Existem no mundo mais de cem índices compostos de desenvolvimento. Mas nenhum deles possui a solidez e o reconhecimento do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que recentemente completou 30 anos de existência.
Parte do sucesso histórico desse indicador tem sido sua adaptabilidade dentro de parâmetros que identificam seus propósitos iniciais de expansão de liberdades substantivas das pessoas. Muito já foi mudado no IDH, como na sua revisão de 20 anos, na qual o indicador passou a ser produzido a partir de médias geométricas, substituindo antigas variáveis pelas que são usadas atualmente. Mas, até agora, o IDH não havia honrado uma promessa que nasceu com a sua criação, lá em 1990: a elaboração de um IDH que levasse em conta as pressões planetárias.
De certo modo, a introdução agora do IDH verde, ou o IDH “ajustado pelas pressões planetárias” (PIDH), significa um convite aos países que reorientem seus objetivos e escolhas públicas —não apenas na direção daquelas políticas e estratégias consideradas mais essenciais ao desenvolvimento humano (como de saúde e de educação), mas também em sintonia com um desenvolvimento com baixas emissões de carbono e menos dependente de ciclos materiais. Combina, assim, uma preocupação com a desigualdade intra e intergeracional.
Mas como se calcula o PIDH? Em linhas gerais, o PIDH é o IDH de cada país corrigido pelas pressões planetárias, estimadas como uma média aritmética das emissões de dióxido de carbono per capita e da pegada ecológica das matérias (biomassa, metais, carbono etc.) usadas nos processos produtivos. Como tal, mostra a pressão na biosfera resultante das atividades econômicas, como uso da terra, perda da integridade dos ecossistemas, composição de fontes de energia e até mesmo empobrecimento cultural das sociedades.
Essa inovação deve ser celebrada, pois destaca a inexorável interdependência entre o desenvolvimento humano e a natureza. Mais da metade do PIB mundial, por volta de US$ 44 trilhões, é moderadamente ou fortemente dependente de serviços de ecossistemas. O custo econômico anual dos desastres naturais está chegando a US$ 800 bilhões. Além disso, 44% dos materiais processados são usados para a geração de energia; ou seja, não podem ser reciclados. Existem outros custos, como o de 25 milhões de pessoas em todo o mundo que foram desalojadas em 2019 por causa de desastres naturais. Se considerarmos que quase 50% da humanidade vive com menos de US$ 5,5 por dia e que o comércio ilegal de animais selvagens chega a US$ 19 bilhões por ano, podemos entender como as pressões planetárias podem logo comprometer o crescimento e o desenvolvimento humano das sociedades.
Mas o que dizem os números? O PIDH promove uma reviravolta espetacular no discurso promovido pelo IDH. Alguns países antes considerados “mocinhos” passam para países “vilões”. De fato, das mais de 60 nações classificadas como de desenvolvimento humano muito alto, somente 10 estão na categoria muito alto do PIDH. Por outro lado, para aqueles países com valores do IDH próximos de 0,7 ou abaixo, não há muita diferença entre o IDH e o PIDH. A mensagem é clara: as melhorias obtidas no IDH daqueles países que hoje se encontram na categoria de desenvolvimento humano muito alto foram obtidas com maiores pressões planetárias.
O Brasil, que caiu cinco posições em relação ao último valor do IDH, perde mais 7,2% do valor do seu IDH com o ajuste das pressões planetárias; mas, em comparação com outros países, principalmente aqueles mais desenvolvidos, sobe 10 posições no ranking. Mas isso ainda é pouco quando comparamos com os ajustes necessários em países mais desenvolvidos. Noruega cai 15 posições; Canadá, 40; Estados Unidos, 45; Austrália, 72; e Luxemburgo, 131.
O novo IDH leva a outro patamar a discussão sobre as injustiças climáticas e ambientais, mostrando que, sem levar em considerações as pressões planetárias, temos uma história muito incompleta sobre o desenvolvimento das sociedades.
Nenhum comentário:
Postar um comentário