segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

PSOL já formou maioria para não compor governo Lula, diz Sâmia, FSP

 O PSOL decidirá, no próximo dia 17, se irá compor o governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou se será independente da gestão petista. De acordo com a líder da sigla na Câmara dos Deputados, a deputada federal Sâmia Bomfim (SP), a segunda opção já reúne maioria dentro do partido e pode vir a prevalecer.

Se a previsão da parlamentar se confirmar, o PSOL optará por abrir mão de cargos no governo federal. "A gente quer ter liberdade para se posicionar como o PSOL sempre se posicionou, como a ala à esquerda no Congresso Nacional, e vocalizar pautas que a gente sabe que ninguém vai pautar", diz Sâmia à coluna.

A deputada Sâmia Bomfim participa, com seu filho, de ato em homenagem ao petista Marcelo de Arruda, em São Paulo - Zanone Fraissat - 17.jul.2022/Folhapress

"Temas relativos a direitos humanos, por exemplo, é muito comum que não sejam pautados em função de acordos feitos com fundamentalistas, com setores mais conservadores. A gente quer manter a independência para seguir pautando. Essa é a nossa vocação no Parlamento", continua.

A decisão será tomada durante reunião do Diretório Nacional do partido. A defesa pela independência deve encontrar resistência entre dois nomes proeminentes da legenda: seu presidente, Juliano Medeiros, e o deputado federal eleito Guilherme Boulos (SP), que hoje integram a equipe de transição de Lula.

A deputada reconhece que não há unanimidade em torno do posicionamento defendido por ela e por outros correligionários. "Mas eu afirmo que é maioria", diz.

Entre parlamentares que apoiam a proposta estão os deputados federais Talíria Petrone (RJ), Glauber Braga (RJ) e Fernanda Melchionna (RS) e a vereadora e deputada federal eleita Erika Hilton (SP), segundo Sâmia Bomfim.

A líder do PSOL na Câmara diz que o apoio dado a Lula durante a disputa eleitoral não deve ser confundido com a postura que será adotada pelo partido nos próximos quatro anos. E nega que haja uma pretensão de atrapalhar a gestão do petista ou até mesmo de se alinhar à oposição, que passará a ser integrada também por bolsonaristas na próxima legislatura.

"A gente vai estar na linha de frente para garantir que o programa do Lula possa ser aplicado no Brasil", diz a deputada. "Mas a gente sabe que, pela própria composição [com outros partidos] que foi necessária ser feita, em especial no segundo turno, podem ter muitos temas com os quais a gente discorda."

A agenda econômica seria um deles. "O PT vai, muito provavelmente, buscar uma saída mediada com as pressões do mercado, como está buscando agora", afirma Sâmia, citando o debate sobre o teto de gastos como exemplo.

Ela defende que manter a independência em relação ao governo eleito seria também uma forma de preservar a identidade e o perfil programático do PSOL. "O governo te impõe amarras, inevitavelmente", diz.

A deputada pontua que a escolha por não compor com o governo não se assemelha ao que ocorreu no início dos anos 2000, quando o PSOL nasceu a partir de uma ruptura do PT e fez oposição declarada ao partido da situação.

"Agora a discussão não é sobre ser oposição ou não, mas sobre não depender de cargos no governo para definir qual é a nossa posição política sobre diversos temas", destaca.

"A estrutura de governo é muito sedutora. Não é um aspecto moral ou individual, mas ela molda a posição, ela molda a ideologia partidária. A gente acha que se o PSOL se enveredar por esse caminho agora, pode perder um pouco da sua função, da sua existência", acrescenta.

Ela cita como exemplo de independência o posicionamento recente do partido em relação ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Na última semana, a bancada do PSOL decidiu por não apoiá-lo em seu projeto de reeleição, diferentemente do que fará o PT de Lula.

Estuda-se, inclusive, a construção de uma candidatura própria do PSOL para fazer oposição ao deputado alagoano —ainda que dificilmente ela possa sair vitoriosa.

