quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

CONTO DE NOTÍCIA, PAULO ROSENBAUM As bibliotecas do Tietê


É extremamente importante que as novas gerações saibam mais detalhes do que foi o passado recente do Brasil, antes da redemocratização.  Porque fica patente, a maioria desconhece o que era o Brasil da Inflação de 80% ao mês. Assim como ignoram o que significou os anos de mordaça e censura explícita que vivenciamos durante a repressão nos anos de chumbo.
Aparentemente irrelevantes, são as pequenas particularidades que podem resultar numa percepção crítica e menos simplificada da realidade. Se é inegável que hoje vivemos um período de turbulência , condução equivocada da economia, falta de foco das prioridades do governo federal e um pendor para o centralismo partidário, isso não deve, e não pode, automaticamente, transformar o passado numa época dourada.
As histórias dos presos políticos famosos mais agressivos foi muito bem contada e divulgada e hoje conta com a substantiva ajuda de subsídios federais. Mas e os menos famosos? Aqueles que lutaram anonimamente contra a ditadura — provavelmente os que realmente fizeram a diferença, gente com a mesma fibra daqueles que hoje querem expressar discordância com os rumos do País — experimentaram angústias e perseguições não menos inquietantes.
Cito um caso de experiência pessoal familiar para  ilustrar como um estado policial embrutece eentorpece seus cidadãos. Entre os anos de 1968 e 1972 a repressão estava particularmente interessada nos núcleos intelectuais que se opunham ao regime de exceção. Queriam os líderes, mas também todos que tinham potencial paraoferecer alguma resistência ao regime militar. E um dos parâmetros indiciários do sistema era saber, através de informantes e agentes infiltrados, quem possuía “bibliotecas suspeitas” .
No Index Librorum Proibitorum, versão anticomunista, estavam todos os livros de Karl Marx, e tudo que mencionasse as palavras “materialismo”, “dialética” e “direitos humanos”.  Além de outras raridades do glossário subversivo.
Pois foi numa madrugada que um advogado parente bem relacionado acordou meu pai com a lacônica mensagem “jogue agora sua biblioteca no Tietê”. Meu pai sonolento repetiu a frase, a ver se havia captado a mensagem. E recebeu sua resposta, desta vez duplamente lacônica: “isso mesmo, biblioteca no Tietê, já”. E emendou “todo mundo está fazendo isso”. Sem nenhum requinte os livros foram arrastados até a Kombi da família e transportados até a beira da Marginal, onde todos foram despejados nas águas do rio paulista. Sem um critério preciso e seleção afoita, foram para o leito fluvial de Graciliano Ramos a Aristóteles.
Papel é altamente degradável, mas imaginem quão interessante seria, se, durante alguma obra de dragagem, alguma página mais resistente, com uma gramatura mais densa, tivesse sobrevivido para nos contar qual fim levaram todos os acervos afogados.  Espera-se que nenhuma nova versão de expurgo literário – filosófico- artístico – cultural esteja na pauta dos senhores que tem comichão nas mãos para exercer controle sobre a sociedade. 
Por isso até hoje temos mais é que tremer sempre que ouvirmos a expressão “questão de segurança nacional”. Mesmo com temas diversos e orientações ideológicas distintas, governos autoritários tem a mesmíssima paixão:  fazer submergir as críticas, junto com as liberdades.  

PIB cresce 2,3% em 2013 puxado por agropecuária e investimentos

Economia brasileira voltou a se expandir no 4º trimestre, com alta de 0,7%, acima das projeções dos analistas

