sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Fim da reeleição: bom remédio para o Brasil (?)


Publicado por Luiz Flávio Gomes - 4 horas atrás
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Marina Silva (PSB) defende a ideia da não reeleição (para os cargos executivos), o PT nada disse oficialmente e o Aécio Neves (PSDB) desconversou: “Eu defendo, como sempre defendi, a coincidência das eleições com mandatos de cinco anos, sem direito à reeleição. O momento em que isso vai ser implementado dependerá do Congresso Nacional”. Se não nos mobilizarmos amplamente, a ideia da não-reeleição para o Executivo e para o Legislativo não vai vingar nunca.
Dos 513 deputados que irão compor a nova legislatura, com início em 1/2/15, 260 dizem ter como profissão a “política”. Tornaram-se, como se vê, políticos profissionais! Depois vêm advogados (44), empresários (42), médicos (29), servidores públicos (14), engenheiro (11), professores (11), economistas (7), jornalistas (6), agricultores (5), policiais (5) e outros (67) (Folha 9/10/14: 7). Dois candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa conseguiram votos para se eleger (Paulo Maluf e André Moura), mas ainda têm recursos pendentes.
Homens (não as mulheres), brancos (não negros nem índios), adultos (não crianças), grandes ou médios proprietários (não os pequenos ou não-proprietários), de orientação sexual masculina (não homossexuais etc.), corporalmente sãos (não portadores de deficiência física), livres (não os que se encontram em neoservidões ou neoescravidões), com ensino superior completo (411 dos 513 parlamentares) e políticos de carreira (260 dos 513): esse é o parlamentar médio na próxima composição da Câmara dos Deputados. Desde que a burguesia ascendente assumiu o poder político (no século XVII na Inglaterra e no século XVIII na França) sempre foi assim a composição dos Parlamentos, que são um retrato da sociedade e, acima de tudo, da forma de pensar da sociedade.
A maior bancada da Câmara, portanto, será dos “políticos de carreira” (260 políticos profissionais, que assumem a política como profissão). A segunda maior bancada (82 integrantes) é a doParentismo S. A. (filhotismo, familismo etc.). Esse é um fenômeno mundial, mas aqui tudo funciona de forma diferente. Em países como os EUA é o mérito de cada um que prepondera. Aqui é a indicação, a imposição, a escolha pessoal dos chefes dos partidos (é o famoso dedazo, como disse O Globo 9/10/14: 22). Os caciques manobram tudo dentro dos partidos, inclusive as gordas receitas que os financiadores das campanhas proporcionam. Não se estimula a troca dos antigos políticos por novas lideranças. São partidos viciados, que lutam somente pelo poder. Boa parcela dos brasileiros está exausta de tudo isso. A questão é como converter essa insatisfação em medidas concretas.
O desenvolvimento dos países depende de instituições fortes e organizadas (instituições políticas, econômicas, jurídicas e sociais). O Brasil se transformou numa sociedade extremamente complexa (com mais de 200 milhões de pessoas), com instituições fracas e desorganizadas (destacando-se o baixo nível de império da lei). A cada eleição renovam-se as esperanças de mudanças, mas tudo continua igual (“numa sucessão infinita de esperanças e decepções”, como disse Fernando Henrique Cardoso). Precisamente quando as forças sociais e econômicas se tornam variadíssimas e antagônicas é que as instituições deveriam se fortalecer. Em muitos países, no entanto, não é assim que funcionam as coisas. Tudo vai ficando cada vez mais complexo e as instituições vão se tornando cada vez mais impotentes, desconexas e disfuncionais.
Historicamente as instituições se fortalecem na medida em que os desacordos ideológicos, econômicos e sociais se incrementam. No Brasil invertebrado as coisas se passam de forma diferente. Estamos vendo muita desintegração e instituições mergulhadas na corrupção, na apatia, no mandonismo, no filhotismo, no familismo.
Recorde-se que “os atenienses pediram uma constituição a Sólon quando viram a suapolis ameaçada de dissolução porque havia tantos partidos diferentes [agora, 28 ocuparão cadeiras na Câmara] quantas eram as diversidades da região e a disparidade de fortuna entre os ricos e pobres chegou também ao máximo naquele tempo” (Plutarco, em Huntington, A ordem política nas sociedades em mudança, p. 23). Em situações históricas como essas são imprescindíveis instituições vigorosas, altamente desenvolvidas, para manter a organização social em andamento.
Não surgindo instituições fortes, os laços sociais vão se esfarelando, a descrença aumenta, a ira aparece e a indignação pode explodir, levando à extinção do modelo de organização social estabelecido. Não podemos deixar que o bonde chamado Brasil, agora com mais de 200 milhões de pessoas, continue andando sob o império das tendências desintegradoras, separatistas, corporativistas e desagregadoras. Um país sem um projeto comunitário catalisador das esperanças do seu povo tende a viver sobre ruínas, doenças, inflação descontrolada, violência, corrupção, desemprego e enorme sensação de impotência. Com a classe política frágil, sem capacidade para elaborar projetos comuns, estamos caminhando para a “lei do mais forte” (sociedades brutais, como descrevia Hobbes) quando deveríamos ser fortes no império da lei e da sustentável convivência.
P. S. Participe do nosso movimento pelo fim da reeleição e do político profissional. Veja“fimdopoliticoprofissional. Com. Br”. Baixe o formulário e colha assinaturas.

