terça-feira, 18 de junho de 2024

Alvaro Costa e Silva - Eduardo Paes está minando o bolsonarismo, FSP

 Na lista de 33 deputados coautores do PL Antiaborto por Estupro, cuja urgência Arthur Lira aprovou em votação que durou 23 segundos, consta o nome de Alexandre Ramagem, que sonha em ser prefeito do Rio. Ou ele não esperava a reação negativa da sociedade, que gerou mobilização nas redes e protestos nas ruas, ou está pouco ligando.

Sua candidatura, imposta ao PL por Bolsonaro, não decola. Íntimo do ex-presidente e de seus filhos, ex-chefe da Abin investigado por arapongagem, eleito deputado federal pela primeira vez em 2022, Ramagem –ou Delegado Ramagem, alcunha com a qual pede votos– aposta em "sua essência de direita" para compensar a falta de experiência política e administrativa.

Pena que, sem poderes para intervir na segurança pública, atribuição de governos estaduais, tal essência resume-se em armar a Guarda Municipal, projeto que o atual prefeito e candidato à reeleição, Eduardo Paes, também defende e pode em breve ser aprovado na Câmara Municipal. Não foi a única rasteira que Ramagem levou de seu principal adversário e líder nas pesquisas.

O repórter Italo Nogueira revelou que Paes finaliza negociações para incluir em sua campanha o deputado federal Otoni de Paula, bolsonarista raiz que não conseguiu viabilizar a candidatura pelo MDB. A aliança seria mais um passo para atrair parte do eleitorado evangélico. Mesmo desfeita a ligação dentro da prefeitura com o Republicanos, partido da Igreja Universal, existe um pacto de não agressão com o ex-prefeito Marcelo Crivella.

Outra estratégia para minar o bolsonarismo é investir na zona oeste, a mais populosa da cidade, dominada por grupos paramilitares e onde o capitão e seus aliados estabeleceram um reduto eleitoral quase inexpugnável. Além do terminal Gentileza, que conecta a região ao Centro, e de um parque recém-inaugurado em Realengo, a favela do Aço, em Santa Cruz, está sendo urbanizada.

Vista aérea do terminal Gentileza, em São Cristóvão - Marcelo Piu/Prefeitura do Rio de Janeiro

A taxa das blusinhas incide sobre os mais pobres, Cecília Machado, FSP

 Entre 2019 e 2023, as importações de bens de pequenos valores cresceram de forma expressiva no Brasil, passando de US$ 3 bilhões para US$ 10 bilhões.

Esse crescimento –que também está sendo visto em diversos outros países do mundo– vem sendo favorecido por um processo alfandegário simplificado e pelo benefício de ter o produto enviado diretamente aos consumidores que compram nas plataformas de varejo online. Nessas transações, os pedidos online contornam questões logísticas –como as relacionadas ao armazenamento doméstico– e chegam rapidamente à ponta final, representando economia de custo e de tempo para as pessoas.

Além disso, o acesso às plataformas de ecommerce internacionais expande as possibilidades de consumo da população, trazendo mais variedade de produtos através de um processo desburocratizado de compra que em geral também conta com isenções tarifárias.

Nos Estados Unidos, onde as regras permitem que até US$ 800 em bens sejam importados (por pessoa e por dia) sem impostos ou custos alfandegários, o volume de importações nessa categoria passou de US$ 0,05 bilhões para US$ 50 bilhões entre 2012 e 2023 e hoje corresponde a cerca de 7% dos bens importados e de 18% das vendas do ecommerce.

No Brasil, a isenção de impostos se dá até o limite de US$ 50. Mas isso pode mudar se a recém-aprovada "taxa das blusinhas" –um imposto de 20% sobre as importações de até US$ 50– for sancionada.

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Como se já não fosse suficiente inferir, pelo crescimento das importações de bens de pequenos valores, que as compras nas plataformas de ecommerce internacionais trazem benefícios pela população, um estudo recente mostra que a isenção tributária em importações de pequeno valor é uma política que favorece os mais pobres (Fajgelbaum e Khandelwal, 2024) .

Isso porque a isenção tarifária para bens de pequeno valor gera um ganho nos termos de troca do país importador: isto é, uma mudança nos preços relativos das importações vis-à-vis as exportações.

