quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Fotografias raras mostram Palestina antes do nascimento de Israel, FSP

 Ana Marques Maia

PÚBLICO

"Uma terra sem povo para um povo sem uma terra." O slogan foi repetido à exaustão, ao longo do século 20, pelo movimento sionista e pelos apoiadores do sionismo para mobilizar a imigração judaica à Palestina. As fotografias do arquivo do Library of Congress Eric and Edith Matson, tiradas entre 1898 e 1946 e fornecidas ao Público pelo Palestine Photo Project, contam, no entanto, uma história diferente.

A Palestina era, nos séculos 19 e 20, antes do nascimento do Estado de Israel, em 1948, um território habitado por centenas de milhares de pessoas e vivia, segundo a Enciclopédia Britannica, "um renascimento árabe".

Rua em Jerusalém entre 1911 e 1917
Rua em Jerusalém entre 1911 e 1917 - Matson Photograph Collection/Library of Congress via Palestine Photo Project

A localização da Palestina a tornava num local estratégico do ponto de vista comercial. A partir dos portos de Gaza e Jafa, importações e exportações decorriam com países dos continentes africano, europeu e asiático. Havia também ligações ferroviárias com outras zonas do Império Otomano. As imagens que compõem a galeria mostram o cotidiano da Palestina dessa época e levantam o véu sobre a história que está por detrás do nascimento do Estado de Israel.

Entre 1516 e 1917, o território da Palestina integrou o Império Otomano, que, durante a Primeira Guerra Mundial, entre 1914 e 1918, se alinhou às potências centrais, o eixo que saiu derrotado do conflito.

Na sequência da vitória, dois dos países dos Aliados, França e Reino Unido, com a concordância da Rússia, assinaram um acordo secreto, em 1916, intitulado Sykes-Picot, que determinava que parte do território do Império Otomano, que seria desmembrado no pós-guerra, ficaria sob a administração francesa e britânica.

Nesse acordo, foi determinado que a Palestina, devido à presença de locais sagrados para cristãos, muçulmanos e judeus, deveria ser governada por um regime internacional. As administrações dos territórios "conquistados" pelos Aliados souberam das resoluções do acordo na ocasião de sua publicação, sem que tivessem tido a oportunidade de se pronunciar favorável ou desfavoravelmente.

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Em 1917, o Reino Unido decidiu violar o acordo Sykes-Picot e, unilateralmente, através da Declaração de Balfour, determinar que o território da Palestina deveria ficar sob o seu comando e tornar-se "o Lar Nacional para o Povo Judeu", prometendo empregar "os seus melhores esforços no sentido de facilitar a realização deste fim".

Mais uma vez, a população não foi consultada ou chegou a qualquer acordo com o Reino Unido. A Declaração de Balfour estipulava, especificamente, "que nada seria feito que pudesse prejudicar os direitos civis ou religiosos das comunidades não-judaicas pré-existentes na Palestina", embora não se referisse a essas comunidades pelo nome ou aludisse aos direitos políticos ou nacionais das mesmas.

Assim, o Reino Unido tomou as rédeas do poder na Palestina, no pós-guerra, assumindo o papel de facilitador da imigração da comunidade judaica para a região, como havia prometido. Antes da chegada dos britânicos, a esmagadora maioria da população era árabe, mas já existia uma comunidade de judeus na Palestina, ainda que expressivamente minoritária, correspondendo, dependendo das fontes, entre 5% e 8% da população.

Algumas estimativas apontam para cerca de 50 mil judeus vivendo na Palestina em 1918, cerca de 10% de uma população composta por 500 mil árabes, de acordo com o site das Nações Unidas. Mas a partir da vigência do controle britânico, a imigração judaica se intensificou. Em paralelo, em 1920, a Liga das Nações tornou oficial o governo britânico da Palestina e, no mesmo ano, os britânicos tornaram o hebraico numa das línguas oficiais da região.

Na década de 1930, o número de judeus a chegar à Palestina aumentou significativamente –fenômeno intensificado pela perseguição e extermínio sistemático dos judeus na Europa central, nomeadamente com a chegada de Hitler ao poder da Alemanha, em 1933.

Apenas no ano de 1935 chegaram à Palestina cerca de 62 mil judeus. Nos dois anos anteriores, tinham chegado um total de 72 mil. Em 1937, de acordo com as Nações Unidas, a população judaica era de 400 mil e dez anos depois atingiu os 625 mil. Segundo a Britannica, havia, em 1946, na Palestina, 1,2 milhão de árabes e 678 mil judeus. Eram apenas 50 mil os judeus morando na Palestina em 1918 – o que corresponde a um crescimento de 1350% da população judaica num período de cerca de 25 anos. À medida que chegavam, os imigrantes judeus foram construindo novos centros urbanos na Palestina.

A resistência à chegada de mais imigrantes judeus intensificou-se, nesse período, entre a população árabe da Palestina, e em 1933 tornaram-se frequentes as manifestações em oposição à imigração e que pediam o fim do mandato britânico. As autoridades reprimiam essas manifestações violentamente.