Tiro pela culatra - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR


GAZETA DO POVO- 10/10


Pressa do governo federal para fazer o leilão dos 700 MHz custou caro: a concorrência rendeu bem menos que o esperado


Com o orçamento apertado, incapaz de conseguir um superávit primário minimamente digno do nome, o governo federal insistiu em realizar ainda neste ano o leilão da frequência de 700 MHz para a telefonia 4G. O Tribunal de Contas da União até tentou colocar um freio no processo, mas não foi suficiente para atender o pedido das operadoras, que pretendiam adiar o leilão para o ano que vem: falou mais forte a necessidade de fazer caixa em Brasília – “Estou contando com os R$ 8 bilhões este ano”, tinha dito o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, tempos atrás, dando uma ideia da importância que os 700 MHz tinham para um governo que cada vez mais depende de receitas extraordinárias para fazer o dever de casa.

As operadoras de telefonia têm interesse nos 700 MHz: as antenas dessa frequência têm alcance maior que as de 2,5 GHz (frequência em que o 4G é oferecido hoje no Brasil), reduzindo custos de instalação e manutenção. Além disso, o sinal de 700 MHz funciona melhor em locais fechados que o de 2,5 GHz. Talvez por isso o governo imaginasse que conseguiria leiloar as frequências com o ágio esperado. O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, garantia que as quatro grandes operadoras brasileiras estariam brigando pelos lotes; o presidente da Anatel, João Rezende, dizia em setembro que haveria até estrangeiros interessados no leilão.

Pois a pressa do governo teve resultados opostos às expectativas. O leilão ocorreu no fim de setembro e não foram apenas os estrangeiros que deixaram de lado a oportunidade: a Oi, uma das quatro grandes companhias que já operam no Brasil, também não participou, alegando justamente a possibilidade de que a frequência só estivesse liberada para o 4G a partir de 2019, ou seja, demoraria muito para a companhia reaver os pesados investimentos que teriam de ser feitos. No fim, dos seis lotes – três nacionais e três regionais – colocados em leilão, dois não tiveram interessados. O valor mínimo para cada lote nacional era de R$ 1,947 bilhão e, com três operadoras disputando três faixas, não foi difícil imaginar o resultado. Claro e TIM pagaram exatamente o lance mínimo pelos seus lotes; a Vivo/Telefónica arrematou o seu por R$ 1,948 bilhão. A Algar Telecom pagou apenas R$ 100 mil acima do lance mínimo pelo seu lote regional.

Resultado: o saldo foi de R$ 5,87 bilhões, bem menos que os R$ 8 bilhões esperados. Bom para as teles, que ainda terão de gastar com a “limpeza” da frequência – hoje ela é ocupada por canais de televisão analógica e digital, que terão de ser removidos (no caso dos analógicos) ou mudar de frequência (no caso dos digitais); as operadoras dividirão a conta de cerca de R$ 3,6 bilhões, que também inclui a compensação dos canais analógicos (obrigados a atualizar seu equipamento para entrar na era digital), além da compra de filtros e conversores para beneficiários do Bolsa Família e de antenas para casas onde o sinal sofrer interferência do 4G. No dia 30, Paulo Bernardo até falou em “sucesso”, mas também disse que “do ponto de vista do Tesouro, é negativo que a arrecadação tenha sido menor (...) do ponto de vista do Ministério das Comunicações, não vamos desenvolver o setor como queríamos”.