"Eu questiono os hiperpoderes que o Arthur Lira vai ter na próxima legislatura. Não se propõe nenhum nome alternativo para disputar? Vai ser o voto da extrema direita, do centrão e da esquerda no Arthur Lira? Ele pode ter, então, 500 votos? Isso é positivo para o governo Lula?", diz Sâmia.

"Não ter disputa democrática em torno de um tema tão fundamental que é a presidência da Câmara não é bom para o governo Lula. É legítimo, eu entendo e respeito, mas não dá para contar com que o PSOL seja parte disso."

Reeleita no pleito deste ano, Sâmia Bomfim deixará a liderança do PSOL na Câmara em 1º de fevereiro de 2023, quando a nova bancada tomará posse. Ela se diz orgulhosa de sua gestão, principalmente pelo peso simbólico e político de assumir um cargo como esse enquanto mulher.

"É difícil, não vou romantizar, mas consegui falar de igual para igual, se impor, ser ouvida e se posicionar", afirma. "Eu fui a líder mais jovem da legislatura, e da bancada também. Em muitos momentos, éramos apenas eu e a Joenia [Wapichana, deputada por Roraima] de mulheres em reuniões com muita gente, com Lira, com o centrão, então foi muito desafiador", segue.

Se ela arrisca um palpite sobre quem a sucederá no posto? "Eu chutaria que vai ser o Boulos, pelo peso dele mesmo. Entrou com tudo aqui na Câmara. Só não vai ser se ele não quiser", afirma, rindo. O coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) foi o campeão de votos em São Paulo, somando 1.001.453 deles.

Sâmia também diz se orgulhar por encabeçar uma bancada que serviu de vitrine para a militância psolista e para outros postulantes de seu partido durante as eleições de 2022.

"O PSOL foi muito bem. Ampliou a sua bancada, cresceu em referência, soube apoiar o Lula, mas sempre mostrando a sua cara própria. E eu acho que a nossa liderança foi parte importante disso. A sensação é de dever cumprido. De que eu fiz o que era possível e impossível."

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Cúpula da PF corre para ocupar cargos no exterior ainda sob caneta de Bolsonaro, FSP

 Marcelo Rocha

BRASÍLIA

Com a derrota de Jair Bolsonaro (PL) na eleição, o comando da Polícia Federal deu início a uma espécie de transição antecipada e está definindo o destino dos dirigentes após o fim do governo.

Parte da cúpula da PF deve ocupar cargos no exterior. As indicações já estão tramitando internamente.

Para alguns tipos de oficialatos, o processo de indicação é mais simples, bastando a decisão interna do órgão, porque o acordo se dá com a polícia do país destinatário.

No caso das adidâncias, no entanto, como se trata de um agregado à estrutura diplomática, necessita de autorização da cúpula do governo, como Ministério da Justiça e Presidência da República.

Além da direção da PF, assessores do ministro Anderson Torres, da Justiça, também se movimentam por postos fora do Brasil.

O presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto
O presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 30.mai.2019/Folhapress

Algumas das indicações são para cargos que só vão vagar no semestre que vem ou no final de 2023.
O diretor-geral da Polícia Federal, Márcio Nunes de Oliveira, por exemplo, deve ir para a Espanha.

O delegado Caio Rodrigo Pellim, diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado, foi escolhido para atuar junto ao Departamento contra o Crime Organizado Transnacional da OEA (Organização dos Estados Americanos), em Washington, nos Estados Unidos.

Também foi publicada no Diário Oficial da União a designação da chefe de gabinete do diretor-geral da PF, a delegada Maria Amanda Mendina de Souza, para a função de oficial de ligação junto à Europol em Haia, na Holanda, pelo prazo de dois anos.

A delegada Mariana Paranhos Calderon, da Diretoria de Gestão de Pessoal, e o delegado Alessandro Moretti, da Diretoria de Inteligência Policial, devem ser os escolhidos para as representações brasileiras no Uruguai e na França, respectivamente.

Foi solicitada ainda a criação de dois postos em Boston, nos EUA, para abrigar auxiliares do atual titular da pasta da Justiça. As vagas devem ser destinadas aos delegados Marcos Paulo Cardoso Coelho da Silva, chefe de gabinete de Torres, e Alfredo Carrijo, da Secretaria de Operações Integradas do ministério.