27 de fevereiro de 2014 | 9h 00

Economia & Negócios - Atualizado às 10h30
SÃO PAULO - Após recuar 0,5% no terceiro trimestre de 2013, a economia do Brasil voltou a crescer nos últimos três meses do ano passado. A expansão do Produto Interno Bruto (PIB) entre outubro e dezembro foi de 0,7% ante o trimestre imediatamente anterior e de 1,9% na comparação com um ano antes. Com isso, o País fechou 2013 com crescimento de 2,3%, segundo os dados divulgados nesta quinta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Na pesquisa do AE Projeções, serviço da Agência Estado, as estimativas de 52 instituições do mercado apontavam no 4º trimestre de estabilidade a crescimento de 0,55%, com mediana de 0,23%, na série com ajuste sazonal. Já para o PIB fechado de 2013, as expectativas do levantamento iam de expansão de 2,07% a 2,30%, com mediana de 2,20%. 
Pela ótica da oferta, o que puxou a economia brasileira em 2013 foi a agropecuária, com expansão de 7% - a maior da série histórica, iniciada em 1996. Dentre as principais culturas, as que mais se destacaram foram soja (24,3%), cana de açúcar (10%), milho (13%) e trigo (30,4%). Com isso, o setor viu sua participação no PIB sair de 5,3% em 2012 para 5,7% em 2013.
"O destaque foi a soja. Como a área plantada cresceu bem menos que a produção, a gente ainda teve ganho de produtividade. Então isso contribuiu bastante para o aumento do valor adicionado na atividade (agropecuária)", disse Rebeca Palis, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.
A indústria, por outro lado, fechou o ano com avanço de 1,3% e teve a menor participação no PIB desde 2000. A fatia do setor na produção de riquezas caiu de 26% em 2012 para 24,9% em 2013. Já os serviços aumentaram sua influência, saindo de 68,7% em 2012 para 69,4% para 2013, a maior fatia alcançada pela atividade no PIB também pelo menos desde 2000.
Pelo lado da demanda, os investimentos foram o principal destaque. A formação bruta de capital fixo teve alta de 6,3% no ano passado, puxada pelo aumento da produção interna de máquinas e equipamentos. Foi a maior variação positiva desde 2010, quando o crescimento foi de 21,3%. Já o consumo das famílias cresceu 2,3%, o 10º ano consecutivo de expansão. A alta, no entanto, foi a menor desde 2003. Para Rebeca, a inflação mais elevada contribuiu para esse cenário, mas ainda não é possível dizer se é uma tendência para os próximos anos. Por último, a despesa do consumo da administração pública aumentou 1,9%.
No âmbito do setor externo, as importações cresceram mais do que o triplo das exportações. As compras de bens e serviços de outros países tiveram expansão de 8,4% em 2013, contra uma alta de 2,5% das vendas externas. No ano passado, o PIB em valores correntes alcançou R$ 4,84 trilhões, levando a um PIB per capita de R$ 24.065 - alta de 1,4% ante 2012. Apesar do avanço, o valor por habitante representa apenas um quinto da riqueza dos norte-americanos.
Mas se considerado apenas o ritmo de expansão, de 2,3% em 2013, o Brasil perde apenas para China e Coreia do Sul, ficando com o terceiro maior crescimento econômico do mundo. A taxa de poupança do País em 2013 foi de 13,9%, o menor nível desde 2001. Já a taxa de investimento foi de 18,4%, maior do que o patamar verificado em 2012, de 18,2%.
Impostos impulsionam PIB. O crescimento de 0,7% no quarto trimestre foi puxado pela alta de também 0,7% no setor de serviços e pela expansão do volume de impostos no período. "Dá para ver que o volume dos impostos cresceu mais do que o valor adicionado. Então, ele puxou o PIB para cima", disse Rebeca.
No quarto trimestre, o valor adicionado ao PIB cresceu 0,5%. O restante da taxa, portanto, veio dos impostos, segundo a gerente. "O que mais puxou foi o ICMS, que recai muito na parte de energia elétrica e telecomunicações, duas atividades que cresceram acima da média em 2013", disse. "Isso puxou a PIB para cima no quarto trimestre." Na comparação com o mesmo período de 2012, o crescimento de 1,9% também seguiu essa lógica. O valor adicionado ao PIB cresceu 1,7%, enquanto o volume de impostos sobre produtos avançou 3,1%.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Do Valongo ao Deutsche Bank, por Elio Gaspari ( muito bem escrito)


  • O banco alemão e a Siemens fazem pelos brasileiros do século XXI o que fizeram os ingleses do XIX
ELIO GASPARI
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A Portela vai para a avenida cantando o Cais do Valongo. Até 1831 passaram por ele um milhão de escravos, vindos “de Angola, Benin e do Congo”. O tráfico de escravos só foi proibido em 1850, mas anos depois um dos magnatas do Império foi apanhado contrabandeando negros que eram levados para um viveiro na Restinga da Marambaia. No século XXI, o presidente da República passava feriadões nessa propriedade como se ela fosse apenas um ponto aprazível do litoral do Rio.
A Inglaterra aboliu a escravidão em 1833 e inaugurou a primeira rua com luz elétrica em 1878. O avanço tecnológico levou cinco anos para chegar ao Brasil, em Campos. Já o avanço social, a abolição, levou 55 anos. Tendo sido o primeiro país da América do Sul com iluminação elétrica na rua, foi o último a acabar com a escravidão. A pressão veio de fora para dentro.
De fora para dentro vem outro benfazejo progresso social. O Deutsche Bank acaba de aceitar um acordo pelo qual indenizará em US$ 20 milhões a prefeitura de São Paulo por ter sido o conduto pelo qual o ex-prefeito Paulo Maluf expatriou US$ 200 milhões da Viúva. Esse dinheiro foi achado em 2001 pela polícia da Ilha de Jersey, um pequeno território autônomo do Canal da Mancha. (Ganha uma viagem à Coreia do Norte quem achar que operações desse tipo nunca passaram pela banca nacional.)
Some-se a esse ato de contrição a conduta da Siemens ao colaborar com o Ministério Público nas investigações do cartel dos fornecedores de equipamentos para os governos tucanos de São Paulo. Nessa rede operava a francesa Alstom. Trata-se de uma ladroeira denunciada pela primeira vez em 1995, que se arrastava na burocracia nacional, mas ganhou um novo (e letal) alento com a decisão da Siemens.
O Deutsche Bank e a Siemens não foram convertidos à causa da moralidade pelas lições do Papa Francisco. Fizeram o que fizeram porque temeram as leis de seu país e as normas de organizações internacionais. Como ocorreu no século XIX com o tráfico, tornou-se melhor negócio sair dele. Durante as farras da ditadura, o presidente do Deutsche Bank foi um queridinho do Milagre. Já a Siemens fartou-se no ruinoso Acordo Nuclear dos anos 70.
É comum que empresas americanas mobilizem suas embaixadas para sinalizar que estão sendo prejudicadas por transações misteriosas na burocracia nacional. Há alguns anos, uma licitação da Infraero foi posta nos trilhos depois de uma palavrinha da diplomacia americana. Em outros casos, há diretores que acham que podem dançar pela melodia nativa. Assim fez o grupo Brookfield, que opera no mercado de shoppings. Em 2012 uma ex-diretora da empresa denunciou que ela pagara R$ 1,6 milhão em propinas à rede de Hussain Aref Saab, o encarregado da liberação de obras na prefeitura de São Paulo. O doutor amealhara um patrimônio de 106 imóveis. A Brookfield informou que não sabia de “supostos atos de suborno”. Ficaria tudo na mesma, mas entrou no caso a Security Exchange Commission, que vigia o comportamento das empresas americanas. Bingo. Quando a prefeitura detonou a quadrilha dos fiscais, a Brookfield mudou suas regras e confirmou ao Ministério Público um capilé de R$ 4,1 milhões. Podiam ter feito isso em 2012.