domingo, 5 de agosto de 2018

Apesar de Bolsonaro, direita deve continuar sem partido no Brasil, FSP

Fernando Henrique Cardoso jura que é de esquerda, embora muitos brasileiros enxerguem o PSDB no outro lado da régua política. Durante seu governo, 31% dos eleitores diziam que os tucanos eram de direita. Anos depois, FHC ainda tentava convencer: “Se eu disser que sou de esquerda, as pessoas não vão acreditar, embora seja verdade”.
As bússolas ideológicas são desorientadas no Brasil, mas não há partido forte que se assuma de direita por aqui. O ícone conservador do momento, Jair Bolsonaro, atrai quase 20% do eleitorado, mas precisou alugar o nanico PSL para poder disputar a Presidência este ano.
Ainda que muitos brasileiros concordem com valores liberais na economia e tradicionalistas nos costumes, a estrutura política nacional parece repelir o rótulo da “direita”. O PFL, que nasceu como dissidência do partido de sustentação do regime militar, chegou a mudar de nome em 2007 para se livrar da marca.
“O sistema partidário atual nasce negando a ditadura, uma visão conservadora da sociedade”, pondera Marco Antônio Teixeira, da FGV. “Hoje, há uma estruturação do pensamento de direita em torno de pessoas, como Bolsonaro, ou movimentos, como o MBL. Não há partidos que reivindiquem esse legado.”
Plataformas conservadoras fazem mais sucesso com grupos suprapartidários, como as frentes temáticas do Congresso. A bancada BBB (boi, bala e Bíblia) agrega políticos de diversas siglas, defendendo com fervor o setor rural, a linha dura na segurança e interesses religiosos.
A onda de Bolsonaro representa terreno fértil para a organização de um partido de direita? O cientista político Jairo Nicolau acha possível. “Temos uma direita que saiu do armário. A opinião pública se plasmou nos últimos tempos, talvez falte um partido para vocalizar isso”, diz.
Há um entrave para isso, segundo Marco Antônio Teixeira. “O elo de Bolsonaro é com eleitores. O partido não é mediador do processo. Ele não expressa um projeto de sociedade, mas palavras de ordem.”

O que incentivar, Opinião FSP

O que incentivar

Protecionismo comercial e tributário deve dar lugar a abertura com melhor ambiente de negócios

Linha de produção de motores em Taubaté (SP) - Diego Padgurschi/Folhapress
Um dos indicadores mais eloquentes do insucesso do Brasil em enriquecer e lidar com suas mazelas sociais é a estagnação da produtividade —a capacidade de produção e geração de renda por trabalhador— nos últimos quase 40 anos.
Resultado de educação deficiente, protecionismo comercial, entraves burocráticos, infraestrutura depauperada e incentivos inadequados, essa letargia se traduz em crescimento econômico baixo e interrompido amiúde por crises.
Se em décadas como as de 1950 e 1970 o país conseguiu mais que duplicar seu Produto Interno Bruto (PIB), a taxa de expansão dos últimos dez anos deverá atingir ridículos 12% ao fim deste 2018. A renda per capita nacional, que chegava a 38% da norte-americana em 1980, decresceu para 26%.
Deve-se reconhecer que houve esforços importantes, embora insuficientes, para reverter esse quadro. Entre eles, a abertura econômica no início dos anos 1990, o Plano Real, a quebra de monopólios estatais, os aperfeiçoamentos regulatórios do início da administração petista e, mais recentemente, o redesenho das leis trabalhistas.
Entretanto no mesmo período acentuaram-se distorções que esmagaram as chances de maior dinamismo. A escalada das despesas sociais —nem sempre bem formuladas e eficazes— trouxe consigo a alta da carga de impostos, distribuída de modo socialmente injusto e hostil ao setor produtivo.
A proliferação de regimes tributários especiais para setores e empresas tornou a legislação ainda mais complexa, com enormes custos e insegurança jurídica.
No desastrado primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), o recrudescimento da intervenção estatal por meio de crédito subsidiado, desonerações sem critério e regulamentos nacionalistas elevou a ineficiência e reduziu a disposição ao investimento em áreas vitais, como infraestrutura.
Por algum tempo os problemas estiveram mascarados. Na década passada, o boom dos preços de produtos primários contribuiu para acelerar o crescimento do PIB, mas o efeito se mostrou efêmero.
Ademais, o bônus demográfico —o aumento da parcela da população em idade produtiva, que favorece a expansão da renda— está chegando ao fim, conforme as novas estimativas do IBGE.
Daqui para a frente, além de ajustar as finanças públicas, o país precisa despertar sua produtividade se quiser obter mais que um desempenho econômico medíocre.
Para tanto, uma providência tão óbvia quanto difícil é uma reforma tributária que dê fim ao emaranhado de impostos indiretos, embutidos nos preços das mercadorias e serviços —plataforma defendida, felizmente, por quase todos os principais presidenciáveis.
Abrir-se à competição com o restante do mundo é também fundamental, inclusive para os objetivos de adquirir tecnologia de ponta e ampliar a escala produtiva.
O Brasil permanece uma das economias mais fechadas do mundo, com apenas 25% do PIB transacionados em exportações e importações. Há que reduzir tarifas e negociar acordos com outros países e regiões. De espaço protecionista, o Mercosul deve ser convertido em plataforma regional de comércio.
A formalização do emprego e das empresas precisa ser uma busca permanente --o setor formal tende a ser mais produtivo, como mostra a literatura. Nesse campo, a reforma trabalhista, de efeitos ainda incipientes, constituiu um passo importante; resta repensar a estrutura sindical, visando maior representatividade.
Melhorar o ambiente de negócios passa por um vasto número de medidas. No âmbito regulatório, cumpre fortalecer as agências governamentais e facilitar processos que vão de licitações até as licenças para empreendimentos.
O aumento do crédito, essencial para alavancar os investimentos, depende de regras mais sólidas para a recuperação de garantias. Tanto quanto possível, ademais, deve-se trabalhar para reduzir a concentração no setor bancário.
Tudo isso tende a reforçar os aportes em infraestrutura, área que talvez traga a maior repercussão em termos de queda de custos gerais e geração de empregos. Com esse intuito, cabe ao governo promover parcerias com o setor privado e intensificar as privatizações.
Nenhum progresso será eficaz e duradouro, entretanto, sem uma melhora expressiva da qualidade da educação. Nesse sentido, o poder público deve conferir prioridade absoluta ao ensino básico.
Este tema será examinado com maior vagar no próximo domingo, na série de textos que se dedicam aos debates mais importantes da corrente disputa eleitoral.