O acesso cada vez maior aos serviços de telefonia móvel por parte da população exige mais investimentos, e a ocupação da frequência de 700 MHz teria de vir, mais cedo ou mais tarde. Mas o governo não respeitou o timing dos investimentos das operadoras e de um processo complicado como é a migração da televisão analógica para a digital. Se tivesse alguma responsabilidade no campo fiscal, poderia ter trabalhado o tema com a prudência necessária; agora, paga o preço da pressa – e teles, emissoras de televisão e usuários correm o risco de ter de dividir essa fatura.

Era uma vez o Brasil - CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES


VALOR ECONÔMICO - 10/10


Era uma vez um país que finalmente dava continuidade a certo conjunto de políticas macroeconômicas de qualidade e ensaiava os primeiros passos numa agenda mais profunda de incremento da produtividade dos setores privado e público. Esse país, terra da deleitável jabuticaba, 20 anos atrás: controlou a grande inflação com um sistema de taxas fixas de câmbio que tem lá seus problemas, mas é implacável caçador de inflações altas e resistentes; abriu-se para o comércio exterior numa velocidade estonteante (o que não é ideal, mas tenta fazer essas coisas aos poucos para ver se você consegue); privatizou suas ineficientes empresas públicas sugadoras de escassos recursos orçamentários. Começava a normalização do ambiente econômico.

Esse mesmo país, depois de uma crise internacional de amplas proporções nos fins dos anos 1990, que foi sofrida mas forçou mudanças necessárias e para melhor, sofisticou ainda mais seu arcabouço econômico: passou a permitir a livre flutuação da moeda e adotou rigor nas contas públicas e na condução da política monetária, respectivamente, criando a Lei de Responsabilidade Fiscal e copiando o bem-sucedido sistema de metas de inflação, que já havia sido implementado algures. Esse país, enfim, depois dos solavancos da virada do século, parecia pronto para a segunda etapa da agenda do desenvolvimento sustentado - uma agenda de natureza mais microeconômica e institucional. Mesmo com alterações na política. Mudou o comandante, saiu o sociólogo e entrou o companheiro, mas o companheiro sentado finalmente na cadeira mais alta, para surpresa de muitos e felicidade geral da nação, manteve o timão na direção correta. Um sabor de esquerda europeia no ar. Mas, passado o seu tempo, o companheiro tinha que dar a vaga para outra pessoa e aí, de repente, a criatura do próprio companheiro, democraticamente alçada ao posto de comandante-em-chefe, resolveu - como compreender isso? - jogar tudo por terra, dar fragorosos passos atrás, retroceder a décadas remotíssimas, nas quais o andar da carruagem se pautava pela lógica de uma desabrida marcha forçada - e fracassada. Nem o companheiro entendeu, creio eu, mas já era tarde. Era uma vez o Brasil.

Em 2009 houve uma imponente crise vinda lá de fora, dos países centrais, e houve, conseguintemente, uma reação dos líderes nacionais, ávidos por acionar as alavancas à disposição, de modo a conter os efeitos nocivos da irresponsabilidade dos ricos estrangeiros. Era preciso transformar uma tsunami vinda do Norte em marolinha dos calmos mares do Sul. E reduzir juros, superávit primário e aumentar o crédito público, ali, naquele momento, deu certo, até porque o terreno estava melhor preparado para isso, abundante em reservas internacionais, aplainado de dívidas grandes e de tenebrosa indexação. Foi um sucesso, efetivamente. Palmas!

Mas, ó humanos incorrigíveis, o sucesso acendeu a fagulha da húbris, e os deuses começaram a ficar insatisfeitos. Aconselhamentos foram ventilados por gente de bem: era preciso refrear aquele impulso tremendo nas políticas fiscal, monetária e para-fiscal. Aquilo geraria inflação e má alocação de capital entre os setores da economia. Esses apelos ao razoável, porém, encontraram ouvidos moucos, de mercador, de mercadores de eleições mais precisamente. Dionísio, em algum lugar aqui na Terra, mastigava jabuticabas e incitava a farra a continuar: o país empanturrava-se em gastos altos e juros baixos e crédito farto e subsidiado. A turma no poder queria - como é natural, reconheçamos sem hipocrisias - seguir no poder, e para isso era preciso meter o pé na tábua. Mas, claro, quem acelera demais uma hora tem que frear. Fosse só isso...

