segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Candidatura de Márcio França racha grupo que comandou SP por duas décadas, FSP


Governador, que será confirmado candidato hoje, se uniu a nanicos para entrar na disputa


Gabriela Sá Pessoa
SÃO PAULO
“Coitado do Márcio França, lá de São Vicente, imagina disputar o governo do estado com gente poderosa, rica e famosa.” A frase é do próprio Márcio França, governador de São Paulo, que assim ironizou, em 26 de julho, as expectativas em torno de sua candidatura à reeleição a ser confirmada neste sábado (4) pelo PSB.
Ao assumir o Palácio dos Bandeirantes, em abril, o sucessor de Geraldo Alckmin (PSDB) dividiu o grupo que governou o estado nos últimos 24 anos.
Os atritos começaram quando, sem acordo, o palanque de Alckmin virou um campo minado entre França, seu vice, e João Doria (PSDB), que o presidenciável tucano apadrinhou na eleição municipal de 2016. 

Márcio França em reunião da executiva de seu partido, o PSB, em Brasília. Ele está de camisa branca e terno preto
Márcio França em reunião da executiva de seu partido, o PSB, em Brasília - Pedro Ladeira - 19.abr.18/Folhapress
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Acercando-se de deputados estaduais desde 2017, Doria aglutinou um grupo de parlamentares que migrou para a oposição ferrenha ao Bandeirantes. Presidida por Cauê Macris, um dos principais aliados do ex-prefeito, a Assembleia Legislativa está paralisada. De modo inédito, os deputados não tiveram recesso em julho porque não houve acordo que desemperrasse a Lei de Diretrizes Orçamentárias. O texto já contempla propostas de governo de França, caso continue no cargo em 2019.
Doria começou a polarizar com França ao cunhar o apelido Márcio Cuba. A guerra fria entre os dois continuará. O pessebista elegeu o ex-prefeito como principal adversário na tentativa de levar a disputa para o segundo turno. Sob o slogan “São Paulo confia”, ele irá explorar a rejeição a Doria pela renúncia à Prefeitura e dizer que, ao contrário do tucano, o eleitor pode confiar no pessebista.
Mais do que o tucano, França avalia que seu grande adversário é mesmo o desconhecimento. Ele fica em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Doria e Skaf. Pesquisa Ibope divulgada na sexta (3) mostrou o governador com 3% da preferência dos eleitores paulistas, empatado com o petista Luiz Marinho.
Tentou driblar o anonimato em duas oportunidades: no Dia das Mães, quando homenageou a PM que atirou em um assaltante, e na greve dos caminhoneiros, quando buscou protagonismo nas negociações para encerrar o levante. Também levantou a bandeira da proteção animal —e se indispôs com o agronegócio— ao sancionar a proibição da caça e declarar apoio a projeto de lei que proíbe o embarque de bois vivos.
Sobre a greve dos caminhoneiros, França costuma contar uma conversa que teve com Michel Temer (MDB) no auge da crise, em maio. “Márcio, será que a gente consegue resolver?”, teria lhe perguntado o presidente. “Presidente, se o senhor que é presidente da República tiver dúvida de que vai resolver, quem é que vai resolver?”, relata o pessebista.
Filiado há 30 anos ao PSB, partido de médio porte, França se aliou a 14 legendas, boa parte delas nanicas. A costura junta de PPS a PHS e, até agora, garante espaço em São Paulo para os presidenciáveis Alvaro Dias (Podemos) e Ciro Gomes (PDT), além do apoio indisfarçável a Alckmin. 
Diferente de seu antecessor, abriu as portas do gabinete para receber prefeitos, deputados e demais aliados políticos, em encontros dentro e fora da agenda oficial. Mudou as regras administrativas para agilizar o repasse de verbas e prometeu R$ 439 milhões aos municípios —pagou, em média, 20% de cada contrato.
A dedicação aos aliados foi uma maneira de fazer frente, em estrutura e tempo de TV, a seus principais oponentes, mais robustos: PSDB (com DEM, PR, PP, PRB e DC), PT, que lança Luiz Marinho coligado ao PC do B, e MDB, em voo solo com Paulo Skaf.

Alckmin segura as mãos de Márcio França; entre eles, há uma bandeira de São Paulo. A foto é da cerimônia em que Alckmin transmitiu o cargo a seu vice, França
O ex-governador tucano, Geraldo Alckmin, transmite o cargo ao seu vice, Márcio França; Alckmin disputará a Presidência - Divulgação
Com 20 inserções diárias, França terá espaço de propaganda semelhante ao do líder de mídia e de pesquisas, Doria. Usará o tempo para mostrar programas como a ampliação de vagas na Universidade Virtual do Estado de São Paulo (diz que vai acabar com o vestibular no estado) e o alistamento civil de jovens de 16 a 18 anos. 
França tem reafirmado a lealdade ao antecessor. Seu entorno ainda discute como —e se— mostrará o tucano na propaganda, mas faz questão de lembrar o que Alckmin disse quando transmitiu o cargo, em 6 de abril: São Paulo estará “nas mãos firmes, experientes e honradas” de França.
Ele decidiria na sexta (3) com quem andará de mãos dadas. Os mais cotados: a coronel da PM Eliane Nikoluk (PR) como vice; no Senado, a ex-atleta Maurren Maggi (PSB) e o vereador paulistano Mario Covas Neto (Podemos).

