segunda-feira, 30 de abril de 2018

China dá baile em internet das coisas, FSP

China dá baile em internet das coisas

Em Pequim, morador de rua carrega placa com seu código QR para receber ajuda

Na semana passada, aconteceu na Universidade Columbia, em Nova York, um evento para promover o diálogo entre o Brasil e a China sobre a chamada internet das coisas. O termo denota a tendência de que tudo tende a se conectar à internet. Desde objetos cotidianos, como lâmpadas, a maquinário industrial.
O Brasil está prestes a lançar oficialmente seu plano nacional para essa área. Faz sentido. A onda de conectar objetos vai gerar um novo ciclo de inovação que está só no começo. O plano brasileiro (do qual participei) prioriza quatro setores: saúde, cidades inteligentes, manufatura e produção rural.
Passageiro utiliza leitor de código QR do telefone para comprar mercadorias em um trem, na China - Liu Chuan - 13.mar.2018/Xinhua
A China, por sua vez, lançou seu plano de internet das coisas em 2010. Colhe agora os frutos do investimento na área. Enquanto o Brasil investe perto de 1% do PIB (Produto Interno Bruto) em ciência e tecnologia (com a maior parte vinda de recursos públicos), a China investe 2,1%, sendo que 75% do valor vem de empresas.
Os resultados são visíveis. A tecnologia mudou a sociedade chinesa. Hoje praticamente ninguém mais usa dinheiro. Todos os pagamentos são feitos por celular. Basta caminhar pelas ruas de Pequim para notar que os moradores de rua carregam placas com seu código QR para receber ajuda. Sabem que a chance de conseguir um trocado em dinheiro é ínfima.
O mesmo acontece com carregadores de mala nos hotéis. Usualmente portam um crachá com seu código QR. Ou, ainda, em festas de casamento. Na entrada há um painel com o código da noiva e do noivo, para que cada um possa receber presentes diretamente.
Outra vítima dessa mudança tecnológica são as “maquininhas” para pagamentos por débito ou crédito. Elas desapareceram. Tudo o que um lojista precisa hoje para aceitar pagamentos digitais é uma folha de papel com seu código QR impresso. 
Para pagar, o cliente lê o código do lojista com o celular e digita o valor. O dinheiro é transferido na hora, sem nenhuma taxa de intermediação.
Outra evolução que a internet das coisas trouxe na China é o surgimento de lojas meramente demonstrativas. Elas não têm estoque nem vendem nada. São grandes mostruários onde o consumidor vê os produtos, experimenta roupas e assim por diante.
Se gostar de algo, escaneia o código do produto com o celular, fazendo também o pagamento digitalmente. O produto é então entregue na sua casa no mesmo dia.
Outra inovação comum na China (que começa a chegar ao Brasil) são bicicletas públicas sem estação fixa (“dockless bikes”). Não precisam ser colocadas de volta. Podem ser deixadas em qualquer lugar.
Claro que há recomendações sobre como estacioná-las (não obstruindo passagens, por exemplo). Mas a decisão é de cada pessoa. Como cada bicicleta tem um GPS, são então reorganizadas todas as noites conforme a demanda. 
Há hoje 2,3 milhões de bicicletas desse tipo em Pequim. A primeira hora de uso é sempre gratuita. Cada hora adicional custa o equivalente a R$ 0,50, e o valor máximo por 24 horas é de R$ 5.
A impressão é que a China está ao menos cinco anos na frente do Ocidente no uso da tecnologia. Apesar disso, é questão de tempo para que essas mudanças cheguem também entre nós.
Já era  Celulares de tela pequena
Já é  Celulares de telas grandes
Já vem  Celulares com três telas diferentes
Ronaldo Lemos
É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio e representante do MIT Media Lab.

Brenda Brito e Natalie Unterstell: O brasileiro sabe o que tem de ser feito, FSP

Brenda Brito e Natalie Unterstell: O brasileiro sabe o que tem de ser feito

Resíduos vão para o lugar errado; a riqueza da floresta evapora com o fogo ou desmatamento, e as águas não se renovam mais com qualidade; isso incomoda o brasileiro

Bairro da periferia de Manaus sem saneamento básico, onde há risco de enchente
Bairro da periferia de Manaus sem saneamento básico, onde há risco de enchente - Eduardo Knapp - 29.jan.18/Folhapress
Pesquisa realizada com 3.000 brasileiros reafirma alertas sobre os principais problemas ambientais das cinco regiões do país. Eles requerem urgência no seu tratamento, aliada a uma visão de longo prazo.
 
