quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Lula carregou seu segundo poste, por Elio Gaspari, na FSP


Se Nosso Guia acender a lâmpada de Haddad, terá ganho mais uma, se não, a derrota será sua
LULA LEVOU seu poste ao segundo turno na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Apesar de a eleição ter ocorrido enquanto o Supremo Tribunal Federal julga um dos maiores escândalos políticos da história nacional, o PT saiu da rodada inicial como o partido mais votado nos municípios, com 17,3 milhões de votos (um crescimento de 4%), elegendo 624 prefeitos, 12% a mais que em 2008. Levou 8 das 83 cidades com mais de 200 mil habitantes que fecharam a conta.
Isso num dia em que o ministro Joaquim Barbosa era festejado na seção onde votou. "Cana neles", disse-lhe um eleitor. Seu colega Ricardo Lewandowski, adversário no julgamento do mensalão, entrou pelos fundos. O comissário José Dirceu, depois de ter trocado de endereço, chegou acompanhado por uma centena de companheiros parrudos.
O PMDB continua sendo o partido com maior número de prefeituras (1.025) mas, pela primeira vez, perdeu na soma dos votos. O PSDB elegeu 693 prefeitos com 13,9 milhões de votos, perdendo 13% dos municípios e 4% dos votos.
Qualquer projeção de resultado eleitoral com base em resultados do primeiro turno é uma ousadia aritmética e as especulações nacionais a partir de números municipais são exercícios de quiromancia. Os números de domingo fixam três personagens vitoriosos: o mineiro Aécio Neves, o pernambucano Eduardo Campos e o carioca Eduardo Paes, mas falta São Paulo.
Se Nosso Guia eleger Fernando Haddad, sairá desta eleição maior do que entrou. Se perder, pobre Lula. Assim como ninguém poderá dizer que o PT perdeu a eleição tendo vencido em São Paulo e saído do pleito com mais de 14 milhões de votos, os companheiros terão dificuldade para cantar vitória tendo perdido também em Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife.
A ascensão de Celso Russomanno mostrou que costuras partidárias, marquetagens e tempo no horário de propaganda gratuita são incapazes de decidir um pleito. Sua implosão provou que pesquisa é uma coisa, e eleição, outra. A de domingo mostrou as limitações da futurologia. Noutro aspecto, indicou as limitações da passadologia.
Continua em vigor a sabedoria convencional do cinturão petista da periferia de São Paulo. Haddad conseguiu recuperar os votos da periferia que escorregavam na direção de Russomanno e ficou com o maior pedaço desse eleitorado. Não existe cinturão petista. Se existisse, nas pesquisas de setembro, Russomanno não teria conseguido 38% das preferências na região. O que existe é um pedaço da cidade onde, depois de oito anos de exercício da prefeitura, o tucanato ainda não se fez ouvir.
Há dez anos havia no Rio de Janeiro o fator passadológico da zona oeste. Nela, políticos como Anthony Garotinho e Cesar Maia, com oito anos de poder estadual e 12 na prefeitura, estariam protegidos. Pois no domingo, o candidato Rodrigo Maia (filho de Cesar), que tinha como vice Clarissa Garotinho (filha de Anthony e de Rosinha, sua sucessora) conseguiu 5,4% dos votos, com 0,91% em Campo Grande. O cinturão carioca também não existia. Tanto na periferia de São Paulo como na zona oeste do Rio concentram-se eleitores de baixa renda.

