As folhas são suculentas, de um verde vivo, e as flores oscilam entre diversos tons de azul, anil e violeta, com uma pincelada de amarelo no meio. Totalmente flutuante, o aguapé (Eichhornia crassipes) alcança um metro de altura, do topo dos talos, acima d’água, às pontinhas das raízes que se estendem abaixo da superfície. Eventualmente é considerada uma espécie-praga, quando se alastra sem controle, tomando a superfície de reservatórios de hidrelétricas ou de abastecimento. Ou mesmo quando chega a impedir a navegação em corixos e lagos do Pantanal.
Apesar dessa fama, o fato é que o aguapé também ganhou notoriedade como faxineiro das águas, capaz de remover poluentes orgânicos. Em geral, a espécie prolifera de maneira exagerada em águas excessivamente ricas em matéria orgânica. Porém, quando instalada em sistemas controlados de tratamento natural de efluentes, sem químicos, essa planta aquática é um excelente agente de limpeza.
Ocorre que os prosaicos aguapés se provaram aliados das águas cristalinas também quando a fonte de poluição é pesada e os efluentes se encontram contaminados com detergentes, fenóis ou metais pesados(chumbo, cádmio, cromo). E ainda têm outras serventias depois de completar a faxina, transformados em adubo (após a compostagem), ração animal e matéria prima para a indústria de papel e celulose ou para a produção de artesanato.
Em seu mestrado de Engenharia Agrícola na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), Juliana Bortoli Rodrigues Mees comprovou a eficácia do aguapé em remover poluentes orgânicos de efluentes de matadouros e frigoríficos. Além de reduzir a carga de matéria orgânica dissolvida na água e diminuir a turbidez, a planta aquática chegou a absorver 77% dos nutrientes associados à eutrofização, como nitrogênio, nitrogênio amoniacal e fósforo.
A eutrofização, vale lembrar, é um processo de “sufocamento” de um corpo d’água relacionado à poluição orgânica causada por esgotos domésticos, efluentes agroindustriais ou excesso de fertilizantes lavados pelas chuvas. Devido ao acúmulo de nutrientes na água, ocorre a multiplicação repentina de algas, que passam a impedir a penetração dos raios solares. Há, então, uma redução drástica da quantidade de oxigênio dissolvido (anóxia) com a consequente mortandade de microrganismos, invertebrados aquáticos e peixes.
No caso dos efluentes de matadouros e frigoríficos, os efluentes contém resíduos de sangue, carne, gordura e vísceras. A pesquisadora fez medições durante 11 meses em um tanque com aguapés de 870 metros quadrados e depois ainda avaliou quatro tipos de compostagem para saber qual o melhor tratamento para os aguapés retirados do sistema. Além de eficaz, o uso de aguapés também tem custo reduzido em relação aos tratamentos convencionais.
Outros estudos demonstraram o potencial do aguapé para limpar efluentes de laticínios e abatedouros de aves. Em seu mestrado em Ecologia Aquática na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Cátia Viviane Gonçalves ainda atestou a viabilidade de remover o metal pesado cromo dos efluentes da indústria de couro em um período mínimo de 5 dias num tanque com aguapés.
No experimento, a acidez da água foi monitorada diariamente pela pesquisadora. Segundo ela, o pH se manteve entre 6 e 7,2, caracterizando um ambiente ideal para o desenvolvimento da planta aquática, mas inviável para a redução do cromo hexavalente (industrial) para o cromo trivalente (de ocorrência natural). Ou seja: o cromo industrial poluente foi mesmo absorvido e acumulado pelo aguapé e não houve redução por atividade microbiana. A conclusão é condizente com análises de amostras de tecido da planta, onde a concentração de cromo aumentou ao longo do tempo.
Resta dizer que o aguapé se alastra de forma vegetativa, lançando novos talos nos quais crescem raízes e folhas. Assim, uma planta de aguapé pode se duplicar em duas semanas. Em um corpo d’água rico em matéria orgânica, a produtividade média chega a uma tonelada de biomassa por hectare por dia! Essa tonelada de aguapés, se processada em biodigestores, gera 30 metros cúbicos de biogás, passíveis de serem transformados em 300 litros de metanol.
Haja utilidade para um modesto aguapezinho!
Foto: Liana John
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