O problema é que a coisa não ficou só no expansionismo eleitoral. Fosse assim, a natural e típica reversão à sensatez no pós-pleito conteria os danos sobre a economia, a afobação em incentivar a demanda refluiria, as coisas voltariam gradativamente aos eixos. E no primeiro semestre de 2011 parecia efetivamente que essa era a rota. Mas não, tratava-se de ajuste passageiro e a contragosto, pois a nova líder, uma senhora de português faltoso, tinha efetivamente outra visão de mundo, uma visão trópico-jabuticabal sobre o funcionamento da economia, um conjunto de ideias compartilhadas por um número ínfimo de arautos num mundo de não sei quantos milhões de economistas. Então, desde o segundo semestre de 2011, o exotismo na política econômica floresceu com vigor inaudito, como se, a exemplo da jabuticaba, houvesse uma política econômica válida apenas para o "do Oiapoque ao Chuí" presente, ainda que tenha experimentado comprovado fracasso alhures e aqui mesmo em outros tempos.

Consistia nisso, tentando resumir: reduzir forçosamente a taxa de juros para ver no que daria, uma promessa de campanha (que esquecia, claro, da feliz existência de uma relação entre juros na canetada baixos e inflação elevada); aumentar gastos e cortar impostos, atitudes que, em conjunto, desafiam as leis mais elementares da aritmética fiscal (por favor, não tentem reproduzir esse tipo de experimento na sua casa, pode ser muito perigoso); intervir pesadamente na taxa de câmbio sem critério bem definido, sendo uma hora para incentivar a indústria nacional (que, curiosamente, não se sentiu nada incentivada, a julgar pelos dados), outra hora para controlar a inflação galopante; fechar a economia ao comércio internacional e solapar sua eficiência com medidas como a tal "necessidade de conteúdo nacional", que premia a incompetência e onera os competentes; erigir um faraônico sistema de subsídios para os mais ricos - sim, você leu corretamente, para os mais ricos - via crédito barateado para um grupo seleto de empresários carinhosamente apelidados pelos críticos como amigos do rei (da rainha?). E cosi via...

Deu no quê essa tal de nova matriz?

Deu nisso: inflação superior a 6%, ou seja, bem acima da meta estipulada, que é 4,5% para os desavisados; déficits externos grandes, da ordem de há muito não vistos, de 4% do PIB; queda da produtividade e dos investimentos a taxas apavorantes; rebaixamento do crescimento potencial, de cerca de 3,5% para a casa dos magérrimos 1,5%.

Aí vocês podem dizer (e estão desculpados de antemão pela inocência): mas depois de tanta miséria de resultados, eles reconheceram, ainda que a voz baixinha, os erros crassos? Desculpe informar que não, que não reconheceram. E aguente firme, prezado leitor, tenha nervos de aço, pois aviso aos navegantes que há uma chance de tudo isso se repetir, como naquele filme da marmota, por todos os dias dos próximos quatro anos.

7 a 1 diz alguma coisa pra você? A piada de mau gosto entre os economistas é que, na hipótese de continuidade desse conjunto de políticas econômicas é bom se acostumar com a ideia de inflação na casa dos 7% e crescimento na casa do 1%.

O governo, claro, e seus defensores, dizem que não é nada disso. Que a desaceleração tem que ver com uma economia mundial em dificuldades. Mas como pode ser essa a explicação se outras economias emergentes estão indo muito bem, obrigado? Ok, demos um injustificável benefício da dúvida, aceitemos que foi a desaceleração mundial que nos legou esse crescimento médio de menos de 2%. Sendo essa a história, porém, por que, enquanto a inflação lá fora está mais para perto de 2%, a nossa situa-se acima de 6%? Não estamos sofrendo de um mal de desaceleração generalizado? Ué, mas isso implica inflação perto de zero...contudo a nossa é de mais de 6%. Ué mesmo.

Não foi o cenário internacional, meus prezados, foram os erros na política econômica. Era uma vez um país cujo futuro, escorregadio, teimava em não chegar. Era uma vez o Brasil.