Desequilíbrio entre oferta e demanda faz SP parar no tempo


DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA
ALESSANDRO JANONI
DIRETOR DE PESQUISA DO DATAFOLHA
Como resultado das notas atribuídas pelos moradores dos 96 distritos de São Paulo a 27 aspectos do cotidiano, conclui-se que pouca coisa melhorou na capital nos últimos quatro anos na percepção da população.
Do total, apenas oito distritos conseguiram médias superiores às verificadas na versão anterior do DNA Paulistano, realizada em 2008.
Já 22 distritos recebem notas inferiores às observadas há quatro anos. Os 66 restantes apresentam desempenho estável no mesmo período.
Ao se observar no mapa da cidade os distritos que pioraram nos últimos anos, percebem-se duas grandes manchas. Uma é localizada no extremo leste e configura uma faixa que corta a região no meio e reúne Ermelino Matarazzo, São Miguel Paulista, Itaquera, Parque do Carmo, José Bonifácio, Cidade Tiradentes e Iguatemi.
A outra mancha de involução começa no extremo norte, nos bairros de Tremembé e Mandaqui, desce por Vila Medeiros e Vila Maria, contempla Tatuapé e Água Rasa, na zona leste, contorna o centro pela Mooca, Belém e Liberdade, passa pelo Jardim Paulista, na zona sul, e chega à zona oeste por Pinheiros e Alto de Pinheiros.
Gabo Morales/Folhapress
O centro de São Paulo visto a partir do Terraço Itália
O centro de São Paulo visto a partir do Terraço Itália
Pelos dados, percebe-se que uma explicação possível para os resultados encontra-se no desequilíbrio entre oferta e demanda nas diferentes regiões da cidade.
Com a economia controlada e a distribuição desigual de serviços públicos e privados pelo município, a população de áreas mais carentes tende a buscar aquilo que não tem em seu bairro nos distritos com mais estrutura, mais próximos à região central.
Essa dinâmica gera reflexos inevitáveis nos mais diversos aspectos do centro expandido, inclusive no trânsito.
Quanto aos bairros que melhoraram, não se percebe concentração geográfica expressiva em determinada região. Os distritos que mais subiram no ranking geral da cidade --Sapopemba e Jardim São Luís-- ficam, respectivamente, nas zonas leste e sul.
A base do desempenho positivo, nos dois casos, sustenta-se muito mais em ações de natureza comunitária e cultural do que propriamente em benfeitorias estruturais.
Sobre o ranking dos distritos, aliás, vale destacar a evolução do Carrão, bairro da zona leste que, em 2008, ocupava a 36ª posição e hoje figura no sétimo lugar. Dos 27 itens avaliados no bairro, 16 conseguiram notas mais altas do que há quatro anos.
Os bairros que lideram o ranking de 2012 já estavam no topo em 2008 --Alto de Pinheiros, Vila Mariana e Consolação ficam com as maiores médias. A exceção é o Jardim Paulista que caiu da segunda para a oitava colocação, abrindo espaço para Vila Leopoldina, Moema e Lapa. No geral, os bairros com as maiores médias compõem o centro expandido da capital.
Na lanterna, o desempenho positivo da Brasilândia, que melhorou ligeiramente sua média em relação a 2008, jogou o extremo sul para a posição --figuram ali os bairros de Parelheiros, Jardim Ângela e Marsilac. As menores médias no geral localizam-se nos distritos da periferia.
Em um cenário que pede mudança, o próximo prefeito terá como tarefa importante solucionar a equação do desequilíbrio, gerando ofertas adequadas às demandas específicas de cada região, para que, daqui a quatro anos, a maioria dos 96 distritos apresente médias de satisfação maiores que as de 2012, no DNA Paulistano de 2016.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

