O casal de judeus poloneses recém-chegados ao Brasil, Szaja e Chaja Mindla Szajman não sabia nada de português. Os dois foram acordados numa noite de 1940 e obrigados a sair de casa, com a roupa de dormir. Não tinham nem como perguntar o que estava acontecendo: Adhemar de Barros, interventor federal no Estado de São Paulo, tinha decidido que a rua em que os imigrantes moravam, no Bom Retiro, ia dar lugar à "Zona de confinamento das prostitutas". Juntamente com todos os moradores da rua, os pais do hoje empresário Abram Szajman estavam sendo despejados de surpresa, no meio da madrugada.
Recheado de casos como esse, que acabam retomando a história da cidade de São Paulo, o livro Alguns retalhos - Abram Szajman: A Construção De Um Homem e De Seu Legado, escrito pelo jornalista e editorialista do Estado, Jorge J. Okubaro, conta a trajetória do presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), cargo que Szajman ocupa desde 1984.
A carreira do empresário no comércio, como conta a obra que está sendo lançada hoje, às 18h30, na sede da Fecomércio (Rua Dr. Plínio Barreto, 285, Bela Vista), começou bem antes. Aos dez anos de idade, Szajman começou a trabalhar como office-boy na loja de malhas de um tio, que havia migrado para o Brasil anos antes de seus pais. Aos dezoito anos, já era gerente. Quando o tio faleceu, assumiu o negócio e, poucos anos depois, montou sua própria loja.
O grande salto aconteceu nos anos 70. Convidado por um amigo, Szajman decidiu entrar em um ramo que ainda era novidade: o de vale-refeições. Foi quando a VR, mais tarde Grupo VR, nasceu. A empresa cresceu tanto que, em 2008, o empresário vendeu a divisão de vale-refeição e alimentação para a francesa Sodexo por R$ 1,03 bilhão.
Diversificação. Szajman tem no seu histórico a atuação em várias áreas de negócios. Chegou a ter 19% do antigo Mappin. Também foi o segundo maior acionista do Banco Real. Recentemente, com mais de 70 anos, o empresário decidiu se aventurar por um novo ramo: o imobiliário. Em 2010, quando o setor viveu um dos seus melhores momentos, Szajman comprou uma participação na Yuny Incorporadora. Também investiu R$ 60 milhões em um novo produto voltado para o mercado de meio de pagamentos.
SÃO PAULO - Bebês prematuros, aqueles que nascem antes das 38 semanas de gestação, normalmente não conseguem respirar sozinhos. Sofrem de apneia (ausência de respiração), gemem bastante e até podem ficar roxos nos momentos de crise. Por isso, precisam de cuidados especiais o tempo todo. A construção de uma unidade neonatal respiratória no Hospital Acadêmico de Paramaribo, capital do Suriname, contribuiu com a redução de 30% da mortalidade dos prematuros desde 2005. Tudo por causa de aparelhos mais modernos e que facilitam os cuidados com os pulmões dos pequeninos surinameses.
Você não está lendo o texto errado. Foi Clarence Seedorf, a maior contratação da história do Botafogo, que financiou a reforma de R$ 300 mil do hospital por meio de sua fundação Champions for Children, instituição sem fins lucrativos que desenvolve projetos sociais no mundo todo, começando pelo Suriname, terra natal do jogador. O camisa 10 participou da cerimônia de inauguração do setor e visitou o país duas vezes para acompanhar os trabalhos. Logo apoiada pelo governo, a iniciativa acelerou um processo que levaria entre cinco e dez anos de acordo com os profissionais do hospital.
Seedorf é assim: quando o procuramos no campo, está cuidando dos projetos sociais. Quando achamos que está no Brasil, está no Suriname. Ou na Itália. Ou nos Estados Unidos. Tem uma grande ação para cada um dos sete idiomas que fala (português, holandês, francês, inglês, italiano, espanhol e o crioulo).
