terça-feira, 11 de novembro de 2014

Para os que querem abandonar o Brasil

Por Leonardo Boff*
É espantoso ler nos jornais e mensagens nas redes sociais e mesmo em inteiros youtubes a quantidade de pessoas, geralmente das classes altas ou os ditos “famosos” que lhes custa digerir a vitória eleitoral da reeleita Dilma Rousseff do PT. Externam ódio e raiva, usando palavras tiradas da escatologia (não da teológica que trata dos fins últimos do ser humano e do universo) e da baixa pornografia para insultar o povo brasileiro, especialmente os nordestinos.
Estas pessoas não vivem no Brasil, mas, em geral, no Leblon e em Ipanema ou nos Jardins da cidade de São Paulo onde se albergam, em sua maioria, os pertencentes às classes opulentas (aquelas 5 mil famílias que, segundo M. Porchmann, detém 43% do PIB nacional). Muitas delas não se sentem povo brasileiro. Externam até vergonha. Mas estão aqui porque neste país é mais fácil enricar, embora o desfrute mesmo é em feito em Miami, Nova York, Paris ou Londres, pois muitos deles têm lá casas ou apartamentos.
Alguns mais exacerbados, mas com parquíssima audiência, sugerem até separar o Brasil em dois: o sudeste rico de um lado e o resto (para eles, o resto mesmo) do outro, especialmente o Nordeste.
Acresce a isso o Parlamento brasileiro, a maioria eleita com muito dinheiro, que mal representa o povo. Finge que escutou o clamor dos ruas em junho de 2013 demandando reformas, especialmente na política, no sistema de educação e de saúde e uma melhor mobilidade urbana e não em último lugar a segurança e a transparência na coisa pública. Mas já esqueceu tudo. Rejeitou o projeto do governo, no rescaldo da reeleição, que visava ordenar e dar mais espaço à participação dos movimentos sociais na condução da política nacional, respeitadas as instituições consagradas pela Constituição.
Tal fato nos remete ao que Darcy Ribeiro diz em seu esplêndido livro que deveria ser lido em todas as escolas, “O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil”(1995). Aí diz o grande antropólogo, indigenista, político e educador: ”O ruim no Brasil e efetivo fator do atraso, é o modo de ordenação da sociedade, estruturada contra os interesses da população, desde sempre sangrada para servir a desígnios alheios e opostos aos seus… O que houve e há é uma minoria dominante, espantosamente eficaz na formulação e manutenção de seu próprio projeto de prosperidade, sempre pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma da ordem social vigente”(p.446).
Esta afirmação nos concede entender por que a presidenta Dilma quer uma reforma política que não venha de cima, do Congresso, porque este sempre se oporá ao que possa contradizer os seus indecentes privilégios. Deve partir debaixo, ouvindo os reclamos do povo brasileiro. Quem aprendeu em 500 anos a sobreviver na pobreza senão na miséria, colheu muita experiência e sabedoria a ser testemunhada e repercutida na nova ordenação político-social do Brasil. Ouvi de um sacerdote que viveu sempre na favela: ”Há um evangelho escondido no coração do povo humilde e importa que o leiamos e escutemos”. Vale a mesma coisa para as várias reformas desejadas pela maioria da população: auscultar o que se aninha no coração do povo e dos invisíveis.
Podemos tolerar a arrogância e a resistência dos poderosos e dos parlamentares, o que não podemos é defraudar a esperança de todo um povo. Ele não merece isso depois de tanto suor, sacrifícios e lágrimas. Ele precisa voltar às ruas e renovar com mais contundência e ordenadamente o que irrompeu em junho do ano passado. O feijão só cozinha bem em panela de pressão. Da mesma forma, o parlamento abandona sua inércia quando é posto sob pressão, como se constatou no ano passado.
Voltemos a Darcy Ribeiro, um dos que melhor estudou e compreendeu a singularidade do povo brasileiro. Uma coisa são os povos transplantados como nos USA, no Canadá e na Austrália. Eles reproduziram os moldes dos países europeus de onde vieram. No Brasil foi diferente. Ocorreu uma das maiores miscigenações da história conhecida da humanidade. Misturaram-se entre si índios, afro-descentes, europeus, árabes e orientais. Criaram um novo tipo de gente. Diz Darcy: ”o nosso desafio é de reinventar o humano, criando um novo gênero de gentes, diferentes de quantas haja”(p.447). Diz mais: ”olhando todas estas gentes e ouvindo-as é fácil perceber que são, de fato, uma nova romanidade, uma romanidade tardia mas melhor, porque lavada em sangue índio e sangue negro”(p.447).
Não me furto em citar estas palavras proféticas com as quais fecha seu livro “O povo brasileiro”: “O Brasil é já a maior das nações neolatinas… Estamos nos construindo na luta para florescer amanhã como uma nova civilização, mestiça, tropical, orgulhosa de si mesma. Mais alegre, porque mais sofrida. Melhor porque incorpora em si mesma mais humanidades. Mais generosa, porque aberta à convivência com todas as raças e todas as culturas e porque assentada na mais bela e luminosa província da Terra”(p.449).
Para os que querem sair do Brasil: fiquem nessa esplêndida Terra e ajudem-nos a constuir esse sonho bom.
* teólogo e escritor

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Ayres Britto se diz favorável ao mandato temporário para ministros do STF


