segunda-feira, 3 de setembro de 2018

31.08.18 | Cobogós: solução simples para aliviar o calor nas construções, O Globo


Fonte: O Globo Online - 31.08.2018

MCA Studio
Rio de Janeiro - O nome é divertido: cobogó. É possível que muitos não saibam o que é, mas certamente já cansaram de ver pela cidade esses elementos vazados que enfeitam tantas fachadas, especialmente as construídas no auge do modernismo. É o caso, para citar os mais famosos do Rio, dos que fazem parte do Conjunto Pedregulho, de Affonso Eduardo Reidy, e de alguns edifícios do Parque Guinle, projeto de Lucio Costa.

Patenteados em 1929, eles foram criados em Recife pelos engenheiros Amadeu Oliveira Coimbra, Ernest August Boeckmann e Antonio Gois — e da junção da primeira sílaba de seus sobrenomes surgiu o nome. Sócios numa fábrica de cimento, eles queriam algo que aliviasse o calor da cidade e criaram as primeiras peças nesse material. A inspiração foi mourisca, os muxarabis que davam privacidade e permitiam a entrada da luz e da ventilação. Mas cabe aos arquitetos cariocas a “reinvenção” do cobogó, especialmente Lucio Costa.

O arquiteto Carlos Murdoch usou esse elemento como uma das dissertações de seu mestrado e diz que ele estava em voga na época em que ainda se projetava sem a ajuda do ar-condicionado.

“Os edifícios deveriam ser confortáveis termicamente sem gastar energia. Atualmente, com a demanda da sustentabilidade e da eficiência energética, essas técnicas antigas de ventilação passiva estão retornando”, diz ele.

Ecológicos, os cobogós surgem em materiais variados, como vidro, cerâmica e porcelana, e em diversas cores.

E saem das fachadas para o interior das casas. A arquiteta Naomi Abe inspirou-se na brasilidade para o projeto de uma sala de jantar.

“Usei mil peças de cobogós cerâmicos com um espelho por trás, o que deu um efeito bastante interessante. Acho que podem ser usados em qualquer situação. Dependendo da maneira como se usam, são um elemento sofisticado”, diz.

O arquiteto Pedro Kastrup, do escritório PKB, sugere que eles adicionam um ar poético aos ambientes, já que a forma como desenham a luz nos espaços pode se alterar ao longo do dia e até conforme a época do ano.

“Fazem sempre uma analogia com o que foi a melhor fase da arquitetura nacional: o modernismo”, acrescenta Pedro.

O arquiteto francês radicado no Rio, Jean de Just, também gosta de cobogós, mas confessa que encontra uma certa resistência por parte dos clientes brasileiros. Para iluminar a entrada de um apartamento, ele usou meia parede de cobogós cerâmicos, que pintou de branco.

Mas eles não vivem só nas paredes. O arquiteto Ivan Rezende apropriou-se desses materiais populares e criou uma mesa de apoio, de tijolo de barro refratário e cobogós de cimento. Ou seja, além de bonitos, são baratos.

Multinacionais buscam startups para dar um outro fim a embalagens, FSP


Empresas criam soluções para coleta e reúso de materiais descartados por fabricantes



    Andrea Vialli
    SÃO PAULO
    Pressionadas pelas leis e pelos consumidores, multinacionais estão buscando a ajuda de startups para solucionar o problema das embalagens e seu descarte incorreto no ambiente. 
    Ágeis para desenvolver inovações tecnológicas, essas empresas iniciantes prometem ajudar a desenhar um futuro com menos lixo e materiais mais ecológicos.  
    No Canadá, a Loop Industries, startup de Montreal criada em 2015, vem ganhando destaque graças ao sistema inovador que desenvolveu. 
    Diferentemente dos processos usuais de reciclagem mecânica, a Loop desconstrói o plástico em blocos construtivos básicos (monômeros), que são separados das impurezas por um processo químico. 
    Depois, os monômeros são recombinados para criar um novo PET, de qualidade idêntica à da resina virgem, que pode ser utilizado em embalagens de alimentos, bebidas e cosméticos —o que nem sempre é permitido quando se trata de materiais pós-consumo reciclados. 
    A tecnologia atraiu companhias que buscam desvincular suas imagens da poluição causada pelas embalagens. Em julho deste ano, o grupo de cosméticos L’Oréal fechou um acordo com a Loop para incorporar a resina pós-consumo nas embalagens dos produtos comercializados na Europa e nos EUA. 
    A Evian, marca de água mineral da Danone, também assinou com a startup para utilizar a resina PET reciclada em suas garrafas. O objetivo é usar apenas plástico reciclado até 2025. A marca de isotônicos Gatorade, da PepsiCo, implementará a tecnologia da startup em um programa de reciclagem de garrafas. 
    Uma das vantagens da técnica é que ela permite reinserir como matéria-prima na indústria até os plásticos que estão abandonados no ambiente, sujos e degradados pela ação de agentes externos.
    “Muitos recicladores não coletam resíduos, porque eles podem contaminar o produto final. A tecnologia que desenvolvemos elimina esse problema”, afirma Nelson Switzer, diretor de crescimento da Loop Industries. 
    Ele explica que as empresas estão buscando alternativas para produzir riqueza a partir do que seria descartado. “Essa é a espinha dorsal da economia circular: gerar valor econômico e ambiental a partir do que hoje é considerado lixo”, diz Switzer.