O berço vem em primeiro lugar. A inscrição "mi sab' dat mi lob Srana" (sei que amo o Suriname) está na entrada da unidade neonatal. Seedorf nasceu em 1975, um ano depois da independência do País, saiu ainda jovem e adotou a cidadania do colonizador, a Holanda. Mesmo assim, transformou em lenda o sobrenome do avô, filho de escravos que, apesar da alforria, carregou o Seedorf do antigo senhor alemão.
Daria para fazer um livro sobre os projetos sociais de Seedorf, mas, por questões de espaço, vai tudo em sete linhas: a Champions for Children possui seis projetos em vários países, entre eles, Camboja, Quênia e Brasil. Em Salvador, o craque investiu 50 mil na construção de um centro de recreação e esportes no bairro de Alagados, um dos mais pobres da Bahia.
Esse comprometimento chegou aos ouvidos de Nelson Mandela. Em 2009, o jogador foi condecorado como membro do "Champions Legacy", grupo que ajuda a manter o legado do líder sul-africano. São só bambambãs, como David Rockefeller e Bill Clinton, que se destacam por esforços filantrópicos no mundo. E Seedorf muda para o inglês.
"Testemunhar a fome que estrangulava a Etiópia na década de 80, quando eu era apenas uma criança, teve um efeito profundo em mim e despertou meu desejo de dar forma ao meu destino", declara em tom solene na apresentação de sua fundação.
AMOR Entre tantas línguas, o coração do craque escolheu a de Camões. Ou melhor, a de Neguinho da Beija-flor. Quando Seedorf e a brasileira Luviana completaram sete anos de casamento, o holandês preparou uma festa surpresa em Milão. Mandou chamar o puxador de samba e pediu que cantasse a preferida da amada: a música Negra Ângela (Hoje eu vi um lindo negro anjo/Anjo negro, lindo anjo/Negra Ângela).
Esse foi um dos pontos altos de uma história de conto de fadas. Os dois se conheceram no início da década de 90, quando Luviana, então passista de Mocidade Independente de Padre Miguel, viajou com a escola para uma temporada de shows na Itália. Ela era de família humilde, moradora do Realengo que ganhava a vida com apresentações como mulata. "Foi o casamento de um príncipe e uma princesa", derrete-se o compositor Jorginho Estrela Negra, uma espécie de cupido e amigo do casal até hoje.
Jorginho conta que Luviana é uma primeira dama com jeito de primeira ministra. Foi ela quem bateu o pé para que o jogador aceitasse a proposta do Botafogo, deixando de lado uma oferta salarial de R$ 1,5 milhão por mês do chinês Guangzhou Evergrande, mesmo time do argentino Darío Conca, além de outras propostas de cair o queixo da Inglaterra, Estados e Unidos e Catar. Seedorf balançou, mas cedeu (no Botafogo, recebe por volta de R$ 700 mil de salário, além de luvas de R$ 1,5 milhão). "Prevaleceu a vontade dela de voltar ao Brasil e vê-lo no seu time do coração".
O desejo de Luviana foi compartilhado por duas mil pessoas, que foram ao aeroporto para recebê-lo em julho, quando assinou contrato de dois anos. E o exército de "seedorfianos" não para de crescer. Em apenas três meses no Botafogo, Seedorf conseguiu resgatar parte do orgulho dos torcedores, que amargam um jejum de 17 anos sem títulos nacionais. Levantamento do departamento de Marketing do clube aponta que o número de sócios-torcedores triplicou, passando de quatro para 12 mil desde que o holandês chegou. "O torcedor reagiu à chegada do Seedorf quase como se fosse um título", compara o diretor de Marketing Marcelo Guimarães.
PROSA E POESIA O holandês não joga só com o nome. Ele fica no meio do caminho entre a prosa europeia (direta, vertical, rumo ao gol) e a poesia latina (a imprevisibilidade do drible). No Campeonato Brasileiro, vem se reinventando como atacante. Jogando mais avançado, marcou sete gols em 14 jogos - faltam três para ele quebrar seu recorde em uma temporada. "Ele é parecido com o Chico Buarque: quietinho, na dele, mas agrada todo mundo", comparou o técnico Oswaldo de Oliveira. "Todos falam que penso e jogo como brasileiro e isso está me ajudando", diz o atleta que passou as férias no Rio nos últimos dez anos.
