Fracassamos no preparo, nos testes e até na contagem mortos
Hesitei muito antes de escrever esta coluna, mas acho que não há mais como adiar: a forma como o Brasil vem enfrentando a Covid-19 só pode ser classificada como um fracasso completo. Para mencionar apenas os pontos mais essenciais, fracassamos no preparo para lidar com a pandemia, fracassamos em testar nos níveis necessários para identificar os doentes e eliminar cadeias de contágio e fracassamos até mesmo em contar os mortos direito e enterrá-los com dignidade.
Não ignoro que a dificuldade é global. Faltam insumos no mundo inteiro. A carência atinge desde os sempre lembrados ventiladores até reagentes para os testes e itens de proteção pessoal como máscaras e viseiras. Faltam também produtos menos óbvios, como o swab, o "cotonete" usado nos exames moleculares.
Onde estão o governo e os engenheiros de produção? Por que o poder público não negociou com setores da indústria que estão ociosos a conversão de suas linhas para a produção emergencial de alguns desses itens?
Tampouco desconsidero o esforço, com enorme risco pessoal, das equipes de saúde. Minha mulher, Josiane, que é médica intensivista e cardiologista, já pegou o bicho e se recuperou, mas vários de seus colegas estão internados em estado crítico. A incapacidade das autoridades em fornecer equipamentos adequados de proteção custa vidas e desfalca as equipes num momento em que isso não poderia ocorrer.
Profissionais de saúde treinados para atuar em ambiente de UTI são outro gargalo importante.
O mais grave, porém, é nosso fracasso em testar de forma ampla para produzir números que permitam entender o que está acontecendo em cada área do país. Sem boas estatísticas fica impossível planejar os próximos passos, seja para ampliar o isolamento, seja para relaxá-lo, conforme a necessidade. Pior, sem testes em profusão, fica muito mais difícil promover uma estratégia de retomada controlada.