Num dos protestos, no ano de 1935, em Jaffa, o então presidente do município de Jerusalém Musa Qassem al-Husseini, então com 83 anos, foi espancado pelas autoridades britânicas e acabou por morrer na sequência dos ferimentos, o que gerou ainda maior revolta entre a população árabe.

Essa indignação viria a dar origem à Revolta Árabe, em 1936, uma série de manifestações e greves que desembocaram em fortes ofensivas árabes e repressão britânica. Entre 1936 e 1939, a Palestina esteve em guerra civil. A Britannica refere que, na sequência desta revolta, "pela primeira vez, um órgão oficial britânico falou abertamente sobre a formação de um estado judaico".

Os britânicos estabeleceram, desde o início do seu mandato, limitações para a imigração de população judaica à Palestina, temendo que a situação se tornasse incontrolável devido à forte resistência árabe. Mesmo após a tomada de poder de Adolf Hitler, na Alemanha, a administração britânica manteve essa política, conduzindo à revolta das comunidades judaicas e dos seus braços paramilitares Haganah e Irgun contra o governo.

"O Haganah resistiu atacar os britânicos enquanto combatia contra a Alemanha nazi. Mas os seus guerrilheiros uniram-se ao Irgun e levaram a cabo vários ataques contra os britânicos", diz trecho de texto no site do National Army Museum do Reino Unido. Em 22 de julho de 1946, o Irgun fez explodir parte do hotel King David, em Jerusalém, uma das sedes da administração britânica na Palestina, matando mais de 90 pessoas e ferindo mais de 40.

Em meados de 1940, tanto árabes como judeus se opunham, por diferentes razões, ao mandato britânico na Palestina. "Sionistas pressionavam para aumentar a imigração e levavam a cabo ataques ao governo e os estados árabes mobilizaram-se em resposta", contextualiza a Britannica.

"A Segunda Guerra Mundial tinha tornado o Reino Unido vitorioso, mas exausto. A resolução britânica de permanecer no Médio Oriente entrava em colapso." Em 1947, o presidente norte-americano Harry S. Truman declarou, contra o interesse britânico, o seu apoio à ideia da criação de Israel; no ano seguinte, a "solução de dois estados" seria levada a votação na recém-criada Organização das Nações Unidas.

Em 1948, o Reino Unido abandonava a Palestina. No mesmo ano, as Nações Unidas partiam o território em dois e nascia Israel. Os palestinianos opuseram-se ao acordo que foi, novamente, unilateral.

A resistência árabe ao novo Estado israelita, em 1948, deu origem a um conflito armado e ao "deslocamento e expropriação em massa" dos palestinianos –entre 600 e 700 mil pessoas foram forçadas, sob ameaça de violência israelita, a abandonar as suas aldeias e as suas casas e a encontrar refúgio na Cisjordânia, na Faixa de Gaza ou em países vizinhos.

O site My Jewish Learning refere que nos três anos e meio que se seguiram à fundação de Israel, 688 mil pessoas imigraram para a região, uma média de 230 mil por ano, "o que se traduziu numa duplicação da população".

A Jewish Virtual Library escreve que, em Setembro de 2023, a população de Israel é de 9,8 milhões de pessoas (sendo que nem toda é judaica), dez vezes mais do que aquelas que existiam em 1948, aquando da formação do país.

Em 2022, o jornal israelense Haaretz dava conta que existem, no mundo, 15,2 milhões de judeus e que 6,9 milhões vivem em Israel. Presentemente, Israel ocupa, à revelia da lei internacional, que lhe destinou 55% do território em 1947, mais de 20 mil quilômetros quadrados de terra (76% do território); aos palestinianos cabe residir numa área de 6 mil quilômetros quadrados (24%), em Gaza e na Cisjordânia.

Mais de 70 anos depois, Israel continua a não permitir que os refugiados regressem às suas terras, às suas casas, violando o que a ONU considera ser um direito humano fundamental. Em consequência, mais de cinco milhões de palestinianos vivem, atualmente, dispersos por vários países do Médio Oriente e do mundo.

Em Israel nos dias de hoje, "os palestinianos continuam a ser expropriados e deslocados pelos colonatos israelitas, por despejos, confisco de terras e demolições", escreve a ONU. A Palestina é, hoje, um "estado observador" não reconhecido pela maioria dos países do Ocidente.

ESTADÃO / INTERNACIONAL EUA vetam resolução do Brasil sobre guerra entre Israel e Hamas no Conselho de Segurança da ONU

 


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Os Estados Unidos vetaram, de forma isolada, nesta quarta-feira dia 18 uma proposta de resolução patrocinada pelo Brasil sobre a guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas, no Conselho de Segurança das Nações Unidas. O projeto previa pausas humanitárias no confronto e condenação dos ataques terroristas. Segundo a diplomacia dos EUA, o veto se deve à ausência de menção ao direito de autodefesa de Israel, apoiado por Washington.