Seedorf está aqui, mas continua em todo lugar, em sete idiomas. A assessoria de imprensa do Botafogo tem um calhamaço com 40 solicitações de entrevistas, entre elas, da Holanda, Itália e até Austrália. No Suriname, o apresentador de TV Desney Romeo afirma que a audiência do seu programa semanal "Futebol no Brasil", transmitido às segundas-feiras pela emissora ABC, aumentou com a contratação do meia. Como o Suriname ainda tem dificuldades para medir a audiência, o apresentador se baseia na participação ao vivo dos telespectadores para tirar a conclusão. "Na próxima semana, vou sortear uma camisa do Botafogo", orgulha-se.
Essa camisa ainda não é tão comum como a do Milan, Ajax, alguns dos times que Seedorf defendeu. O clube carioca ocupa poucas linhas em sua biografia. Pudera. Esse amor tem apenas três meses, é prematuro e ainda não consegue respirar direito. Precisa de cuidados especiais em uma unidade neonatal. Mas Clarence já está cuidando dos sofridos pulmões dos botafoguenses.
OS NÚMEROS DE SEEDORF 7 IDIOMAS - Clarence Seedorf fala fluentemente holandês, francês, inglês, italiano, espanhol, crioulo e português.
36 ANOS - É a idade do craque do Botafogo, que nasceu um ano depois da independência do Suriname, seu país de origem e ex-colônia holandesa.
R$ 700 MIL - É o salário mesnal do holandês, que recusou o dobro para jogar na China. Estados Unidos, Inglaterra e Catar também fizeram propostas milionárias para contratá-lo.
12 MIL - É o número de sócios-torcedores cadastrados hoje no Botafogo. Antes da chegada do craque holandês, três meses atrás, o número era de apenas 4 mil sócios-torcedores.
10 ANOS - Foi o período que Seedorf jogou no Milan, no qual conquistou duas Copas dos Campeões. Ele também defendeu o Ajax, Sampdoria, Real Madrid e Inter de Milão.
16 ANOS - Eera a idade de Seedorf quando iniciou sua carreira no Ajax, em 1992. Na Holanda, estreou aos 18 anos.
Na semana passada, li um artigo do professor Marco Antonio Villa, que não conheço pessoalmente, mostrando, em última análise, como a era Lula está passando, ou até já passou quase inteiramente, o que talvez venha a ser sublinhado pelos resultados das eleições. Achei-o muito oportuno e necessário, porque mostra algo que muita gente, inclusive os políticos não comprometidos diretamente com o ex-presidente, já está observando há algum tempo, mas ainda não juntou todos os indícios, nem traçou o panorama completo.
O PT que nós conhecíamos, de princípios bem definidos e inabaláveis e de uma postura ética quase santimonial, constituindo uma identidade clara, acabou de desaparecer depois da primeira posse do ex-presidente. Hoje sua identidade é a mesma de qualquer dos outros partidos brasileiros, todos peças da mesma máquina pervertida, sem perfil ideológico ou programático, declamando objetivos vagos e fáceis, tais como "vamos cuidar da população carente", "investiremos em saneamento básico e saúde", "levaremos educação a todos os brasileiros" e outras banalidades genéricas, com as quais todo mundo concorda sem nem pensar. No terreno prático, a luta não é pelo bem público, nem para efetivamente mudar coisa alguma, mas para chegar ao poder pelo poder, não importando se com isso se incorre em traição a ideais antes apregoados com fervor e se celebram acordos interesseiros e indecentes.