O levantamento foi feito pelo instituto Ideia Big Data e o Agora!, movimento formado por cem cidadãos que querem impactar a agenda pública e promover inovação política.

Hoje, 40% dos brasileiros afirmam que a destinação inadequada do lixo é o nosso maior problema. O número cai para 35% na região Centro-Oeste e sobe para 43% no Sul e 45% na região Nordeste. De fato, essa percepção reflete a gestão dos resíduos sólidos nos municípios.

Ainda que essa coleta alcance 91% dos que vivem em cidades, apenas 58% têm destino final adequado. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, até 2016, metade dos municípios brasileiros ainda destinava resíduos em lixões em vez de aterros sanitários, e 59% não tinham planos para gestão desse material.

A poluição das águas e o desmatamento aparecem em seguida entre os maiores problemas ambientais, mas variam de acordo com a região. 

No Sul, Sudeste e Nordeste, os problemas com recursos hídricos foram lembrados por mais de 20% da população. O destaque foi no Nordeste, onde 27% mencionaram a poluição das águas como o grande problema.

Já no Norte (35%) e Centro-Oeste (30%), o desmatamento é o segundo colocado. Estas são as regiões que perdem mais áreas de vegetação no Brasil, com o desmatamento na Amazônia e no Cerrado.

Finalmente, a poluição do ar é percebida como grande problema por 18% dos brasileiros que habitam a região Sudeste, a mais urbanizada do país. Nos demais, fica abaixo dos 9%.

A pesquisa mostra que, mais do que problemas, há oportunidades sendo perdidas: os resíduos vão para o lugar errado; a riqueza da floresta evapora com o fogo ou com o desmatamento; e as águas não se renovam mais com qualidade. O brasileiro sabe, e isso o incomoda.

Precisamos, mais do que nunca, de cuidado com a água e saber enxergar valor no lixo. Os governos, em todos os níveis, têm que levantar a bandeira da aplicação efetiva da lei de resíduos sólidos.

Outro alerta é o de que o saneamento básico precisa ser prioridade. Quase metade do nosso povo (45%) não tem acesso a serviço adequado de esgoto. Isso impacta diretamente a saúde da população, atingindo o desenvolvimento de crianças que crescem em zonas de periferia.

Metas agressivas de melhora das estatísticas de cobertura e tratamento de esgoto precisam ser combinadas com uma ocupação mais ordenada do território.

Por fim, é preciso dar destino certo não só ao lixo, mas também às nossas florestas.

O avanço da fronteira agrícola ainda é o principal vetor de desmatamento na Amazônia e no Cerrado. Mas não precisa ser assim.

Já existem tecnologia e área aberta suficientes para aumentar a produção agropecuária sem desmatar mais um hectare.

Por isso, o país deve priorizar o fim do desmatamento e exigir o cumprimento da legislação socioambiental para acesso a subsídios públicos no setor agropecuário.

Os consumidores não deveriam ter que escolher entre uma carne com ou sem desmatamento, pois toda a produção deveria ser aliada da conservação. Afinal, sem florestas teremos menos água para irrigar nossa produção agrícola.

Para todos os problemas evidenciados pelos brasileiros na pesquisa, há solução já desenvolvida. O que precisamos agora é de gente comprometida com a causa pública para tirá-las do papel. Nas eleições de outubro, lembre-se disso quando checar as propostas dos candidatos.
Brenda Brito e Natalie Unterstell
São especialistas em políticas públicas ambientais e membros do movimento Agora!

