quinta-feira, 28 de junho de 2018

Coalizão contra Lava Jato aproveita Copa para matar a operação, FSP

Esperteza do grupo não se limita ao timing da iniciativa, mas também a sua abrangência

Aproveitando a distração popular com a Copa do Mundo na Rússia, a coalizão empenhada em matar a Operação Lava Jato avança. 
A esperteza desse grupo de políticos, empresários e ministros de tribunais superiores que comanda o atual regime e corre algum risco diante das investigações não se limita ao timing da iniciativa, mas também a sua abrangência. 
Na jogada brilhante dos últimos dias, os representantes do pacto no STF (Supremo Tribunal Federal) soltaram presos e suspenderam processos que beneficiam gente graúda em todo o espectro ideológico.
A ofensiva do STF não podia ser mais conveniente para os partidos políticos. Como estamos à beira de uma eleição gigantesca para renovar o Executivo e o Legislativo, quem tem cargo eletivo prefere não agir em público contra juízes e promotores que ainda gozam de apoio popular. De olho no eleitor, a CPI da Lava Jato foi retirada de cena com a mesma teatralidade em que lá foi posta. 
Graças ao trabalho da corte suprema, os partidos foram à forra. O PT conseguiu tirar um velho ministro chefe da Casa Civil, inocentar uma senadora da República, anular uma busca e apreensão em seu apartamento e, de quebra, invalidar as provas que tinham por alvo seu marido, ex-ministro poderoso da sigla.  
Com ajuda do Supremo, o PSDB livrou o deputado estadual da suposta máfia da merenda escolar da denúncia que o pressionava. 
O MDB tirou da prisão o operador acusado de esquema de fraudes em fundos de pensão como Postalis e Serpros. 
O PP conseguiu soltar um tesoureiro, rejeitar ação penal sobre intermediação de propina e adiar o julgamento de um senador. 
O PSD conseguiu livrar um deputado de denúncia de falsificação de documentos, e o PC do B aproveitou o embalo para recorrer contra a prisão em segunda instância
Passada a eleição, o pacto oligárquico redobrará a sua aposta, aproveitando a baixa taxa de renovação política. Qualquer substituição da velha política por um sistema um pouco mais limpo e decente demandaria mudanças profundas nas regras do jogo, mas nada indica que isso vá ocorrer. 
Depois de outubro, o pacto também contará com um presidente mais forte do que o atual. Aí poderá introduzir novas regras para reduzir o poder do Ministério Público, aumentar a capacidade das cortes superiores de descartar evidências coletadas em delações premiadas e restaurar a prática de postergar condenações para quem tem condições de arcar com as custas de advogados de elite. 
seleção brasileira encerrou a semana na Rússia chegando à liderança de seu grupo. Mas a grande vitória de 2018 será a do atraso. 
 
Matias Spektor
Ensina relações internacionais na FGV. Trabalhou para a ONU antes de completar o doutorado em Oxford.

Anos contados, FSP

Alteração na pirâmide etária traz desafios, como os gastos em saúde e o regime previdenciário

Idosos aguardam atendimento em agência do INSS no centro paulistano
Idosos aguardam atendimento em agência do INSS no centro paulistano - Lalo de Almeida - 27.jan.09/Folhapress
Num exemplo singelo do que os linguistas chamam de autorreferência, a demógrafa Ana Amélia Camarano, do Ipea, afirma que o conceito de idoso envelheceu. 
Forjado em 1994, ele definia a pessoa com mais de 60 anos de idade. De lá para cá, porém, a expectativa de vida do brasileiro deu um salto de seis anos, como apontou a estudiosa em entrevista a esta Folha.
Reflexos dessa mudança aparecem na legislação. O Estatuto do Idoso é aplicado aos que têm mais de 60; para receber o Benefício de Prestação Continuada, são 65, mesma faixa do transporte gratuito. A meia-entrada vem aos 60; para a aposentadoria compulsória no serviço público, a marca há pouco foi elevada dos 70 para os 75.
Como bem observa Camarano, impõe-se igualar as idades exigidas nas diversas políticas públicas. Hoje, faz mais sentido fixá-las em patamar mais elevado. Afinal, as projeções indicam que, entre 2010 e 2050, a população brasileira com mais de 60 anos triplicará.
envelhecimento demográfico é fenômeno complexo, que encerra pontos positivos e negativos para os quais o Brasil precisa se preparar.
Intrinsecamente, trata-se de uma boa notícia. Significa que pessoas vivem mais que no passado. A maior parte desse ganho vem da redução da mortalidade infantil, mas também se percebem avanços na longevidade.
Essa alteração na pirâmide etária traz desafios. O país terá chance de economizar nas verbas destinadas à educação básica, por exemplo, mas necessitará gastar muito mais em saúde, com o aumento da população propensa a padecer de enfermidades crônicas.
O problema mais urgente, contudo, é o da Previdência. Aqui se adota o sistema de repartição simples, pelo qual os trabalhadores na ativa financiam os que já se aposentaram. Em 2013, havia 9,3 pessoas no mercado para cada idoso. Em 2030, essa relação cairá para 5,1 e, em 2060, para 2,3.
Se nada for feito, as aposentadorias acabarão por consumir 25% da renda nacional, algo insustentável em qualquer parte do mundo.
A pior notícia, porém, vem do campo das oportunidades desperdiçadas. O regime previdenciário, afinal, pode ser reformado, ainda que haja enormes obstáculos políticos para tal empreitada.
O que não se pode alterar é o fato de que o chamado bônus demográfico —o período de aumento da população em idade de trabalhar— se fecha em 2020.
Este é um momento que as nações aproveitam para enriquecer. Já o Brasil, por erros próprios, caminha para uma década perdida.