quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Equação difícil, Delfim FSP

93% do Orçamento é regulado por decisões derivadas da Constituição de 1988

O grande dilema nacional é como chegamos ao Orçamento proposto para 2020, no qual Executivo e Legislativo controlam, juntos, apenas 7% dos gastos totais. Os outros 93% são regulados por decisões tomadas ou derivadas das prescrições dos oniscientes constituintes de 1988, entre os quais, confesso, estive cego. Convencidos de que conheciam o "futuro" (coisa fácil para quem acreditava que "leis governavam a história"), decidiram impor aos futuros governantes o seu caminho para atingi-lo. Indexaram, para todo o sempre, algumas despesas públicas como percentagem da receita total.
Tais "iluminados", produtos do maior estelionato eleitoral que a história pátria conheceu, negavam-se a reconhecer a crítica de alguns "fascistas reacionários" que advertiam que o desconhecido crescimento endógeno das despesas que estavam maquinando poderia conter, em si, um formidável desastre fiscal. O caminho para a desintegração fiscal seria lento, mas incontornável, a não ser que algum mecanismo impedisse o aumento endógeno das despesas.
Não há nenhuma novidade. A solução é trivial: cortar gastos, com o que todos concordam, desde que sejam os do vizinho! Quando perguntaram ao gigante Einstein qual a equação mais difícil que teve de resolver na vida, ele respondeu prontamente: a dos juros compostos! Pois ela é o retrato perfeito do crescimento endógeno...
A atração do canto da sereia do "populismo" gastador só pode ser vencida se cada cidadão aceitar que os limites físicos são finitos e que o aumento do seu "bem-estar" (aumento do PIB com redução das desigualdades) exige uma sofisticada acomodação política que reconheça um fato: o que se "consome" e o que se "poupa" hoje é que determina o "consumo possível" de amanhã. Parecia que, lentamente, as instituições públicas haviam introjetado a mensagem de que não há solução sem a redução do gasto público. Ledo engano.
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Charge em alusão à fala do procurador de Minas Gerais Leonardo Azeredo dos Santos, que ganha R$ 24 mil e reclamou desse 'miserê' - Claudio Mor/Folhapress
Na última semana, o país assistiu, decepcionado, a um vigoroso aumento da insensibilidade do Congresso para reduzir gastos (o abuso em matéria eleitoral); do Judiciário (penduricalhos cada vez mais sofisticados para enganar a sociedade); do "miserê" do Ministério Público e, afinal, do Executivo (o aumento para as Forças Armadas). Uma assustadora avalanche de aumento dos gastos públicos!
É essa a equação que o ministro Guedes terá de enfrentar e resolver com inteligência e equidade. Não seremos uma sociedade civilizada se procurarmos a saída cômoda e fácil para um problema complexo que mexe com o bem-estar de todos.
 
Antonio Delfim Netto
Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.

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