BRASÍLIA
O presidente Jair Bolsonaro (PSL) disse nesta quinta-feira que o Brasil vai enfrentar problemas pelo que chamou de "irresponsabilidade da imprensa".
Bolsonaro disse isso em meio a entrevista na qual demonstrou irritação diante da repercussão de uma declaração sua, um dia antes, segundo a qual as queimadas poderiam ser ação criminosa de "ongueiros" para chamar a atenção contra o governo.
"O Brasil vai chegar à situação da Venezuela. É isso que a grande parte da grande imprensa brasileira quer. E fica o tempo todo de picuinha, fazendo campanha contra o Brasil. Vocês acham, se o mundo lá fora começar a impor barreiras comerciais nossas, cai o nosso agronegócio, cai a economia", disse.
Ao falar com repórteres, mandou um recado para chefias das redações, dizendo que os editores dos jornais e donos de televisões também terão a vida complicada, como a de todos os brasileiros.
"A imprensa está cometendo um suicídio", disse. "Estamos numa nova era. Assim como acabou no passado o datilógrafo, a imprensa está acabando. Não é só por questão de poder aquisitivo do povo que não está bom. É porque não se acha verdade ali."
Ainda nesta quinta-feira, Bolsonaro afirmou que o jornal Valor Econômico, controlado pelo Grupo Globo, vai fechar.
"O jornal Valor Econômico, que é da Globo, vai fechar. Não devia falar? Não devia falar, mas qual é o problema? Será que eu vou ser um presidente politicamente correto?", disse Bolsonaro durante café da manhã com representantes da Acaert (Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão).
O encontro ocorreu no segundo andar do Palácio do Planalto e o discurso de Bolsonaro foi transmitido em suas redes sociais.
As declarações do presidente foram feitas no contexto da medida provisória, assinada por ele no início do mês, que permite a empresas de capital aberto a publicação de balanços no site da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) ou do DO (Diário Oficial), em vez de em veículos impressos.
Bolsonaro afirmou que existe uma briga com a grande mídia e acusou a imprensa de "deturpar" suas falas.
"Há uma briga também com a mídia tradicional, com a grande mídia, na questão de deturpar. Ontem eu tive saco de ouvir um pouco a GloboNews, falando sobre queimada da Amazônia. Duas senhoras ali que, pelo amor de Deus, só falam abobrinha o tempo todo. Entendem de tudo, tudo. Lula e Dilma não tinham defeito nenhum, zero defeito. É lógico, estava lá dinheirinho na conta [inaudível] do governo", afirmou, sem se referir ao que dizia.
Quando assinou a medida sobre os balanços, Bolsonaro já havia ironizado sobre se o Valor Econômico, especializado na cobertura econômica, sobreviveria.
Durante o encontro nesta quinta, que tinha como plateia empresários de grupos de comunicação, Bolsonaro simulou um diálogo com o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.
"Sabe o que eu posso fazer? Chamo o presidente da Petrobras aqui: vem cá, o, Castello Branco. Você vai mostrar seu balancete este ano no jornal O Globo. 'Mas, presidente, custa 10 milhões entre jornal e comissão'. "Ô, cara, é Globo'. Posso fazer ou não? Vinte páginas de jornais para isso", disse.
No início do mês, Bolsonaro disse considerar "extremamente positivo" o valor que estima como perda de receita dos jornais em razão da medida provisória.
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Inicialmente, ele afirmou que a medida era uma retribuição aos ataques que diz sofrer da imprensa. Dias depois, declarou que estava apenas buscando uma evolução.
O presidente tem dito, sem explicar de onde tirou a informação, que os jornais perderão uma receita de R$ 1,2 bilhão com a medida, publicada no Diário Oficial da União no dia 6 de agosto.
A MP, com força de lei, tem validade de 60 dias e pode ser renovada por mais 60. O texto caduca se em 120 dias não for votado pela Câmara e Senado.
A medida altera vários dispositivos da chamada Lei das S/A (6.404/76). O trecho referente aos balanços de empresas está no artigo 289.
Em nova redação, o trecho destaca que: "As publicações ordenadas por esta lei serão feitas nos sítios eletrônicos da Comissão de Valores Mobiliários e da entidade administradora do mercado em que os valores mobiliários da companhia estiverem admitidas à negociação".
A redação original do artigo afirmava que as publicações seriam feitas também "em jornal de grande circulação editado na localidade em que está situado a sede da companhia".
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já defendeu um acordo com o Senado para um modelo de transição na MP.
Segundo Maia, não é a melhor decisão retirar essa receita dos jornais "da noite para o dia".
"A minha preocupação em relação à MP, que do ponto de vista teórico faz sentido, não haverá no futuro papel-jornal, essa que é a verdade, mas o papel-jornal hoje ainda é um instrumento muito importante da divulgação de informação, da garantia de liberdade de imprensa, da liberdade de expressão, da garantia da nossa democracia", ressaltou.
Em nota, a ANJ (Associação Nacional de Jornais) afirmou repudiar as "equivocadas manifestações do presidente Jair Bolsonaro a respeito da imprensa".
"A ANJ lembra que o presidente sancionou em abril passado uma nova e moderna legislação para a transição digital da publicação de balanços e, menos de quatro meses depois, editou a MP 892, cancelando-a em, como ele mesmo admitiu, ´retribuição´ à cobertura dos jornais", disse a entidade.
"Além de desconhecer que todo o papel de imprensa provém de florestas renováveis, o presidente ignora mais uma vez a relevância da atividade jornalística, sobretudo em uma era em que a desinformação e o sectarismo transbordam de redes sociais e manifestações oficiais", afirmou a ANJ.
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