A famosa governabilidade levou o PT, capitaneado por seu líder, a alianças, acordos e práticas veementemente condenadas e denunciadas por ele, antes de chegar ao poder. O "todo mundo faz" passou a ser explicação e justificativa para atos ilegítimos, ilegais ou indecorosos. O presidente, à testa de uma votação consagradora, não trouxe consigo a vontade de verdadeiramente realizar as reformas de que todos sabemos que o Brasil precisa - e o PT ostentava saber mais do que ninguém. No entanto, cadê reforma tributária, reforma política, reforma administrativa, cadê as antigas reformas de base, enfim? O ex-presidente não foi levado ao poder por uma revolução, mas num contexto democrático e teria de vencer sérios obstáculos para a consecução dessas reformas. Mas tais obstáculos sempre existem para quem pretende mudanças e, afinal, foi para isso que muitos de seus eleitores votaram nele.
O resultado logo se fez ver. Extinguiu-se a chama inovadora do PT, sobrou o lulismo. Mas que é o lulismo? A que corpo de ideias aderem aqueles que abraçam o lulismo? Que valores prezam, que pretendem para o País, que programa ou filosofia de governo abraçam, que bandeiras desfraldam além do bolsa família (de cujo crescimento em número de beneficiados os governantes petistas se gabam, quando o lógico seria que se envergonhassem, pois esse número devia diminuir e não aumentar, se bolsa família realmente resolvesse alguma coisa) e de outras ações pontuais e quase de improviso? É forçoso concluir que o lulismo não tem conteúdo, não é nada além do permanente empenho em manter o ex-presidente numa posição de poder e influência. O lulismo é Lula, o que ele fizer, o que quiser, o que preferir.
Isso não se sustenta, a não ser num regime totalitário ou de culto à personalidade semirreligioso. No momento em que o ex-presidente não for mais percebido como detentor de uma boa chave para posições de prestígio, seu abandono será crescente, pois nem mesmo implica renegar princípios ou ideais. Ele agora é político de um partido como qualquer outro e, se deixou alguma marca na vida política brasileira, esta terá sido, essencialmente, a tal "visão pragmática", que na verdade consiste em fazer praticamente qualquer negócio para se sustentar no poder e que ele levou a extremos, principalmente considerando as longínquas raízes éticas do PT. Para não falar nas consequências do mensalão, cujo desenrolar ainda pode revelar muitas surpresas.
O lulismo, não o hoje desfigurado petismo, tem reagido, é natural. Os muitos que ainda se beneficiam dele obviamente não querem abdicar do que conquistaram. Mas encontram dificuldades em admitir que sua motivação é essa, fica meio chato. E não vêm obtendo muito êxito em seus esforços, porque apoiar o lulismo significa não apoiar nada, a não ser o próprio Lula e seu projeto pessoal de continuar mandando e, juntamente com seu círculo de acólitos, fazendo o que estiver de acordo com esse projeto. Chegam mesmo à esquisita alegação de que há um golpe em andamento, como se alguém estivesse sugerindo a deposição da presidente Dilma. Que golpe? Um processo legítimo, conduzido dentro dos limites institucionais? Então foi golpe o impeachment de Collor e haverá golpe sempre que um governante for legitimamente cassado? Os alarmes de golpe, parecendo tirados de um jornal de 30 ou 40 anos atrás, são um pseudoargumento patético e até suspeito, mesmo porque o ex-presidente não está ocupando nenhum cargo público.
É triste sair do poder, como se infere da resistência renhida, obstinada e muitas vezes melancólica que seus ocupantes opõem a deixar de exercê-lo. O poder político não é conferido por resultados de pesquisas de popularidade; deve-se, em nosso caso presente, aos resultados de eleições. O lulismo talvez acredite possuir alguma substância, mas os acontecimentos terminarão por evidenciar o oposto dessa presunção voluntarista. Trata-se apenas de um homem - e de um homem cujas prioridades parecem encerrar-se nele mesmo. Mas sua saída de cena não deverá ser levada a cabo com resignação. Ele insistirá e talvez ainda o vejamos perder outra eleição em São Paulo. Não a do Haddad, que aparentemente já perdeu. Mas a dele mesmo, depois que o mundo der mais algumas voltas e ele quiser iniciar uma jornada de volta ao topo, com esse fito candidatando-se à Prefeitura de São Paulo.