segunda-feira, 16 de abril de 2012

EUA esperam pelo Brasil



15 de abril de 2012 | 3h 07
ALBERTO TAMER - O Estado de S.Paulo
A economia chinesa desacelerou para 8,1% no primeiro trimestre, o comércio mundial vai crescer apenas 3,7%, abaixo dos 5,0% do ano passado, um dos piores resultados desde a crise de 2008, e só os Estados Unidos dão sinais ainda de expansão. Mas é um crescimento em grande parte baseado no aumento das exportações, 7,2% este ano, enquanto as importações não devem passar de 3,7%, de acordo com previsões da Organização Mundial do Comércio (OMC). Mesmo assim, são ainda o mercado mais aberto no mundo, com importações anuais da ordem de US$ 1,5 trilhão e um impressionante déficit comercial US$ 744 bilhões nos últimos 12 meses.
Desculpem. Vou cansar. Sim, a coluna pede desculpas por cansar o leitor com mais dados oficiais, mas são imprescindíveis para mostrar como o Brasil ainda não explorou as oportunidades nessa economia que, sozinha, tem um PIB igual ao dos 27 países da União Europeia. Está aberta, e a espera de nós. E não se trata apenas de comércio, mas de investimentos e, como assinalamos na última coluna, de ensino técnico e superior nas universidades americanas.
Parceiro menor. As relações bilaterais deram sinais de leve melhora este ano, mas ainda são marginais. O Brasil exportou no primeiro trimestre o equivalente a US$ 25,9 bilhões para os EUA. Dados do Ministério do Desenvolvimento mostram que entre janeiro e fevereiro, havia 3.218 empresas exportando para o mercado americano, número quase igual ao mesmo período do ano passado e, anualmente, cerca de 8.176 importando dos EUA: um aumento de 500 empresas.
E isso num mercado que, ao contrário do outro parceiro (a China), importa do Brasil 64% de produtos manufaturados e básicos (43% só industriais!) e 21% de semimanufaturados. Não é só petróleo e minério, como revela o site do Ministério do Desenvolvimento, mdic@gov.br, no comércio Brasil-EUA.
Mas eles não atrapalham? A resposta é não. Não só não atrapalham, mas, no governo Dilma, estão fazendo tudo para ajudar. Nos últimos meses, Obama adotou uma série de medidas que favorecem diretamente as exportações brasileiras. A mais simbólica foi a extinção do subsídio e a sobretaxa que incidia nas compras de etanol brasileiro, um tema político delicado para o presidente americano que enfrentou e venceu a forte oposição dos produtores americanos de milho e grãos.
Ao mesmo tempo, ao contrário do que fez com a Argentina, Obama decidiu manter o Brasil no SGP, importante programa que reduz tarifas que incidem sobre exportações brasileiras para o mercado americano. Houve também liberalização da importação de carne suína de Santa Catarina, entre outras medidas. Resta completar a mudança do subsídio ao algodão, determinada pela OMC, ainda dependendo do Congresso, e a liberação total de carne bovina.
Nada a acusar. Como lembra o colega Rolf Kuntz, em seu artigo do dia 12, no caderno de Economia do Estado, "ninguém pode acusar o governo americano de haver criado obstáculo à expansão do comércio bilateral, nem de haver imposto nos últimos anos barreiras importantes aos manufaturados brasileiros... Brasília deu prioridade a entendimentos comerciais com parceiros emergentes e em desenvolvimento". E deu nisso que está aí.
Melhorou, mas é pouco. No primeiro trimestre do ano, as exportações do Brasil para os EUA aumentaram 41%. Estão agora em US$ 6,9 bilhões, o que representa 12,6% das vendas totais. Se o leitor quiser saber se é muito, lembro que somente em fevereiro apenas os Estados Unido importaram US$ 227 bilhões! Dados oficiais do Departamento do Comércio divulgados na quinta-feira. Nada mesmo.
Clinton, pouco a fazer. A secretária de Estado Hillary Clinton chega ao Brasil para visita de dois dias, mas quando muito, vai dizer que seu governo nada mais pode fazer para alterar esse quadro que foi agravado nos desmandos diplomáticos do governo passado. Ela poderá lembrar que os EUA são de longe os maiores investidores no Brasil, representam este ano quase 13% do total. Mas é inútil procurar nos EUA os obstáculos às nossas exportações que permanecem à margem do trilionário mercado americano, aberto e à espera do Brasil. A presidente mostrou decisão de mudar esse cenário. Agora, é ir adiante, com mais essa reunião em Cartagena. Mas o trabalho a fazer está aqui.