Funcional, ALESP

02/08/2018 14:25 | Entrevista | Da Redação - Fotos: José Antonio Teixeira
Jorge MachadoClique para baixar a imagem
Jorge MachadoClique para baixar a imagem

São mais de três décadas de jornalismo, sendo 17 anos dedicados exclusivamente à Assembleia Legislativa. Elegante e bom de papo, ele conseguiu um feito reservado a poucos que frequentam o Palácio 9 de Julho: ser querido e respeitado por parlamentares do governo e da oposição, assim como por funcionários dos mais diversos setores. Caminhando sem parar pelos corredores da Alesp para cobrir a intensa rotina do Legislativo paulista, sempre com ternos impecavelmente alinhados, Jorge Machado construiu uma frutífera carreira na TV Alesp, onde apura, pauta, coordena a equipe e apresenta variados programas. 

Especializado em cobertura política, passou pelo Estadão, pela Rádio Eldorado, pela Rede Record e, imediatamente antes de encarar o desafio de cobrir o legislativo, trabalhou com o jornalista Florestan Fernandes Júnior na TV Senac. "Ele me convidou para participar de um novo projeto, que estava desenhado para a Câmara Municipal e para a Alesp. Acabei escolhendo a Alesp porque a Câmara era muito perto da minha casa e eu queria uma coisa diferente", conta. 

Filho de pais analfabetos ("jornal só entrava em casa embrulhando peixes") e o mais velho entre quatro irmãos, precisou se tornar responsável precocemente. "Comecei a trabalhar com 11 anos de idade, em um restaurante perto de casa", lembra. "Depois em um bar, e então em uma loja, que pertencia a um professor de química. Eu ficava o dia inteiro na loja, ajudava até a corrigir provas. Até gostei, quase fui para a química [risos]!" 

A decisão de seguir para o jornalismo veio de forma peculiar, que ele conta lançan­do mão de comparações. "Naquela época, meus cintos se desgastavam muito rapidamente já que a fivela riscava bastante o balcão, o que me obrigava a trocá-los", diz. "Como um grão de areia incomoda uma ostra, que reage e o recobre produzindo uma pérola, aquele cinto machucado me fazia ler e eu comprava o Jornal da Tarde diariamente. Quando fui para a faculdade, fui pensando: "quero escrever nesse jornal"." 

