quarta-feira, 22 de maio de 2024

Prefeitura e Grupo Silvio Santos chegam a acordo, e Parque do Bixiga deve sair do papel, FSP

 

SÃO PAULO

A gestão Ricardo Nunes (MDB) e o Grupo Silvio Santos chegaram a um acordo no valor de R$ 64,3 milhões para a venda de um terreno na região central de São Paulo que tem sido objeto de disputa por mais de quatro décadas. Com isso, o Parque Municipal do Rio Bixiga deve sair do papel.

Croqui mostra estudo preliminar para o Parque do Rio Bixiga - Divulgação
Croqui mostra estudo preliminar para o Parque do Rio Bixiga - Divulgação

Em abril, como revelou o Painel, o Grupo, que pretendia construir três prédios de uso comercial e residencial no local, disse à prefeitura que estava disposto a aceitar uma proposta de cerca de R$ 80 milhões pelo terreno.

A prefeitura então encomendou uma análise do terreno, que foi avaliado em R$ 64,3 milhões. A contraproposta foi levada ao grupo empresarial, que aceitou formalmente nesta terça-feira (21).

O empreendimento imobiliário idealizado para o terreno de 11 mil metros quadrados pelo dono do SBT foi barrado na Justiça e em órgãos de preservação do patrimônio sucessivas vezes ao longo dos anos, com o apoio de intelectuais, artistas e políticos.

A construção do parque era um sonho do diretor José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso, fundador do Teatro Oficina, que fica no local. Ele morreu em julho de 2023,

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Na terça, diante da iminência do fechamento do acordo, o prefeito pediu aos vereadores que fosse realizada a primeira votação de projeto que cria o parque. O texto foi aprovado e ainda precisa passar por segunda votação.

Prefeito Ricardo Nunes (MDB) durante entrevista à Folha
Prefeito Ricardo Nunes (MDB) durante entrevista à Folha - Marlene Bergamo-23.set.2023/Folhapress

Aliados de Nunes apontam que, assim que concluído, este será o segundo imbróglio de décadas que o emedebista resolve durante sua gestão, o que deverá ser enfatizado em sua campanha para reeleição.

O primeiro foi o Campo de Marte —em 2022, ele assinou acordo com o então presidente Jair Bolsonaro (PL) em que trocou a dívida da cidade com a União, de R$ 25 bilhões, pela transferência da posse da área na zona norte da capital. A disputa se arrastava por mais de 60 anos.


Mirian Goldenberg - Como dominar os monstros interiores, FSP

 Aos 16 anos comecei a ler Simone de Beauvoir, Schopenhauer, Nietzsche, Spinoza, Sartre, Marco Aurélio, Sêneca, Epicteto e outros filósofos que me ajudaram nos momentos mais difíceis da minha vida. Nunca mais parei: é na filosofia que encontro um pouco de coragem, força e determinação para descobrir a melhor atitude que posso ter para enfrentar os obstáculos, adversidades, crises, tragédias e desafios da vida.

A filosofia é um exercício de introspecção e uma jornada de autoconhecimento e crescimento pessoal; um desafio para mergulhar profundamente na minha própria consciência, enfrentando meus monstros interiores.

No silêncio e quietude da reflexão existencial, reconheço minhas fraquezas, impotências e limitações e busco aceitar o que não posso mudar, coragem para mudar o que posso e sabedoria para distinguir entre o que posso e o que não posso mudar.

Aprendi que há apenas um caminho para a liberdade e a felicidade: parar de me preocupar com tudo aquilo que está além do meu controle, decisão e capacidade e ter a consciência de que não são as pessoas e situações que me afetam e desequilibram, mas as minhas percepções, opiniões, crenças e interpretações equivocadas sobre elas.

No início da pandemia, "Meditações", de Marco Aurélio, junto com "Em Busca de Sentido", de Viktor Frankl, me ajudaram a encontrar significado e propósito naquele momento desesperador: cuidar dos meus amigos nonagenários.

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Foi quando passei a acessar diariamente vídeos de canais do YouTube que ensinam a praticar o estoicismo na nossa própria vida. Recentemente, escutei um vídeo que me fez refletir sobre este momento de tanta tristeza, angústia e impotência: "Dominando os monstros internos".

Ilustração de Mariana Massarani para o livro "Quem Tem Medo de Monstro?", de Ruth Rocha - Reprodução

Uma prova concreta de que estou aprendendo a dominar meus monstros internos é o fato de ter parado de tomar Lexotan. Antes da pandemia, sempre que precisava viajar, dar aulas, palestras, entrevistas, participar de programas de televisão, eu tomava o ansiolítico antes de dormir. Quando meu pai teve câncer no pâncreas, durante os cem dias em que cuidei dele até a sua morte, tomava três Lexotans por dia.