Folha enviou perguntas à PF e ao Ministério da Justiça na sexta-feira (2), mas não houve resposta até a conclusão desta reportagem.

O diretor-geral da PF, Márcio Nunes de Oliveira
O diretor-geral da PF, Márcio Nunes de Oliveira - Tomaz Silva/Agência Brasil

Os policiais federais designados para missões nas representações brasileiras no exterior têm direito a uma indenização, sobre a qual não incide o abate-teto (desconto ao que excede os salários do ministros do Supremo Tribunal Federal, no valor atual de R$ 39,3 mil).

Além disso, têm direito a acompanhamento de dependentes, com passagens custeadas pelos cofres públicos, além do transporte de mobiliário e bagagens.

Uma vaga fora do país garante aos ocupantes de cargos de direção da PF uma temporada distante da corporação no momento em que grupo político sucede outro no comando do país, o que vai acontecer em poucas semanas com a troca de Bolsonaro pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O posto pode também abrigar servidores submetidos a desgastes na corporação, caso ocorrido com o delegado Fernando Segovia, diretor-geral da PF no governo de Michel Temer (MDB).

Numa entrevista à Reuters em 2018, o policial afirmou que eram frágeis os indícios coletados pela PF sobre a suspeita de pagamento de propina a Temer em troca de favorecer empresas na prorrogação de concessões nos portos.

As declarações repercutiram e, desgastado, Segovia deixou o comando da corporação. Temer o nomeou para um posto na Itália. No final de 2021, ele retornou ao país.

Dois outros ocupantes do cargo de diretor-geral do período de Bolsonaro também foram para fora após deixarem suas cadeiras. Maurício Valeixo, escolhido na época de Sergio Moro, e Rolando de Souza, do período de André Mendonça, foram para Washington.

Luiz Flávio Zampronha, ex-diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado na gestão anterior à atual da PF, foi para Haia atuar como oficial de ligação quando a gestão terminou.

As indicações, por em alguns casos depender de autorização do presidente da República, são aceleradas de modo a evitar que o próximo governante vete as nomeações.

No ano passado, mostrou o PainelIgor Romário de Paula, delegado que chefiou o grupo da PF na Lava Jato em Curitiba, teve a indicação brecada para o cargo de adido no Canadá.

A decisão de nomeação foi do ex-diretor-geral Rolando de Souza. Seu sucessor, Paulo Maiurino, havia referendado o ato, mas o processo paralisou na Casa Civil. Maiurino revisou, então, sua decisão. Atualmente, o delegado Cairo Costa Duarte cumpre a missão no país da América do Norte.

O ministro Anderson Torres (Justiça) deve voltar para a Secretaria da Segurança Pública do DF.

Em outros setores do governo, há movimentações também têm ocorrido para postos de mandato, caso dos adidos. No mês passado, Bolsonaro nomeou Gilson Machado para a presidência da Embratur (Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo).

Machado foi ministro do Turismo e deixou o cargo para disputar o Senado por Pernambuco. Ele acabou com 29%, derrotado para Teresa Leitão (PT), que fez 46%. Ele ficou conhecido como o sanfoneiro de Bolsonaro e se tornou um dos nomes mais próximos do presidente.

A nomeação para o comando da Embratur prevê um mandato de quatro anos no cargo. A lei que trata do órgão, porém, afirma que o chefe do Executivo pode demiti-lo. Assim, Lula pode retirá-lo do posto quando assumir o Palácio do Planalto, em 1 de janeiro.

O mandatário também escolheu dois aliados para mandatos de três anos, renováveis, como integrantes da Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

Os cargos funcionam com mandatos —portanto, são indemissíveis e integrarão o colegiado durante boa parte do terceiro mandato do presidente eleito.

Um deles é Célio Faria Júnior, ministro-chefe da Secretaria de Governo, e o outro é João Henrique Nascimento de Freitas, assessor especial no Palácio do Planalto.