As dificuldades com o planejamento


Coluna Econômica - 09/10/2012 Luis Nassif

Na rede CBN, o comentarista José Luiz Portela fala da importância do planejamento na gestão municipal, da visão sistêmica de saber analisar todos os setores de forma integrada. No seu primeiro discurso, depois de encerrado o primeiro turno, o candidato José Serra faz o mesmo discurso.
Não se trata de coincidência, mas de estratégia de marketing. Portela foi Secretário Estadual de Transportes Metropolitanos na gestão Serra, e é um dos melhores quadros do PSDB paulista. Na CBN, mostra - com enorme competência - como deveria ser a gestão ideal de São Paulo. No palanque, Serra se apresenta como se fosse esse gestor ideal.
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No entanto, há uma distância quilométrica entre a gestão em São Paulo e em alguns locais símbolo: como Pernambuco, com Eduardo Campos, Minas, com Anastasia (em que pese a enorme crise financeira do Estado) e município do Rio, com Eduardo Paes.
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Ter bons quadros nas secretarias é condição necessária, mas não suficiente para o bom resultado. Há que se ter um governante com capacidade de gestão e discernimento para definir as prioridades e as ações de implementação.
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À frente da Secretaria, Portela planejou minuciosamente a questão do transporte na região. Calculou fluxos de transporte, pensou a integração, planejou um VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) para Santos.
Antes disso, no início do governo Fernando Henrique Cardoso, foi dos poucos quadros do governo com reconhecida competência gerencial. Foi dele o planejamento bem sucedido de distribuir livros didáticos por toda a rede pública, um feito fantástico na época.
No entanto, em São Paulo, grande parte do planejado não saiu do papel, justamente pela incapacidade de Serra de articular as diversas secretarias de Estado, definir prioridades e fazer acontecer.
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O mesmo aconteceu com a Secretaria de Gestão, criada para supostamente dotar São Paulo de competência gerencial. Na época, foi entregue ao atual Chefe da Casa Civil, Sidney Beraldo, outro quadro precioso do PSDB paulista.
Ora, processos de gestão são horizontais - isto é, atuam sobre todas as secretarias. Qualquer governador minimamente iniciado nos modelos de gestão trataria de organizar uma reunião de todo secretariado e discutir as formas da Secretaria de Gestão atuar em cada um deles, uniformizando ações, indicadores etc.
Beraldo cercou-se de consultores, buscou bons quadros, mas nada aconteceu. Em todo período da Secretaria, Serra não realizou uma reunião sequer com todos os secretários para definir a forma de atuação da Secretaria.
Consequência: nada andou e perdeu-se a possibilidade de São Paulo ao menos dar um passo, ainda que tímido, em direção às modernas ferramentas de gestão.
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Por tudo isso, a impressão que passa é que campanhas eleitorais se resumem a "insights", "sacadas", "dicas",  passadas por assessores aos candidatos, mas longe de se constituírem em formas articuladas de planejamento.
O ponto inicial de qualquer planejamento estratégico é definir o que se pretende com ele.
Experimente consultar o Google e localizar um artigo ou reportagem sequer na qual Serra indicasse o que pretendia fazer de São Paulo. Não se vai encontrar nada. No máximo, algumas declarações soltas, sem contexto e sem consequência.

Coluna Econômica - 08/10/2012

Minha primeira paixão política foi Jânio Quadros. Menino ainda, 8 anos, lembro-me empunhando uma vassoura e participando de um comício pró-Marechal Lott em Poços de Caldas. A vassoura era o símbolo da campanha de Jânio.
Depois, assisti o grande comício de Jânio em Poços, na praça em frente o Bauxita e ao lado das Thermas Antonio Carlos. Fiquei todo orgulhoso de ver meu avô, Issa Sarraf, ao lado de Jânio no palanque. Vovô era presidente da UDN local. Comigo no colo, meu pai Oscar fez um sinal de rabiscar para meu avô, pedindo um autógrafo para o neto.
Era muito criança na campanha de JK. Mas Juarez Távora - o candidato derrotado - era turista habitual de Poços e amigo da família.
Meu avô tinha um bar-restaurante de nome Serigy. Os adversários chamavam de "Caldeirão do Diabo". Era o local de encontro dos políticos, dentro da tradição afável mineira. Em um dia da semana, havia reunião do diretório da UDN. Em outro, do PSD.
Criança ainda, acompanhei algumas brigas históricas na cidade. Inclusive na eleição em que Dr. David Ottoni, engenheiro, venceu o Dr. Martinho de Freitas Mourão, médico.
Dr. Martinho era um santo, um dos melhores amigos de meu pai, padrinho de batismo de minha irmã Inês. Era o principal pediatra da cidade e dividia as consultas em dois turnos: em um dos turnos, atendia as famílias que podiam pagar; no outro, as que não podiam.
Vô Issa, que era do Clube da Lanterna, de Lacerda - inclusive amigo pessoal do carbonário Lacerda - moveu uma campanha implacável contra o dr. Martinho. Pouco antes de morrer, com 94 anos, minha avó Martha me falou da campanha.
- Meu neto, foi tão pesado o que seu avô fez que minhas amigas de oração fizeram uma vaquinha para publicar um anúncio protestando contra ele.
- E a senhora, como ficou nessa?, indaguei.
- Ah, eu tinha um dinheirinho guardado e ajudei na vaquinha.
De qualquer modo, David fez um governo impecável, auxiliado pela Consultec, uma empresa de assessoria do Rio, que tinha nos seus quadros Roberto Campos, Mário Henrique Simonsen e Mário da Silva Britto, casado com uma Carvalho Dias de Poços.
Neste dia de eleições municipais, chego ao ponto central: o planejamento municipal.
Pela segunda vez, Poços teve um prefeito pensando no planejamento futuro da cidade. O primeiro foi Francisco Escobar, um gênio pouco conhecido, tão brilhante e eclético que o próprio Rui Barbosa o apelidou de "cabeça de Salomão".
Na primeira década do século 20, Escobar criou um jardim botânico, para desenvolver plantas e flores que pudessem enfeitar as casas de Poços. E deu desconto no imposto urbano para as casas que não fossem geminadas e cultivassem jardins bonitos.
A cidade bem maior, recebida por David, exigia outro tipo de planejamento.
E aí é importante, especialmente para novos prefeitos, entender a importância dos projetos.
Em Poços, a Consultec definiu áreas para instalação de grandes empresas, pequenas empresas, ajudou a elaborar um plano diretor. O projeto foi seguido pelo prefeito seguinte mas abandonado pelos prefeitos posteriores.
Hoje em dia, mais do que nunca, prefeituras dependem de prefeitos com visão de gestão, e capacidade de contratar consultorias adequadas para montar projetos. Ë condição fundamental para se ter acesso a verbas de saneamento, educação