MÁRCIO FRANÇA, 63
- Naturalidade: Santos, SP
- Formação e cargos que ocupou: advogado formado pela Universidade Católica de Santos. Foi oficial de justiça, vereador e prefeito de São Vicente, deputado federal e governador de SP
- Partido e coligados (confirmados e possíveis): PPS, PHS, PR, PDT, Podemos, PV, PPS, Pros, Solidariedade, PPL, PMB, PTB, Patriota
- Marqueteiro: Paulo de Tarso
- Coordenadores de campanha: Jonas Donizette e Claudio Valverde
- Slogan: Nesse você pode confiar
- Pontos fortes
> Experiência e traquejo político capaz de angariar apoios
> 2º maior tempo de ​tv
> Tem apoio informal de Alckmin e, ao mesmo tempo, é novidade no estado
- Fragilidades
> Falta apoio na Assembleia Legislativa, onde sofre forte oposição do PSDB
> Desconhecimento da população e baixo desempenho nas pesquisas
- Mote/Temas de campanha: criação de oportunidades, valorização do servidor público
- Frases que sempre usa: "São Paulo avança com Marcio França" e "É preciso recuperar a autoestima"

domingo, 5 de agosto de 2018

Banir canudinhos alivia consciência sem resolver poluição dos oceanos, FSP

Gisele que nos desculpe, mas modismos ecochiques não vão salvar o planeta

A hipocrisia pseudoambientalista não conhece limites. Virou moda demonizar os canudinhos de plástico, seguindo o exemplo virtuoso de Gisele Bündchen, que a revista Vogue promoveu a mãe da Terra --para a alegria de ONGs brasileiras em busca de celebridades para abraçar suas causas.
Nada a favor dos canudinhos, que fique bem claro. Seria melhor que essas próteses da fase oral não existissem para engrossar a avalanche de plásticos. Mas estigmatizá-los como inimigos planetários nº 1? Tenha paciência.
Garrafas plasticas em uma praia
Garrafas plasticas em uma praia - Joseph Eid/AFP
A santimônia plastificada decolou com o vídeo de 2015 em que uma tartaruga marinha aparece com o cilindro encalacrado na narina. São oito minutos para extrair o corpo estranho. O bicho sangra, abre a boca como se gritasse. Um verdadeiro horror.
Nascia ali um símbolo de fácil assimilação sentimental para a poluição dos oceanos com plásticos, um problema real. Estima-se que, a cada ano, 320 bilhões de quilos desse material sejam produzidos e descartados no ambiente.
Uma pequena parte disso vai parar no mar, talvez 8 bilhões de quilos. Outros 32 bilhões se acumulam nas praias, mangues e costões.
Ficaram famosas as imagens do acúmulo de detritos na grande faixa de lixo do Pacífico (GPGP, na abreviação em inglês de Great Pacific Garbage Patch), entre a Califórnia e o Havaí. 
Estudo de março na revista Scientific Reports, do mesmo grupo da Nature, calculou que 80 milhões de quilos flutuam por ali, numa área de 1,6 milhão de km2 (equivalente a cerca de um quinto do território brasileiro).
Muita gente acredita que os canudos formam parte considerável desse continente de detritos. Afinal, estima-se que só nos Estados Unidos 500 milhões de tubinhos sejam utilizados a cada dia (poucos sabem que o cálculo foi feito por um garoto de nove anos). Mas não é o caso.
Para começo de conversa, 40% dos plásticos não boiam no oceano, afundam. E os canudos quando muito representariam 0,03% do total desses resíduos que chegam ao mar.
Na realidade, 46% do lixo plástico em ambiente marinho são compostos por redes de pesca e outros implementos da indústria pesqueira, calcularam os autores do artigo na Scientific Reports. Pense nisso quando abrir sua próxima lata de atum.
Se for para expiar culpa, é melhor renunciar ao hambúrguer, além do canudinho do milk-shake. Carne bovina é um problema infinitamente maior para o planeta do que um pedaço de plástico.
A ameaça ambiental mais premente está na mudança do clima amplificada pelo aquecimento global. Seus efeitos estão por toda parte --dos incêndios na Califórnia, na Grécia e na Escandinávia às ressacas turbinadas que estão comendo a Ponta da Praia em Santos .
A pecuária responde sozinha por quase 15% das emissões globais de gases que agravam o efeito estufa. E essa participação tende a piorar, sob o rápido desenvolvimento socioeconômico da China.
Nas últimas três décadas, os chineses ampliaram o consumo de carne de 15 para 70 kg/pessoa/ano
Isso dá 28% do total mundial, o dobro do que se vende nos Estados Unidos, mas há que levar em conta o fato de a ingestão per capita ainda ser a metade da prevalente entre americanos.
Nem mesmo se você virar vegano vai fazer diferença para salvar o mundo. Precisaria antes combinar com 1,4 bilhão de chineses que, enfim, vão poder comer mais carne.
Marcelo Leite
Jornalista especializado em ciência e ambiente, autor de “Ciência - Use com Cuidado”.