Fabricar muitos carros é bom ou ruim para o Brasil?


para o Brasil?

Proporção, que era de quase dez para um há duas décadas, vem caindo rapidamente, e algumas cidades têm índices de países desenvolvidos

15 de abril de 2012 | 3h 05
CANDIDO MALTA CAMPOS FILHO É ARQUITETO, URBANISTA, PROFESSOR DA FAU/USP - O Estado de S.Paulo
Análise: Candido Malta Campos Filho
Onde houver possibilidades de implantação e ampliação viária de modo a atender simultaneamente e sem discriminação automóveis e veículos sobre pneus, especialmente os de transporte coletivo, não há por que não se fabricar carros para essa finalidade de locomoção. Ocorre que, como as estatísticas demonstram, a demanda por veículos tem crescido exponencialmente e a capacidade de oferta viária, de um modo geral, não consegue acompanhá-la. Isso ocorre como uma onda a partir dos grandes centros urbanos para os médios em todo o Brasil. Mesmo Brasília, com seu Plano Piloto projetado para veículos e seu excepcionalmente bem dotado sistema viário, esgotou sua capacidade com o crescimento não previsto das cidades satélites. Com medo de perder apoio político, a maioria dos poderes públicos municipais, estaduais e o federal evita focar com realismo esse problema.
Onde está a solução? Para não se perder a capacidade da indústria automobilística de gerar emprego e renda, devemos manter o estímulo para a fabricação de veículos. E estimular os que têm renda elevada a usar veículos menores para melhor se encaixarem no cada vez mais exíguo espaço viário. Hoje, ao contrário, há uma preferência por carros maiores que chegam a imitar veículos militares de combate. Os veículos para a estrada devem se diferenciar do urbano. Não há saída se não desestimularmos o uso diário do automóvel nas viagens mais frequentes e melhorarmos o transporte coletivo. E essa é a questão que estamos enfrentando. Já há, pelo menos na região macrometropolitana, uma majoritária opinião pública que aceita deixar o carro em casa no cotidiano, mas condiciona essa decisão a uma prévia melhoria do transporte coletivo.
Na Região Metropolitana de São Paulo existe um planejamento, com ano/meta projetado para 20 anos e atualizado a cada cinco anos - o Pitu -, inclusive fazendo-o de modo integrado com o uso do solo, uma novidade no Brasil. É um cálculo da capacidade de suporte do sistema de circulação que coloca limites aos potenciais construtivos legalmente permitidos pelas leis de zoneamento. São José dos Campos também está fazendo esse cálculo para evitar caminhar para o caos urbano paulistano. Obter essa coerência entre o que se permite construir e a capacidade de suporte do sistema de circulação é obviamente uma precondição para se resolver o problema. O setor imobiliário tem resistido a essa limitação. Ao que sabemos, apenas São Paulo e São José dos Campos estão dando esses passos essenciais. Nas cidades em que o rodízio se esgotou, o pedágio urbano se impõe. No caso de São Paulo, uma malha de micro-ônibus poderá fazer o papel de interligação da malha de transporte coletivo sobre trilhos ainda com poucas linhas implantadas, enquanto não se completa a rede pensada para ficar pronta em 20 anos. O dinheiro arrecadado pelo pedágio, segundo simulação que coordenei, é suficiente para fazer em 10 anos o que está planejado para 20 anos.