    Thiago Pinto, 33, fundador da startup New Hope Ecotech, na empresa, na região central de São Paulo
    Thiago Pinto, 33, fundador da startup New Hope Ecotech, na empresa, na região central de São Paulo - Rafael Hupsel/Folhapress
    No Brasil, o casamento entre grandes empresas e startups também tem sido bem-sucedido. A New Hope Ecotech, no mercado há três anos, criou um sistema de rastreabilidade que conecta as companhias que precisam fazer a logística reversa de suas embalagens com as cooperativas e recicladores aptos a coletar os materiais recicláveis. 
    Os fabricantes reportam à startup a quantidade de embalagens que é colocada no mercado, e a New Hope Ecotech comunica cooperativas e recicladores cadastrados em sua base de parceiros o total que deverá ser reciclado. Um software mapeia o fluxo de resíduos. 
    Na etapa seguinte, a startup emite um certificado de compensação ambiental. Com o selo, batizado de Eureciclo, as empresas podem comprovar suas ações de logística reversa junto ao governo e ao Ministério Público, que vem aumentando a fiscalização. 
    “Foi mais pela dor do que pelo amor, mas o fato é que a cobrança sobre as empresas fez aumentar a demanda pela nossa tecnologia, que traz segurança jurídica ao processo”, afirma Thiago Pinto, 33, um dos fundadores da New Hope Ecotech.
    Hoje cerca de 400 empresas e associações setoriais utilizam o selo. A startup não divulga faturamento, mas a expectativa é que sua receita quadruplique neste ano graças ao aumento da demanda.  

    Lotes de plástico separados para reciclagem em depósito da startup Wise, em Itatiba, interior de São Paulo
    Lotes de plástico separados para reciclagem em depósito da startup Wise, em Itatiba, interior de São Paulo - Alberto Rocha/Folhapress
    A Wise, de Itatiba (a 85 quilômetros de São Paulo), nasceu com a ideia de desenvolver e dar escala comercial à chamada madeira plástica, material de alta resistência fabricado com plástico reciclado que substitui a madeira em aplicações como dormentes de ferrovia. 
    Por ser um mercado limitado, a empresa passou a produzir também resinas a partir do plástico pós-consumo para substituição do material virgem. Chega a utilizar plásticos recolhidos em mutirões de limpeza de praias e mares, e também recolhe materiais por meio de centrais de triagem em aterros sanitários. 
    Os clientes estão nos setores de eletroeletrônicos, automotivo e de bens de consumo —entre eles a Unilever, que utiliza as resinas da Wise na produção de embalagens de marcas como Omo e Seda.
    “A demanda pelo uso da resina reciclada é crescente, o consumidor quer ver material reciclado nos produtos que consome”, diz Bruno Igel, diretor-geral da Wise.
    A dificuldade é fazer com que os plásticos que estão no ambiente sejam reinseridos no processo produtivo, já que não há incentivos fiscais. A resina de plástico reciclado paga o mesmo imposto que a resina virgem.
    Os materiais pouco valorizados pelas cooperativas são alvo da Boomera, startup que se especializou em soluções para resíduos difíceis de reciclar.
    A empresa criada em 2011 pelo engenheiro de materiais Guilherme Brammer patenteou tecnologias para transformar materiais como cápsulas de café expresso e BOPP, um tipo de plástico revestido com alumínio, e opera um projeto piloto de reciclagem de fraldas descartáveis.
    O salto foi dado quando Brammer procurou grandes empresas para propor que trabalhassem em soluções para esses resíduos. 
    Para o BOPP, por exemplo, a startup engajou cooperativas na coleta do material pagando um valor acima do mercado e desenvolveu uma resina, que passou a ser utilizada pela PepsiCo na fabricação de displays de divulgação de produtos. Com a Dolce Gusto, marca de café em cápsulas da Nestlé, desenvolveu outro tipo de resina a partir das cápsulas trituradas, que pode ser utilizada para confecção de novos produtos relacionados com o universo do café, como porta-cápsulas.  
    “As startups não vão inventar a roda, mas sim acelerar a roda, já que detêm o conhecimento específico que as grandes empresas não têm”, diz Brammer. Ele conta que as companhias já consultam startups na etapa de desenvolvimento de um novo produto ou escolha de uma embalagem, o que era impensável há cinco anos. 
    “Eles querem saber qual material utilizar na embalagem, se é fácil de reciclar, como podem incorporar resíduos pós-consumo na fabricação. É um salto”, diz. Com as tecnologias que desenvolve, a Boomera vê seu faturamento crescer mesmo em um cenário de economia retraída: faturou R$ 20 milhões em 2017 e prevê dobrar a receita neste ano.

