Rogério Pagnan
SÃO PAULO
A ideia do novo governador de São Paulo de transferir a Polícia Civil da Secretaria da Segurança Pública para a pasta da Justiça esfriou após uma série de críticas da sociedade civil, além de um descontentamento de membros da própria corporação.
A proposta de Márcio França (PSB), conhecida somente na semana passada, vinha sendo desenhada desde que ele atuava como vice de Geraldo Alckmin (PSDB), com apoio de representantes de classe dos delegados de SP.
A ideia inicial do governador, também candidato à reeleição, seria sacramentar a mudança por meio de um decreto —que deveria ser publicado ainda nesta semana.
A Polícia Civil seria deslocada para Secretaria da Justiça, e a Polícia Militar seguiria na Segurança —sendo que essa pasta passaria a ser dirigida por um oficial da PM, provavelmente o atual comandante-geral corporação, coronel Nivaldo Restivo.
Mas, diante da repercussão negativa e de aconselhamentos técnicos contrários, França deu um passo atrás. Desistiu do decreto e solicitou à Secretaria da Segurança Pública a elaboração de uma proposta para um projeto de lei a ser enviado para avaliação da Assembleia Legislativa.
“Eu não acho ruim fazer essa modificação. Entretanto quem tem que decidir isso, a rigor, são as duas categorias e, principalmente, a Assembleia Legislativa que foi eleita pelo povo para poder decidir essas coisas”, disse França em entrevista à rádio Bandeirantes nesta segunda (16).
Como se trata de ano eleitoral, no qual assuntos polêmicos costumam sumir da pauta dos deputados, os próprios integrantes do governo dizem não enxergar grandes chances de o assunto progredir neste ano na Assembleia.
Segundo a Folha apurou, as cúpulas das polícias Civil e Militar assim como a própria Secretaria da Segurança foram informadas da intenção do governador somente na última quarta-feira (11).
Nas reuniões que se sucederam, na quinta (12) e sexta-feira (13), nem mesmo os delegados chamados para discutir o assunto defenderam a mudança de pasta. Disseram que não se tratava de um pleito da Polícia Civil, mas de alguns policiais, numa referência aos presidentes do Sindicato dos Delegados, Raquel Kobashi Gallinati, e da Associação dos Delegados, Gustavo Mesquita Galvão Bueno.
Raquel disse à Folha que a transferência não é um pedido da classe, mas, sim, uma proposta do próprio governador que eles apoiam. Ela disse ver uma chance de uma maior autonomia da Polícia Civil e, com ela, a prestação de um trabalho mais eficiente de polícia investigativa.
“Há uma necessidade latente de um choque de gestão. Fazer uma assembleia geral? Não, não fizemos porque a ideia não partiu da gente, a ideia veio do próprio governador, e nós achamos excelente”, disse. “Isso [choque de gestão] é algo que a base vem pedindo não de agora.”
PROBLEMAS
Um dos primeiros empecilhos detectados pelo grupo de estudo sobre uma mudança por decreto é a existência de uma lei em vigor que coloca as Polícias Civil e Militar na secretaria da Segurança. Assim somente uma outra lei poderia alterar a primeira.
Além disso, ponderaram os policiais ao governador, há inúmeros convênio firmados —incluindo com o governo federal— nos quais o recebimento de repasses de verbas depende de trabalhos conjuntos entre a PM e a Civil.
Até mesmo o pagamento de bônus de policiais utiliza análise de estatísticas da CAP (Coordenadoria de Análise e Planejamento), que funciona com dados elaborados pelas duas polícias. Assim, uma mudança de tal porte necessitaria de grande reengenharia ainda não planejada.
Além disso, delegados ouvidos pela Folha avaliam que essa mudança poderia trazer mais prejuízos à Polícia Civil do que benefícios. De benefício, seria, por exemplo, conseguir reajustes salariais à carreira, ao desvincular os pagamentos da folha da PM.
Um mês atrás, esse era o principal motivo que os representantes dos delegados apontavam como motivo de levar a Civil para outra pasta, segundo pessoas ligadas a eles ouvidos pela reportagem.
Pelo lado negativo, o principal temor dos policiais civis seria dar ainda mais poderes à Polícia Militar, com uma secretaria própria, e abrir caminho para a implantação do chamado ciclo completo.
Por este sistema, a PM poderia atuar em pequenos crimes desde o registro na rua, até apresentação do caso à Justiça —algo vetado hoje. Isso, para alguns policiais, seria o primeiro passo para a extinção da Polícia Civil.
Por este sistema, a PM poderia atuar em pequenos crimes desde o registro na rua, até apresentação do caso à Justiça —algo vetado hoje. Isso, para alguns policiais, seria o primeiro passo para a extinção da Polícia Civil.
Além de tudo, a proposta do governador deixou descontentes os representantes da Polícia Técnico-Científica que, primeiro, não participaram da reuniões para opinar sobre o tema na pasta da Segurança.
Segundo, porque seriam levados para a pasta da Justiça como um apenso da Polícia Civil —também contrariando a vontade da classe de autonomia dessa polícia.
Segundo, porque seriam levados para a pasta da Justiça como um apenso da Polícia Civil —também contrariando a vontade da classe de autonomia dessa polícia.