Os Estados Unidos têm poder de veto por ser um dos membros permanentes do Conselho, ao lado de RússiaChinaReino Unido e França.

“Os EUA estão desapontados que a resolução não cita o direito de autodefesa de Israel. Não podemos apoiar o avanço dessa resolução, mas continuaremos a trabalhar com os membros do conselho”, disse a embaixadora Linda Thomas Greenfield. “Estamos no terreno fazendo o trabalho duro da diplomacia.”

A embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, votou contra a resolução do Brasil para o conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU, em Nova York
A embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, votou contra a resolução do Brasil para o conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU, em Nova York  Foto: Mike Segar/Reuters

“Ao passo que reconhecermos o desejo do Brasil de aprovar esse texto, acreditamos que precisamos deixar essa diplomacia acontecer, especialmente quando o secretário-geral António Guterres, o presidente Joe Biden e o secretário de Estado Antony Blinken e atores regionais estão envolvidos em intenso diálogo sobre várias questões que estamos deliberando hoje. Sim, resoluções são importantes e este Conselho devem se pronunciar, mas nossas ações que tomamos devem ser baseadas em informações do terreno e apoiar ações e esforços diplomáticos que salvam vidas”, completou a embaixadora americana na ONU.

Resolução

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A resolução teve 12 votos a favor, 1 veto e 2 abstenções - de Rússia e Reino Unido. Dos membros permanentes, China e França votaram a favor do projeto brasileiro, como haviam indicado na véspera.

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A resolução obteve o mínimo de 9 votos para aprovação, mas acabou barrada pelo veto dos EUA, um membro permanente do Conselho de Segurança. Para ser aprovada, uma resolução exige a aprovação de 9 dos 15 membros do órgão, e nenhum veto dos cinco com assento permanente –EUA, China, Rússia, França e Reino Unido.

Desde 2016 o conselho não emite uma resolução sobre o Oriente Médio, situação que coloca mais pressão sobre o órgão, criticado pela ineficiência em relação à Guerra da Ucrânia.

O embaixador do Brasil na ONU, Sergio Franca Danese, discursa na reunião do Conselho de Segurança da ONU, em Nova York, Estados Unidos
O embaixador do Brasil na ONU, Sergio Franca Danese, discursa na reunião do Conselho de Segurança da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Mike Segar/Reuters

A Rússia criticou a proposta brasileira, e propôs duas emendas. Uma para incluir uma condenação a ataques a civis na Faixa de Gaza, citando o ataque ao hospital, e a segunda, para falar em cessar-fogo humanitário, em vez de uma pausa humanitária. A primeira parte teve 6 votos a favor, 1 contra e 8 abstenções, sendo derrotada. A segunda parte também fracassou, após novo veto dos EUA —o placar total foi de 7 a favor, 1 contra e 7 abstenções.

A escalada de violência, que chegou ao 12º dia, já soma mais de 4.000 mortos, sendo 3.000 palestinos e 1.400 israelenses. A maioria é civil.

Stellantis anuncia produção de carros híbridos a etanol em Pernambuco a partir de 2024, FSP

 Patrícia Vilas Boas

REUTERS

A Stellantis anunciou nesta terça-feira (17) que planeja alocar em 2024 parte da sua produção no polo automotivo de Goiana, no estado de Pernambuco, para fabricação de veículos com tecnologia "bio-hybrid", isto é, híbridos movidos a etanol.

"As novas tecnologias híbridas estarão disponíveis já a partir do próximo ano", disse a montadora em comunicado.

Segundo a Stellantis, a produção a partir do próximo ano também incluirá os veículos 100% elétricos a bateria desenvolvidos pela empresa no Brasil.

Stellantis faz em 2022 sete anos de operações no Polo Automotivo de Pernambuco e 350 mil unidades produzidas do Jeep Compass
Stellantis fez em 2022 sete anos de operações no Polo Automotivo de Pernambuco e 350 mil unidades produzidas do Jeep Compass - Divulgação

A iniciativa, segundo a montadora, faz parte de sua estratégia global de descarbonização da mobilidade, que prevê descarbonização total das operações e produtos da empresa até 2038, e redução de 50% das emissões de CO2 até 2030.

"Nossa prioridade é descarbonizar a mobilidade, e queremos fazer isto de modo acessível para o maior número de consumidores, desenvolvendo tecnologias e componentes no Brasil", disse o presidente da Stellantis para a América do Sul, Antonio Filosa, em nota.

A Stellantis prevê aumentar o número de fornecedores de componentes e sistemas no entorno da fábrica de Goiana, de 38 para 50, no curto prazo.

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"Ao longo dos próximos anos, no horizonte do desenvolvimento da nova família de veículos híbridos e elétricos, a cadeia de valor deverá contar com 100 fornecedores instalados em Pernambuco", acrescentou a Stellantis, que pretende avançar com a tecnologia de propulsão híbrida, que combina motores térmicos com eletrificação, em outros dois polos automotivos: Betim (MG) e Porto Real (RJ).