Cursar uma faculdade particular, entretanto, não era uma possibilidade. Dos irmãos, foi o único a conseguir um diploma de ensino superior. "Meu pai foi contra, achava que pagar para estudar era sacrificar a família, que usar o dinheiro para isso diminuiria o nível de proteína dentro de casa." O reconhecimento familiar só veio mais tarde, quando Jorge foi contratado pela Rede Record e começou a trabalhar na televisão. "Meu pai ficou mais feliz quando me viu na TV [risos], tinha um status. Foi motivo de muita satisfação e alegria." 

A partir da cidade de Poá, cursou jornalismo em Mogi das Cruzes, trabalhando durante os quatro anos para pagar os estudos. "Eu me arranquei do solo puxando os próprios cabelos. Foi uma fase difícil e um desembolso considerável. Praticamente não dormia, trabalhava de madrugada no Estadão e de manhã já saía para abrir a loja", relatou. Mais tarde, iniciou filosofia na Universidade de São Paulo (USP), mas não chegou a concluir. 

Trajetória 

Formou-se jornalista em 1985 e seu primeiro trabalho na área foi como revisor do Jornal da Tarde, no Estado de São Paulo. "O jornal era um processo industrial. O jornalista escrevia as laudas, que passavam pela digitação e depois pela revisão. Cada lauda era revisada por dois profissionais." 

Com a introdução dos computadores, os setores de revisão foram reduzidos, o que aumentava a chance de erros acontecerem. Foi um deles que acabou lhe tirando o emprego. Em 1989, na ocasião da eleição presidencial disputada entre Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva, o jornal decidiu publicar uma edição extra no dia seguinte, cobrindo o resultado. "Quando cheguei para trabalhar, estava demitido", conta. "Meu chefe mostrou a lauda revisada, com a minha assinatura. O texto "a política sempre acompanhou a carreira de Fernando Affonso Collor de Melo" saiu "a polícia sempre acompanhou". O erro é assim: você está escrevendo, lê quatro vezes, mas não vê. Depois ele sai publicado desse tamanho..." 

Pouco tempo depois do episódio, lá estava Jorge na mesma empresa, agora para trabalhar na Agência de Notícias e na Rádio Eldorado. "Trabalhando na rádio, cobria política e economia, fazia entrevistas, boletins de trânsito e de tudo um pouco." 

Naquele período, o então diretor da Record entrou em contato com o superior direto de Jorge. Ele procurava um repórter para trabalhar sobrevoando a cidade no helicóptero da emissora e, ouvindo os seus boletins de trânsito matinais, pensou que ele poderia ser a pessoa certa para desempenhar a função. "Ele perguntou para o meu chefe quanto eu ganhava e depois ligou para mim e fez a mesma pergunta". Jorge precisou até os centavos que ilustravam o seu holerite. "Ele respondeu: "venha aqui conversar comigo, mas já traga sua carteira de trabalho, você está contratado". Disse que foi o primeiro jornalista com quem conversou que não mentiu o salário! Me pagou o dobro do que recebia." 

Ele trabalhou por oito anos na Record, até 1999. O trabalho seguinte foi na TV Senac, onde ficou por mais dois anos, quando veio para a TV Alesp. 

Assembleia 

O trabalho em uma tevê pública e legislativa trouxe perspectivas de inovar e exercer mais atividades. "Além da transmissão [das sessões plenárias], implementamos programas de estúdio e um jornal. Com isso, a ideia foi produzir jornalismo aqui dentro", diz. "Vim para cá como repórter e apresentador, mas faço de tudo: reportagem, produção, edição." 

Consciente de seu papel profissional, Jorge afirma: "As pessoas têm a ideia de que o apresentador e o repórter são o cartão de visita de uma emissora, mas tenho muito claro que quem tem de aparecer é o produto do nosso trabalho, que aqui são os deputados. Faço os programas para que eles apareçam, e eles confiam muito nisso". Ele também diz que vê essas atividades como treinamento de mídia: "Digo que quem dá entrevista para a TV Alesp pode falar com qualquer outra tevê". 

O poder influenciador da televisão é outra característica que sempre mantém em mente durante o trabalho. "Há pesquisas provando que a imagem do político influencia muito a escolha do voto. A tevê, que ajuda a formar essa imagem, é um veículo ao mesmo tempo poderoso e perigoso. Se a pessoa não tiver o devido preparo, pode até ser prejudicada." 

