho no mundo inteiro.
O que precisa ser feito é, em primeiro lugar, aceitar as mudanças e, em segundo, ajustar as leis trabalhistas e as demais instituições de proteção do emprego a essa nova realidade, de maneira a assegurar não propriamente o emprego tal como conhecido, mas ocupação à população.
Também não dá para ignorar todo o sistema de ensino de treinamento. A escola não pode mais se limitar a formar mão de obra para o exercício de ocupações convencionais do mercado de trabalho. Têm de dar acesso à tecnologia de ponta e, mais do que tudo, têm de ensinar a aprender.