segunda-feira, 2 de maio de 2022

Alvaro Costa e Silva O mais importante é a treta. fsp

 Ao longo do tempo as praias do Rio —espaço de modernidade e prazer, falsamente atrelado a um ideal democrático de convivência entre os cariocas— lançaram uma infinidade de modas e comportamentos que em três meses atingiam o auge e declinavam: a peteca, o jacaré, o maiô de duas peças com calcinha quatro dedos acima do umbigo. A estação preferida deixa marcos da pequena história que se desenhou na areia em meio a barracas, esteiras, mate gelado e biscoito Globo. Quem viveu não esquece as dunas da Gal, a tanga do Gabeira, os verões da lata, do apito, do créu ou do pau de selfie.

Como este ano o Carnaval veio depois da Páscoa e a Copa será em dezembro, nada mais natural que o grande acontecimento do verão tenha ares outonais. O prefeito Eduardo Paes proibiu o uso de caixas de som na praia, e a questão dominou as conversas, sobretudo nas redes.

Movimento na praia de Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, em fevereiro de 2022
Movimento na praia de Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, em fevereiro de 2022 - Eduardo Anizelli - 28.fev2022/ Folhapress

Levantamento feito no Twitter mostrou que 87% dos perfis criticaram o prefeito. O principal argumento apontou a insignificância do decreto para uma cidade com tantos problemas à espera de solução. A medida foi considerada elitista, preconceituosa, racista. Eduardo Paes virou a reencarnação de Jânio Quadros, o ex-presidente que proibiu o biquíni.

Os 13% a favor lembraram que a decisão não ataca apenas pobres, mas também ricos, que da mesma maneira têm o hábito de ouvir sertanejo, funk, pisadinha e pagode em caixas de som de cinco dígitos. Que não se pode impor um gosto musical, em volume ensurdecedor, a todos. Eis o recado dos tuiteiros pelo silêncio: compre um fone de ouvido e ensurdeça sozinho.

Quase ninguém levou em consideração a possibilidade de a lei —que só vale para a faixa de areia, não atinge os quiosques da orla, que têm autorização para fazer shows ao vivo— não pegar ou não haver fiscalização, muito menos a multa de R$ 500. O mais importante era ter uma opinião, e expressá-la em forma de "polêmicas" e "tretas".


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