IGOR GADELHA - O ESTADO DE S. PAULO
10 Novembro 2014 | 17h 15

Ex-presidente do Supremo evitou comentar fala de Gilmar Mendes sobre 'corte bolivariana', mas se colocou a favor de proposta de fim da vitaliciedade do cargo


São Paulo - O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ex-ministro Ayres Britto, evitou comentar a recente declaração do ministro Gilmar Mendes de que o tribunal corre o risco de se converter em uma "corte bolivariana". Ele afirmou, contudo, ser favorável a uma discussão sobre adoção de mandatos temporários para os ministros da Corte.
Britto defendeu que é "chegada a hora de discutir com mais foco" a idade da aposentadoria compulsória, atualmente em 70 anos, "não apenas para o STF, mas para todo o funcionalismo público". Atualmente, tramita no Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 457/05, conhecida como "PEC da Bengala", que prorroga para 75 anos a idade para aposentadoria compulsória de ministros do STF. A matéria foi aprovada em 2005 pelo Senado e aguarda votação da Câmara.
Questionado se concorda com essa ampliação, Ayres Britto se disse "mais favorável" a uma discussão sobre a adoção de mandatos para os ministros do STF, do que em relação à idade para a compulsória. "Temos que discutir se é um mandato vitalício ou temporário e, entre os dois, me posiciono favorável ao temporário", afirmou, defendendo que os integrantes da Corte deveriam ter mandato entre nove e 12 anos, como, segundo ele, ocorre em outros países.
Aposentado compulsoriamente desde novembro de 2012 após nove anos como integrante do STF, o ex-ministro afirmou ainda que, na época em que estava na Corte, não moveu "uma palha" no sentido de tentar ampliar a idade para aposentadoria compulsória. "Se entrei só por uma vaga de alguém que se aposentou, como na minha vez vou me pronunciar sobre isso?", questionou Britto, para cuja vaga a presidente Dilma indicou o atual ministro Luís Roberto Barroso.
A discussão sobre a PEC das Bengalas voltou à tona após a reeleição de Dilma. Cinco dos dez ministros da composição atual (Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Teori Zavascki e Rosa Weber) do STF farão 70 anos de idade nos próximos quatro anos. Com isso, até o fim do segundo mandato, a petista poderá indicar seis ministros para o STF (além dos cinco citados antes, a presidente vai indicar alguém para a vaga de Joaquim Barbosa). Isso fará com que, em 2016, somente um componente da Corte não tenha sido indicado por um governo do PT. No caso, Gilmar Mendes, indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

São Paulo vai tratar esgoto e enviar água de reúso para consumo

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Em meio a crise hídrica que assola o estado de São Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou nesta quarta-feira, 5 de novembro, a construção de duas estações de produção de água de reúso que abastecerão diretamente as bacias dos sistemas Guarapiranga e Alto Cotia.
Segundo informações do Estadão, serão as duas primeiras instalações do Estado para captar o esgoto e transformá-lo em água de reúso, que servirá mais tarde para o consumo. Ainda em fase de projeto, as estações têm previsão de entrega para dezembro de 2015.
"Na estação do Guarapiranga, vamos gerar 2 metros cúbicos por segundo de água de reúso. Teremos esse valor a mais sendo devolvido ao Guarapiranga independentemente de chuva", explicou Alckmin. A outra estação será feita na região do Rio Cotia e terá capacidade de produção de 1 metro cúbico por segundo. Cada metro cúbico de água é suficiente para abastecer 300 mil pessoas, segundo o governador.
Alckmin também anunciou a construção de 29 reservatórios, que aumentarão em 10% a capacidade de reserva de água tratada na Região Metropolitana. Segundo o governador de São Paulo, a Sabesp vai aumentar a água da Represa Billings para o Sistema Guarapiranga. O volume repassado passará dos atuais 2 para 4 metros cúbicos por segundo. Por essa razão foi reduzida há um mês a água enviada da Billings para a usina hidrelétrica do litoral.
Existe, inclusive, de acordo com Hespanhol, uma resistência cultural ao uso de esgoto tratado para o abastecimento.
As medidas de reforço nos demais sistemas de abastecimento da Região Metropolitana têm como objetivo diminuir a demanda sobre o Sistema Cantareira. Atualmente, 2,3 milhões de consumidores deste último são atendidos pelo Guarapiranga e Alto Tietê.
Em 17 de outubro, o EcoD publicou as opiniões do professor Ivanildo Hespanhol (Poli-USP) sobre o reúso de água em São Paulo. Na concepção do especialista, a região metropolitana precisa começar a reusar a água para que o sistema hídrico tenha sustentabilidade.
 "Nós continuamos trazendo água de fora, produzindo esgoto e não tem nem planejamento para tratá-lo", criticou Hespanhol.  Aproveitando as estações existentes, o sistema de tratamento poderia, de acordo com o professor, ser aprimorado para que essa água fosse destinada para aproveitamento não potável, como o uso industrial. Isso, seria, na opinião do especialista, uma
Resistência cultural
Existe, inclusive, de acordo com Hespanhol, uma resistência cultural ao uso de esgoto tratado para o abastecimento. “A nossa percepção cultural inibe a utilização de esgoto como água potável ou não potável”, destacou.
O professor garante, entretanto, que os processos de reúso podem transformar o esgoto em água e ser usada para qualquer finalidade. Para o abastecimento das cidades, Hespanhol diz que a água de reúso pode ser misturada a água usada normalmente para o abastecimento. “Onde ele seria diluído, teria a qualidade melhorada, voltaria para estação de tratamento, produzindo água”, detalhou.