Questionado se a cobertura jornalística externa da política é feita de forma negativa, Jorge defende que esse não é um fenômeno relacionado exclusivamente à Alesp. "Penso que a questão está exatamente na dificuldade de se mostrar o valor da política. Enquanto os políticos eram o polo de resistência à ditadura militar, eles ficavam na linha de frente dos palanques. Agora os papéis se inverteram e há pessoas chamando os militares [para assumir o poder]. As pessoas muitas vezes não têm noção do valor da democracia, houve quem desse a vida por ela, para termos, hoje, liberdades democráticas." 

Nesse sentido, ele acredita que o Parlamento é um importante concentrador de discussões em busca de uma sociedade melhor e que esse papel já foi desempenhado pela Assembleia Legislativa diversas vezes, como no Fórum São Paulo Século XXI, realizado em 2000. "Foi uma das melhores coisas que aconteceram aqui, um dos maiores ganhos da Alesp. As melhores cabeças do país vieram discutir desenvolvimento. A Casa ficou pró-ativa, recebeu gente do mais alto gabarito, para pensar no futuro; era um polo irradiador de discussões sérias sobre planejamento." Outra ocasião semelhante foi o Fórum Legislativo de Desenvolvimento Econômico Sustentado, de 2003, que levou para todo no interior do Estado esse tipo de discussão. 

"Grandes coisas já foram feitas, mas o Parlamento tem dificuldade de se promover, de dizer o que está fazendo. Há projetos de capilaridade, de extensão, com impacto na vida das pessoas. Nós jornalistas temos a responsabilidade de difundir isso, e temos a incumbência de polir a imagem dos políticos, em um momento difícil." 

Posição política 

Jorge se define como isento em relação a divergências ideológicas. É enfático ao dizer que "jornalista não tem partido e não pode ter" e deve a isso o bom trânsito que tem entre os parlamentares dos mais diversos espectros políticos. "Por isso me dou bem com todos os deputados, trafego em todos os partidos, sei qual é o meu papel e como desempenhá-lo." 

Mesmo refratário a qualquer posicionamento partidário, ele se reconhece um apaixonado pelo tema e lembra do primeiro despertar para o assunto " justamente no primeiro ano de faculdade, em 1982, quando os militares ainda estavam no poder. "Quem não fosse do verde oliva ou não estivesse engajado com o propósito da revolução era contra a ditadura e achava que todos os males estavam associados a ela." 

Jorge pondera que, apesar da censura e da violência do período, foi uma época de crescimento econômico. "Grande parte do Brasil nascia ali com as grandes ferrovias e as grandes hidrelétricas. Hoje estão desdenhando e jogando no lixo, mas se tem uma coisa que os militares fizeram foi colocar o Brasil no eixo. Saíram também por absoluta falta de sintonia com o restante da sociedade e com eles próprios." 

Para Jorge, tudo passa pela política, a qual ele acredita ser instrumento de melhoria da vida das pessoas. "Acredito na política transformadora " não a do mecenas, do salvador, não é isso. É arregaçarmos as mangas e fazermos nossa parte, não deixarmos que o Estado faça por nós." 

Entretanto, Jorge reconhece, cresce entre os brasileiros o sentimento de rejeição à política, especialmente a partidária, que vem sendo "criminalizada". "Uma parcela da população acha que dá para fazer política sem partidos, como os que, em 2013, foram para as ruas por causa dos 20 centavos. Acham que se mudam as coisas fazendo pressão direta sobre o governo e o Parlamento, quando é pelo voto que isso acontece." 

"Os debates hoje estão esterili­zados", afirma. "Deveríamos discutir mais, trocar mais argumentos, ver propostas, realizar audiências públicas, mas chegamos a um ponto de intransigência em que as pessoas só falam para si mesmas", diz. Para ele, o algoritmo que forma bolhas nas redes sociais é "uma chaga moderna". "Ele corrobora essa esterilidade porque faz com que só se veja o que reforça o nosso ponto de vista, não se vê o contrário, não se veem contrapontos, não se formam argumentos. Portanto, nunca se sai do mesmo lugar, e, pelo contrário, exacerbam-se os preconceitos". 

Figura de destaque há tempos na Casa, sempre atento ao funcionamento e aos acontecimentos dela, resume a Alesp: "O Estado São Paulo passa pelo Parlamento, pelo Palácio 9 de Julho. Dos Poderes, este é o mais próximo do cidadão. É a casa do povo, sim. É no Parlamento que se projeta o futuro, que se fazem as escolhas. Esta Casa tem essa vocação, só precisa se redescobrir, dialogar melhor com a sociedade, ser um polo irradiador da política, como já foi. Precisamos ampliar os canais de debate e comunicação, esse é o nosso papel como jornalistas".