    Brasil deve adotar precificação de carbono em 2020, FSP

    Programa do Banco Mundial mapeia o impacto da tributação verde sobre economia nacional

      Andrea Vialli
      SÃO PAULO
      Impostos e taxas ambientais não são novidade em vários países: vêm sendo criados desde os anos 1990 para desencorajar produtos e serviços com maior impacto ambiental e incentivar tecnologias consideradas limpas.
      Com os compromissos climáticos internacionais, como o Acordo de Paris, de 2015, a adoção de instrumentos fiscais verdes está em franco crescimento no mundo, mas ainda patina no Brasil. 
      Levantamento concluído no ano passado pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) listou 3.200 instrumentos com esse perfil em 53 países, sendo 530 taxas e impostos ambientais, adotados por 49 nações. 
      Mesa sobre tributação verde no 3º Fórum Economia Limpa, realizado pela Folha
      Mesa sobre tributação verde no 3º Fórum Economia Limpa, realizado pela Folha - Reinaldo Canato/Folhapress
      O Brasil ocupa a 50ª posição na adoção desses mecanismos, o que corresponde a uma fatia de 0,6% do PIB.
      “O Brasil está ficando para trás. É certo que falar em novos tributos é impopular, mas os exemplos de outros países mostram que é possível onerar setores poluentes e desonerar os que emitem menos”, diz Eduardo Felipe Matias, doutor em direito internacional e autor do livro “A Humanidade Contra as Cordas”.
      Na América Latina, diversos países já adotaram impostos sobre o carbono, como México, Chile e Colômbia, que incidem prioritariamente sobre combustíveis fósseis e carvão.
      A decisão sobre adotar ou não a precificação do carbono no Brasil deve acontecer no segundo semestre de 2019.
      É quando serão concluídos os estudos que estão em andamento no Ministério da Fazenda, dentro da iniciativa PMR Brasil (Partnership for Market Readiness), do Banco Mundial, que visa elaborar recomendações para que os países ajustem as suas políticas públicas para alcançar os compromissos internacionais. 
      O projeto PMR pretende responder a duas questões: se o país precisará adotar algum mecanismo de precificação do carbono a partir de 2020 e qual seria o instrumento mais adequado para a realidade local. As opções são um imposto específico sobre a emissão do gás ou um sistema de comércio de créditos de carbono. 
      Para isso, estão sendo feitos estudos analisando os setores de energia, indústria e agropecuária, que se desdobrarão em modelagens macroeconômicas envolvendo tanto os cenários de tributação quanto os de compra e venda de créditos. 
      Por fim, os estudos serão discutidos em reuniões técnicas. O projeto reúne membros da coordenação de meio ambiente da Fazenda e especialistas da academia e dos setores envolvidos. 
      A Fazenda já havia recebido diversos estudos propondo alterações na política fiscal para penalizar atividades que geram muitas emissões de carbono —inclusive uma proposta que sugere um aumento da taxação das energias fósseis e da pecuária de baixa produtividade.
      Mas a ideia é que os estudos do PMR tragam uma visão mais abrangente do impacto para a economia do país caso esses mecanismos sejam adotados. 
      “Eles vão sugerir caminhos para o Brasil, com base no cálculo detalhado dos impactos que a precificação traria para os setores”, afirma Guarany Osório, coordenador de política e economia ambiental do FGVces (Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV) e membro do grupo de trabalho do PMR. 
      Em nota, o Ministério da Fazenda afirma que não vai comentar o tema.
      Além da impopularidade de se criar um novo imposto, a questão das mudanças climáticas tem perdido espaço entre os tomadores de decisão. 
      Para Matias, os sistemas de precificação de carbono são necessários, mas vêm sendo adotados em velocidade muito inferior à desejável para frear o aquecimento global.
      “O mundo está em uma espécie de autoengano: acha que está fazendo algo para resolver a crise do clima, mas as medidas tomadas até o momento não estão surtindo efeito na redução efetiva das emissões”, diz Matias.
      A concentração de dióxido de carbono, principal gás do efeito estufa, atingiu um novo recorde em 2017: 405 partes por milhão (ppm) segundo relatório divulgado este mês pela NOAA, agência americana dos oceanos e da atmosfera, e pela Sociedade Americana de Meteorologia. 
      O recorde anterior, de 2016, apontava para uma concentração de 403,3 partes por milhão. Isso já traz efeitos em relação à elevação das temperaturas globais: 2017 foi um dos três anos mais quentes desde que os registros começaram a ser realizados sistematicamente, em 1980.