Empresas exportadoras de outros países que, na ausência de tarifas, teriam fixado preços acima do limite de isenção escolhem baixar seus preços até o limite da isenção para acessar um mercado maior, reduzindo o preço ao consumidor final. É possível, inclusive, que a política de isenção tarifária para importações de pequeno valor possa ser preferida a uma política de livre comércio quando a maior parte das importações se concentra nestes tipos de bens.

Nos Estados Unidos, as famílias de baixa renda são aquelas que mais se beneficiam da importação de bens com isenção tarifária. Cerca de 74% das importações que vão para os CEPs mais pobres se beneficiam dela, comparado a 52% nos CEPs mais ricos.

Além disso, a parcela das importações isentas que vem da China decresce com a renda: elas representam 48% das compras isentas nos CEPs mais pobres e 23% nos CEPs mais ricos. Como as tarifas de importação são muito mais baixas em CEPs mais pobres que em CEPs mais ricos, um eventual fim da isenção faria com que a estrutura tarifária se tornasse mais regressiva, reduzindo o bem-estar da sociedade em US$ 11bilhões/14 bilhões.

A isenção tarifária para bens de pequeno valor é uma prática usual, mas que vem sendo debatida e questionada pelos governos de diversos países em resposta à enorme participação de empresas estrangeiras no comércio varejista doméstico. Mas reformulá-la envolve entender quem de fato se beneficia dessa nova modalidade de comércio, que fornece mais variedade de produtos, a um preço mais baixo, e que chega direto ao consumidor com bastante conveniência.

A evidência para os Estados Unidos mostra que acabar com as isenções tarifárias reduz o bem-estar do consumidor, com efeitos maiores sobre as famílias de baixa renda e sobre os negros.

No Brasil, onde limite de isenção é ainda bem menor, tudo indica que os mais pobres serão os maiores prejudicados pela "taxa das blusinhas".

Homicidas que se dizem pró-vida,FSP

 Um homem invisível e imortal acompanha tudo o que oito bilhões de pessoas estão fazendo, o tempo todo. Ele vê uma menina ser estuprada e engravidada pelo pai, padrasto, padrinho ou por um completo desconhecido, que seja. E julga que a violência cometida contra ela não é tão grave quanto uma intervenção para protegê-la. Afinal, Ele também é homem.

Como mulher e escritora, considero essa história duplamente ultrajante. Me mato de trabalhar para criar narrativas plausíveis. Com o suor deste trabalho, pago impostos para um Estado que deveria ser laico e garantir minha segurança.

Deixemos de lado as ficções e vamos aos fatos. No Brasil, 1% dos estupradores são condenados, segundo artigo do perito criminal federal Hélio Buchmüller. Em 2022, 6 em cada 10 vítimas de estupro no país tinham, no máximo, 13 anos de idade, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Distopia e realidade se fundem com a tramitação na Câmara dos Deputados do projeto de lei 1904/24, que equipara o aborto ao crime de homicídio. O PL submete vítimas de estupro a uma pena mais severa do que a reservada aos estupradores.

Uma representação artística e simplificada de um Tiranossauro Rex, pintado em tons de marrom e bege, destaca-se contra um fundo de pinceladas verdes. O estilo da pintura sugere um toque infantil ou uma expressão de arte moderna, evocando uma sensação de nostalgia e criatividade.
Ilustração de Silvis para coluna de Manuela Cantuária de 17 de junho de 2024 - Silvis/Folhapress

A tentativa de criminalizar mulheres que sofreram violência sexual parte de um grupo de parlamentares religiosos que legisla para aumentar os índices alarmantes de mortalidade por abortos clandestinos. São esses parlamentares que deveriam responder por homicídio.

O principal argumento de quem se posiciona a favor do PL é que o feto não tem culpa. Concordo. Só tem culpa quem tem consciência, o que não é o caso de um feto. Para rebater esse argumento, faço das palavras do comediante George Carlin as minhas. Em meio à profusão de opiniões sobre os corpos femininos, baseadas no discurso deturpado de um patriarca imaginário, vale considerar a opinião de um homem de verdade:

"Se o feto é um ser humano, por que não é contado pelo censo demográfico? Se um feto é um ser humano, por que abortos espontâneos não recebem um funeral? Se um feto é um ser humano, por que as pessoas dizem que 'tem dois filhos e mais um chegando' em vez de dizerem: 'temos três filhos'? As pessoas dizem que a vida começa na concepção. Eu digo que a vida começou há um bilhão de anos e é um processo contínuo".

Isso é ser pró-vida na prática: não aceitar retrocessos e evoluir, junto com ela.