Consultec com Castello

Nos anos 60, especialmente após 1964, a Consultec transformou-se na grande consultoria de projetos do país - ao lado da Clan, de Rômulo de Almeida, na Bahia. Recebeu, inclusive, aportes internacionais para pensar em projetos de modernização das políticas públicas brasileiras, dos órgãos principais. Teve papel importante no governo Castello Branco, ajudando a definir as principais reformas do período.

Planejamento pós-guerra

A Segunda Guerra incorporou o conceito de projetos e planejamento na gestão pública brasileira. Plano Salte, Abbink e outros obrigaram o país, finalmente, a montar relação de projetos prioritários. Depois, no Plano de Metas de JK, engenheiros projetistas trabalharam o conceito de projeto integrado, prevendo etapas, formas de financiamento etc. Eram técnicos, em sua maioria, provenientes do setor elétrico brasileiro.

As inovações urbanas  - 1

Especialmente nas metrópoles, haverá enormes desafios aos novos prefeitos, exigindo criatividade, capacidade de romper com paradigmas imobiliários. Em Salvador, Rômulo desenvolveu um projeto que consistia na prefeitura trabalhar regiões não habitadas, colocar infraestrutura, construir um conjunto habitacional em uma parte da área e vender no mercado a outra – valorizada pelos serviços públicos.

As inovações urbanas - 2

Seria a maneira de interromper uma das maiores iniquidades das políticas urbanas. Aquela em que a Prefeitura, com dinheiro dos munícipes, investe em determinadas áreas e todo o lucro da valorização imobiliária fica com particulares. Trata-se de uma tendência nefasta mas praticamente generalizada em todas as cidades brasileiras, devido à enorme influência política dos setores imobiliários locais.

As Câmaras de Vereadores

Outro ponto complicado, na gestão municipal, é o relacionamento do Executivo com as câmaras de vereadores. Em outros tempos, vereador não era uma atividade remunerada. Depois que se tornou, abriu espaço para um novo tipo de profissional, sem o elitismo das velhas câmaras de vereadores, mas, muitas vezes, sem o senso de cidadania que a função exige. Em muitas cidades, há prefeitos praticamente refens de vereadores.

As ONGs fiscalizadoras

Com a nova Lei da Transparência, abre-se espaço para um amplo trabalho de fiscalização do poder público pela sociedade civil. Hoje em dia, existem iniciativas vitoriosas de cidadãos que montam seus sites na Internet, criam indicadores de acompanhamento das ações públicas, exigem informações das prefeituras e chegam mesmo a definir metas de acompanhamento das promessas dos prefeitos eleitos.