País tem 1 carro para cada 5 habitantes


Proporção, que era de quase dez para um há duas décadas, vem caindo rapidamente

14 de abril de 2012 | 22h 28
Cleide Silva, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Para cada cinco brasileiros, o País já tem um automóvel, proporção que era quase o dobro há menos de duas décadas. Nos últimos anos, com a melhora da economia, mais pessoas têm acesso ao carro. Várias cidades apresentam índices similares aos de países desenvolvidos, como Alemanha e Estados Unidos, onde a média é de menos de dois habitantes por veículo.
O número de veículos em circulação no País cresce em ritmo muito superior ao da população. Desde 2004, quando a economia se livrou da hiperinflação, a frota aumentou 54,8%, atingindo 34,856 milhões de veículos em 2011. No mesmo período, a população, estimada em 192,3 milhões de pessoas, cresceu 5,7%.
O mais recente estudo do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) mostra que, no ano passado, a frota brasileira cresceu 7% em relação a 2010. Do total, 32,9 milhões são automóveis e comerciais leves, 1,54 milhão são caminhões e 354 mil são ônibus. Incluindo as 11,674 milhões de motocicletas em circulação, a relação passa a 4,1 habitantes por veículo.
Cinco Estados - São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul - abrigam 70% da frota. Só a cidade de São Paulo concentra 22%, cerca de 7,6 milhões de veículos, o que daria 1,47 pessoa por veículo, índice próximo ao dos EUA, de 1,27.
A densidade também é elevada em cidades de menor porte, como Valinhos, a 85 quilômetros de São Paulo. Com 106,9 mil pessoas, tem 78,2 mil veículos, o equivalente a 1,36 habitante por carro. "Saímos de uma relação de 8,4 habitantes por veículo em 2000 para 5,5 agora", constata o conselheiro do Sindipeças responsável pela área de Reposição, Antônio Carlos Bento. Segundo ele, o País caminha para uma relação de 4 habitantes por veículo, o que deve ocorrer até 2014.
Os dados estatísticos levam em conta a divisão do número total da frota pela população em geral, mas, é claro, vários brasileiros têm mais de um carro, e grande parcela não tem nenhum.
O engenheiro Gilto de Souza Santos, de 65 anos, morador de Valinhos, tem quatro carros e três motos. Reconhece que "é exagero", mas ressalta já ter sido colecionador. "Sei que é demais, mas moro sozinho, portanto não são usados ao mesmo tempo."
Santos define como "caótico" o trânsito na cidade. Ele mora em um condomínio no bairro Jardim São Francisco. "Até aos sábados pela manhã é impossível estacionar no centro". Ele conta que enfrenta congestionamento até para sair do condomínio.
Santos nasceu em São Paulo e mudou-se para Valinhos em 1977. Até o ano passado, precisava usar o carro diariamente para ir ao trabalho, na vizinha Hortolândia. "Sempre peguei muito trânsito, principalmente entre 7h e 8h, quando as pessoas estão saindo da cidade e, depois, no fim da tarde, quando todo mundo estava voltando." Hoje, ele trabalha como consultor e a vida está "mais tranquila".
A indústria automobilística vem superando recordes desde 2004, quando vendeu 1,5 milhão de veículos. No ano passado, atingiu 3,6 milhões e este ano projeta vender 4% a 5% mais. Com transporte público ineficiente, mais pessoas saem de casa todos os dias com seus automóveis, o que provoca congestionamentos constantes.
"Nossa preocupação é que o veículo não seja visto como vilão", diz Bento. Para ele, "alguém não está fazendo sua parte", referindo-se à falta de infraestrutura e de transporte público. Para o alemão Stephan Keese, responsável pela área automotiva da Roland Berger no Brasil, a melhora na relação habitante por veículo é sinal de crescimento da economia e da renda da população. O mesmo ocorre em outros países emergentes.
A falta de transporte público é um desafio para a maioria dos Estados, diz Keese. "Não conheço nenhuma pessoa das classes A e B que use metrô ou ônibus, muitos por segurança e muitos pelo conforto", diz ele, que não vê essa situação em países desenvolvidos, com transporte eficiente.
Mais jovem. A frota brasileira também está se rejuvenescendo, embora em ritmo lento. A idade média dos veículos que circulam pelo País é de 8 anos e 8 meses, próxima à das frotas da Alemanha (8 anos e 1 mês) e França (8 anos e 2 meses) e mais nova que a dos EUA (10 a 11 anos).
Em 1995, a idade média da frota brasileira era de 10 anos e 2 meses, caiu para 9 anos e 4 meses e em 2010 chegou aos 8 anos e 8 meses, idade mantida no ano passado. "A redução dos últimos anos não é expressiva porque a frota cresceu muito e a renovação é lenta", diz Bento.
O País tem 1,34 milhão de veículos (3% da frota) com mais de 20 anos de idade. A maior parte (44%) tem até cinco anos. Já 39% dos veículos têm entre 6 e 15 anos e 14%, entre 16 e 20 anos. Em 2006, dos veículos em circulação, 8,9% eram fabricados fora do País. Em 2011, essa participação foi a 12,5%, com 4,3 milhões de carros vindos do exterior, mais da metade da Argentina.
Os números do Sindipeças são diferentes dos divulgados pelo Denatran, normalmente bem superiores pois não levam em conta a "taxa de mortalidade" - veículos que deixam de circular por vários motivos, como acidente com perda total e desmanche. A pesquisa envolve montadoras, órgãos de trânsito e seguradoras. É usada para direcionar a produção de autopeças para o mercado de reposição.
(Colaborou Tatiana Fávaro)