Houve panelaços contra Jair Bolsonaro em bairros de rico. São lugares onde o presidente ganhou de lavada e Fernando Haddad (PT) perdeu de João Amoedo (Novo) na eleição de 2018.
As panelas cantavam enquanto Bolsonaro aparecia em rede nacional, na sexta-feira (23). Com a catadura feroz de costume, falava como quem dá ordens a um pelotão de fuzilamento, um de seus padrões de eloquência.
No entanto, elogiava as leis ambientais brasileiras e o sucesso relativo do país no Acordo de Paris. Afirmava que o Brasil é um “exemplo de sustentabilidade” e que é preciso ter “serenidade” (!) no debate.
Parecia um discurso que fez em Davos, para inglês ver.
Não sabia do que estava falando, como de hábito. Bolsonaro elogiava décadas de políticas e acordos ambientais, os quais ameaça de morte, criados sob tantos governos, todos “de esquerda”.
O progresso começa com uma lei de 1981, no governo do general João Figueiredo, que criou a Política Nacional do Meio Ambiente e o Conselho Nacional do Meio Ambiente. Passou a ter efeito prático com o Ibama, responsável pela implementação da política do meio ambiente, criado em 1989, sob José Sarney. A lei de crimes ambientais é de 1998, anos FHC. A medição e o controle sistemáticos do desmatamento começaram nos anos Lula.
A citação dos presidentes é ironia. A aprovação e a aplicação das leis ambientais é uma resultante da ação de militantes, de partidos políticos, de funcionários de Estado, de “estudiosos e especialistas” (que Bolsonaro odeia), da diplomacia e, em anos recentes, de parte importante do empresariado rural.
Trata-se de um progresso da sociedade brasileira, por vezes parido à força ou em combates furiosos, até hoje frequentemente assassinos. A gente esquece, mas o país trabalhou muito para tirar sua imagem e suas práticas ambientais da lama tóxica. Um esforço de 30 anos que Bolsonaro queima em meses.
Quem passar um pente estatístico na série de números de queimadas terá grande dificuldade de afirmar que existe uma tendência de alta. Não é o caso do desmatamento. Seja como for, o problema maior até aqui é Bolsonaro, que ataca as instituições de progresso e controle ambiental.
Instituições não são máquinas de aplicação de políticas e leis. Para funcionar, dependem de apoios e incentivos materiais, morais e políticos, além da circulação livre de informação correta. O presidente toca fogo em tudo isso. Assim também ameaça a Polícia Federal, a Receita e a Procuradoria da República.
Jacta-se do poder da sua canetinha, associando o exercício da Presidência ao mandonismo, de modo jeca e ignaro, para piorar. Tivemos ditadores mais espertos.
De resto, cadê as políticas ambientais liberais de seu autoproclamado governo liberal? Há quem não goste, mas são alternativas no universo da razão.
Pode haver mercados de permissões para poluir, de cotas de exploração de recursos naturais ou de áreas de reserva ambiental, que dependem de controle e cadastro, como o rural, adiado sine die. Até o ano passado, o governo estudava a criação de um sistema de preços para emissões de poluentes. Cadê apoio técnico e incentivos de mercado para recuperar pastos e terras exauridos? Para o pequeno produtor? Para “start-ups” rurais, as agritechs?
Há apenas “desejo de matar”, “prendo e arrebento”, temperados por burrice e ignorância administrativa, política e diplomática.
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