Recebo inúmeros pedidos para participar de programas de rádio e televisão, entrevistas, lives, podcasts, palestras, debates, aulas, conferências, bancas, consultorias etc. Seria humanamente impossível aceitar todas as demandas diárias. A filosofia está me ensinando a "dizer não".

Um dos meus maiores arrependimentos é o de não ter tido a coragem de "dizer não" para uma pessoa de confiança que me convenceu a assinar, sem ler, um documento. Se eu tivesse lido o documento, jamais teria assinado algo que me prejudicou bastante. Todos os dias eu me xingo de burra, estúpida e idiota, pois sei que um simples "não" teria evitado muitos problemas, aborrecimentos e chateações que tenho até hoje.

Quando fico doente, estressada e exausta em função de vampiros emocionais e pessoas tóxicas que sugam a minha energia, paz de espírito e saúde física e psicológica, lembro-me de que só tenho controle sobre meus pensamentos e atitudes e que não tenho o poder de controlar os comportamentos e escolhas dos outros.

Marco Aurélio, em suas "Meditações", ensina a melhor maneira de se vingar das "almas sinistras".

"Dizer para si mesmo, ao amanhecer: ‘Sei que vou encontrar um indiscreto, um ingrato, um grosseiro, um velhaco, um invejoso, um intolerante. Mas esses homens são assim devido à sua ignorância do bem e do mal... Concentra-te na arte que aprendeste e ama-a. Não seja tirano nem escravo de ninguém... Alguém procedeu mal comigo? Isso é com ele. A deliberação é dele, a ação é dele... É impossível que os maus não pratiquem o que está em sua índole... Eis a melhor maneira de se vingar: não se lhes assemelhar."

A coragem de "dizer não" para as "almas sinistras" se tornou um exercício diário. Tenho buscado aproveitar cada dia como se fosse o último, saboreando o presente, sem ficar presa aos traumas do ontem ou às preocupações com o amanhã.

Por isso, todos os dias, assim que acordo, respondo às seguintes perguntas no meu diário: "O que eu faria se não tivesse tanto medo? Como vou gozar o dia de hoje? O que posso fazer de bonito, bom e relevante? Como posso transformar o meu medo em coragem, a minha tristeza em beleza e a minha dor em amor?".


Bruno Boghossian -Declarações de Leite precipitam julgamento que ele tentava adiar, FSP

 Eduardo Leite conhecia o tamanho do desastre gaúcho quando disse que não era hora de "procurar culpados". Naqueles primeiros dias da tragédia, ele tentava deixar em segundo plano um inevitável julgamento da população do estado sobre o desempenho de seus governantes. Semanas depois, o próprio tucano parece ter precipitado esse momento.

O governador vinha concentrando esforços em ações de socorro. Ele se aliou a outras autoridades para organizar uma resposta imediata a uma calamidade com poucos precedentes no país. O ineditismo e o drama talvez tenham dado a Leite a ilusão de uma absolvição sumária.

Declarações recentes sugerem que o governador não está pronto para responder por algumas questões ligadas às causas e aos precedentes da tragédia. Em entrevista à Folha, o tucano admitiu que conhecia estudos que alertavam para os riscos de uma catástrofe, mas advertiu que "o governo também vive de outras pautas e agendas".

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), durante entrevista à Folha - Pedro Ladeira/Folhapress

Considerando que a função de um governador é tomar decisões com base nas melhores informações disponíveis, pode-se dizer que Leite cometeu um erro grave. Primeiro, por exibir hesitação sobre um conjunto de dados alarmantes que haviam chegado a seu gabinete. Depois, por reconhecer que não tratou a prevenção como prioridade.

Leite também teve dificuldades para escapar de um conflito evidente entre decisões de seu governo e críticas feitas por ambientalistas a um pacote de mudanças feitas em sua gestão. Ainda que seja difícil desenhar uma relação inequívoca entre as medidas e as inundações, o tucano recorreu a um péssimo slogan no programa Roda Viva: "Não erramos pelo negacionismo".

O governador demonstra um compreensível desconforto com um aspecto das discussões sobre o desastre. "O que me incomoda muito na política é a polarização, é que antes de procurar soluções, se procuram culpados", disse. Leite tem alguma razão, mas não poderá se escorar nesse argumento por muito tempo.