    Claudio Lottenberg: Atraso crônico, FSP


    Claudio Lottenberg: Atraso crônico

    Enquanto o mundo se aprimora com os benefícios da digitalização na saúde, que proporciona eficiência e ganhos de produtividade, no Brasil quase nada avançou nessa frente



    Claudio Lottenberg, presidente do UnitedHealth Group Brasil, em seminário promovido pela Folha no dia 23 de abril
    Claudio Lottenberg, presidente do UnitedHealth Group Brasil, em seminário promovido pela Folha no dia 23 de abril - Reinaldo Canato - 23.abr.18/Folhapress
    No atual cenário eleitoral instável e repleto de dúvidas, uma coisa é certa: a saúde continua sendo causa de preocupação e insatisfação para a maioria dos brasileiros.

    Enquanto o mundo se aprimora com os benefícios da digitalização, que proporciona eficiência, ganhos de produtividade e economia, no Brasil quase nada avançou nessa frente, e a saúde padece, afetada por um atraso crônico.

    A era digital transforma substancialmente a área da saúde. Cria condições para a uniformização e o compartilhamento de informações com impactos relevantes na assistência médica, atenção básica, prevenção e tratamento de doenças, contribuindo para aumentar o acesso da população à saúde, obter melhora dos desfechos, enfrentar adequadamente o avanço das doenças derivadas da maior expectativa de vida e evoluir para um novo modelo de gestão financeira do sistema com incremento de eficiência.

    Além disso, num país com as dimensões do Brasil, a telemedicina apresentaria benefícios importantes para o atendimento em locais mais afastados, onde a presença de especialistas é insuficiente.

    Do mesmo modo que clínicas e hospitais, as próprias residências dos pacientes podem ser integradas ao processo por meio de aplicativos, relógios ou pulseiras que auxiliam em monitoramentos, controles de indicadores e emissão de alertas para procedimentos de assistência médica que sejam necessários.

    Sempre haverá pessimistas afirmando que nem todo o território é coberto pela internet, mas de alguma forma temos que começar.

    A raiz desse processo está justamente no prontuário médico, que vigora dentro do contexto da assistência desde que esta passou a existir. A diferença é que agora ele pode ser eletrônico, abrindo as portas para um cenário de inteligência artificial e "analitics".

    Os ganhos com essa informação gerada —e dentro de um cenário de obrigatoriedade— traria uma mudança estruturante real, com foco e, acreditem, economia baseada em evidência.

    Com a digitalização e com o potencial de utilização da telemedicina, estaríamos fazendo mais e melhor, contribuindo para reverter a insatisfação da população brasileira com a saúde e verificando que os recursos, embora parcos, poderiam ser mais bem utilizados, possivelmente eliminando 33% do custo que é gasto em desperdício por práticas obsoletas, retrabalho, redundância, burocracia e fraudes.

    No entanto, ao contrário de outros países que avançam, estamos, lamentavelmente, deixando de lado a internet das coisas, a comunicabilidade e a medicina baseada em valor que necessita de muito e, ao mesmo tempo, de tão pouco.

    Deixamos de avançar, aumentando nossa defasagem tecnológica e sofrendo as consequências de um processo que é degenerativo.

    Mas quem sabe o erro seja o (des)entendimento de todos os envolvidos; do governo, que deveria ter um plano estruturante e não apenas compensatório; dos profissionais da saúde, que têm que assumir um protagonismo claro e um papel de liderança, sem corporativismos; e da sociedade, que deveria se interessar em gerenciar sua saúde pautada por valor e por evidência, em vez de se limitar a erguer a bandeira dos direitos.

    Além disso, a própria estrutura de Estado tem a responsabilidade de criar os elementos facilitadores para atrair ainda mais a iniciativa privada disposta a enfrentar o desafio de desenvolver e construir um novo sistema de saúde para o Brasil.

    A saúde responde atualmente por 5 milhões de postos no mercado de trabalho, representa quase 10% do PIB brasileiro, gera novas habilidades para capital humano e, portanto, constitui um dos principais setores de oportunidade de crescimento para o país.

    Mas, a persistir o cenário atual, sem ações concretas para superar o atraso crônico, os gastos com o sistema deverão chegar a níveis insustentáveis para todos.
    Claudio Lottenberg
    É presidente do UnitedHealth Group Brasil, do Instituto Coalização Saúde e do conselho deliberativo do Hospital Israelita Albert Einstein; foi secretário municipal de Saúde de SP (2005, gestão Serra)